Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vanconcelos


Volume 2

Capítulo 33: Outra Língua

Caminhando sem rumo pelas ruas, Nathaly se encontrava completamente perdida por não saber ler.

Ao se aproximar da grande rua, sentiu um cheiro muito agradável vindo mais adiante.

RRRROOOMM...

Sua barriga roncou como a de um gigante faminto há mais de 30 dias, e as pessoas ao redor se assustaram.

Ficou olhando para frente, fingindo demência.

Logo chegou à frente de uma casinha de dois andares na esquina, onde uma senhorinha vendia carne assada no palito.

Morta de fome, Nathaly pediu:

— Me dê um, por favor! — salivando enquanto olhava as carnes de cores diferentes, que, pela fome, pareciam extremamente apetitosas.

— Aqui está... — A senhorinha entregou um espetinho.

Nhaaam!

Nathaly devorou-o rapidamente, puxando o palito vazio para fora.

— São 35 moedas de bronze, mocinha.

Ela abriu um dos sacos de moedas e entregou uma moeda de ouro para a senhorinha.

Assustada, a senhorinha disse:

— Eu não tenho troco para isso, moça...

Nathaly, ainda com muita fome, respondeu:

— Faz o seguinte, me dá todos os espetinhos aí.

— Mas ainda não dá o valor da moeda.

— Pode ficar com ela. — Nathaly pegou um saco de papel e colocou todos os espetinhos dentro.

A senhorinha, muito feliz, entrou em sua casa gritando que estava rica.

Saindo de lá, saboreando seus espetinhos, Nathaly começou a subir a grande rua, olhando para as entradas à esquerda de longe, tentando identificar o possível banco.

No topo da catedral, na rua atrás dela, dois homens de túnica branca a observavam.

— Precisamos acelerar os testes. Com ela por aqui, pode acabar atrapalhando o plano.

— Acha que ela consegue?

— ...Talvez.


Nathaly sentiu como se alguém a observasse e se virou para olhar a rua da catedral. Os dois homens de branco haviam desaparecido; no entanto, havia fiéis na rua em frente à porta da igreja.

"Roupa branca? Será que tem alguma coisa a ver?" pensou, fazendo uma expressão desanimada. "Preguiça de descobrir." Nhaami! Comeu mais um espetinho e continuou sua caminhada, agora indo para o outro lado da grande rua.

Chegando próximo a uma das áreas nobres do reino, ela se aproximou de um soldado.

— Bom dia.

O soldado abaixou a cabeça.

— Bom dia, grande heroína. Posso ajudar?

"Enfia isso de grande heroína no cu!" — Poderia me dizer onde fica o banco do reino?

— An?... Como assim? — O soldado a olhou com um semblante de dúvida.

— O banco, quero guardar ouro.

— Mas... É ali. — Ele apontou para uma construção muito grande. — Atrás de você...

Nathaly se virou e viu.

— Ah. Eu não vi. Hehe... — Saindo com uma risada forçada, andou desanimada até o banco.

Entrando naquele lugar imenso, se dirigiu a uma atendente e se sentou na poltrona à sua frente, separada por uma fina parede de segurança em cristal transparente resistente.

— Eu vim gu...

— Grande heroína! Eu sou sua fã! — A moça olhava Nathaly com uma expressão muito alegre, enquanto Nathaly a encarava com uma expressão séria e de repulsa.

Respirou fundo e continuou:

— Vim guardar umas moedas de ouro.

— Claro, não se preocupe! Sabe quantas são? — perguntou a atendente, ainda com uma alegria exagerada.

— 489.

— De ouro?! — A expressão de felicidade da atendente sumiu, dando lugar ao espanto.

Nathaly percebeu a reação e, com um sorrisinho no canto da boca, entregou os sacos de moedas.

— Aqui está. — Colocou os sacos sobre a mesa.

A atendente, desesperada, começou a contar as moedas uma a uma.

A contagem demorou bastante e Nathaly, entediada, começou a cochilar na poltrona, que era muito confortável.

— Ufa... Acabei! — disse a atendente, já com um tiques nervoso em um dos olhos.

Nathaly se levantou, espreguiçando-se e bocejando.

— Ok.

Se virou para ir embora.

— Espera!

Nathaly se virou, olhando para a moça.

— Você não preencheu sua ficha.

— Ah. — Se sentou novamente e escreveu seu nome e uma senha na ficha que a atendente lhe entregou.

— Ótimo... Tudo certinho. Tenha um bom dia, grande heroína. — Com um sorriso novamente no rosto, a atendente se despediu.

— Obrigada. Um bom dia para você também... — Enquanto ia embora, Nathaly olhou de canto para a recepcionista e pensou: "Esquisitinha."

Depois de passar muito tempo andando pelo reino, Nathaly decidiu voltar ao palácio.

No caminho, teve algumas dúvidas:

"Essas pessoas são estranhas ou sou eu que sou a estranha aqui?" "Empregadas de branco e aqueles caras da igreja se vestindo de forma semelhante." "Não sei absolutamente nada do reino, mas se eu vim parar aqui apenas com o Nino encostando em Louis, eles devem estar em algum lugar. Mas... Onde?"

Se lembrou do casal da noite do banquete.

"Aquele cara, Jon?... Jonas, eu acho. O que será que ele sabe sobre este lugar?" "Porra. Não confiar em ninguém, mas como vou confiar naquele cara também?" Com uma expressão de raiva e cheia de dúvidas, continuou pensando enquanto caminhava pelo palácio.

"Ele é da Terra também? Por que, dentre todos, ele iria chegar em mim e falar aquilo?... Inferno."

Virando um corredor à sua esquerda, viu uma serva de branco.

— Ô, esquisita!

— Sim, minha senhora — a serva respondeu, abaixando a cabeça.

— Tem uma biblioteca aqui?

— Sim, minha senhora...

— Onde fica?

A jovem abriu os olhos lentamente.

— Está ao seu lado, senhora...

Nathaly olhou para o lado e viu uma porta dupla ali.

"Isso... isso tava aqui?" Olhou para a serva, que assumiu um sorriso de boca fechada, mantendo um silêncio absoluto.

Abrindo a porta, se deparou com uma enorme biblioteca.

Olhando para dentro, ela exclamou:

— Puta merda... Sabe onde tem um map... — olhou para a serva novamente, mas ela já havia desaparecido. — Óbvio que a lenda já teria desaparecido, né? — com um tom de sarcasmo, entrou na biblioteca.

Estantes imensas de livros preenchiam a sala, com uma grande mesa no centro.

O lugar era completamente destruído e escuro, com livros espalhados por todos os cantos, estantes vazias e queimadas. No entanto, aos olhos de Nathaly, tudo parecia normal.

Passava em frente às estantes com atenção aos símbolos, já que cada fileira era destinada a um conteúdo específico.

Enquanto examinava os símbolos, não encontrou nenhum que se parecesse com um mapa. Porém, próximo aos livros sobre raças, encontrou um com um símbolo semelhante à marca de Nino.

— A marca do pescoço dele? — murmurou, fechando os olhos ao lembrar de Nino. — Saudade de tocar aquele corpo... — animadinha, pegou o livro e o levou até a mesa.

Ao abrir o livro rapidamente na mesa, se decepcionou. Com o rosto travado, folheou o livro por inteiro.

— Eu não sei ler... — murmurou tristemente, se derretendo no chão.

Saiu da biblioteca completamente desanimada e cabisbaixa.

— Aaaaah... Que saco, cara — murmurava enquanto caminhava, toda molenga, pelo corredor.

À sua frente, Grimore, junto com seus soldados mais próximos, se aproximava. Nathaly, depressiva, nem prestou atenção neles.

— Aaaaah, que saco. Como vou achar eles se nem sei ler a língua desse lugar? — continuava a murmurar, passando ao lado do general.

— Olha ela aí. A farsa. O rei deve estar de olho no corpo dela. Uma garotinha ser o grande herói é uma verdadeira piada.

Seus soldados riram, mas Nathaly nem escutou o que ele disse. Grimore se irritou por ser ignorado, colocou a mão no ombro de Nathaly e a puxou para trás.

— NÃO ME IGN...

BAAM!

Nathaly, estressada, olhou fundo nos olhos dele e desferiu um soco com suas mãos em chamas no rosto do general, arremessando-o pela janela do corredor do palácio e lançando-o contra uma parede do lado de fora, próximo a um dos jardins.

Os soldados correram para ajudá-lo, mas ele já havia desmaiado.

— Grimore... Chefinho?!

— Ela o colocou pra dormir mesmo.

— Cala a boca, vocês dois. Me ajudem aqui. — Um dos soldados segurou Grimore pelo braço. — Vamos tirar ele daqui. — Os outros também o ajudaram a ser retirado.


Nathaly continuou toda molenga enquanto andava pelo corredor, quando viu a princesa, que, feliz, correu em sua direção.

— Você quer brincar comigo?! — perguntou Aurora, com os olhos bem abertos e cheios de entusiasmo, enquanto Nathaly se agachava para ficar ao seu nível.

— Pode ser... Mas tem uma condição.

— O quê?! — Aurora perguntou, muito curiosa.

— Você sabe ler?

— Sei!

— Então você vai me ajudar na biblioteca com uma coisinha e depois vamos brincar! — Nathaly sorriu para a princesa, com os olhos fechados.

— Tá bom! — Aurora deu um pequeno grito de felicidade e pulou de empolgação.


Já na biblioteca, Nathaly perguntou:

— Você sabe onde tem um mapa?

— Vou procurar. — Aurora começou a procurar entre os livros nas estantes, com Nathaly a seguindo. — Achei...

Nathaly pegou o livro com a marca de Nino e as duas se sentaram à mesa. Como a princesa não alcançava a mesa, ficou em pé sobre o banco.

Ao abrir o livro, Nathaly viu três reinos marcados com nomes. Outros lugares no mapa eram florestas e rios, mas o mapa havia sido rasgado nos quatro lados; claramente, o original não era aquele.

— Qual o nome dessas três cidades?

— Não são cidades, são reinos.

— Reinos?

— Isso. Esse aqui é Dipu e esse outro é Vasireri... Vasnsirier... Van-sirieri!

"Fala bem, mas tem dificuldade para ler. Deve estar errado os nomes, mas já me dá uma ideia." — Então esse aqui é Alberg? — Nathaly apontou para o reino no centro, o mais ao sul do mapa.

— Sim... Onde papai é o rei.

— Entendi. E sabe me dizer sobre o que é esse livro? — Nathaly mostrou um livro contendo informações humanas sobre os primordiais.

Aurora começou a ler mentalmente e, após alguns momentos, disse:

— É sobre... — coçou a cabeça tentando entender — Pimodias... Primordiais!

— Sabe me dizer quantos são? "Cérebro da menina vai fritar assim."

A princesa olhou fixamente para o livro, tentando entender.

— Não sei ler essas palavras, é muito difícil... — Começou a lacrimejar, achando que Nathaly não iria brincar com ela se não ajudasse.

Nathaly fez um cafuné na princesa, que parou de chorar segundos depois.

— Está dizendo alguma cor aí?

Aurora olhou novamente para o livro e começou a ler:

— Rosa, preto, branco, verde, azul, vermelho. Os outros dois não são cores.

— São o quê?

— Está escrito lua e sol.

"Rosa, preto, branco, verde, azul, vermelho, lua e sol? São oito primordiais ao todo." Seu semblante ficou desanimado. "Mas em que isso me ajuda a encontrar eles?" 

[ — ...Demônios da lua nem existem... Chamá-la de Quarta Bruxa é estranho, já que bruxas também são lendas; ninguém sabe se elas realmente existem... ]

Se lembrou das palavras de Monica.

"Não dá pra confiar em informações assim. Ela acha que não existem bruxas e demônios da lua... Akli me confirma que bruxas existem, e agora isso de primordial da lua... Que saco." 

Nathaly sorriu para a princesa.

— Entendi. Era só isso que eu queria mesmo. Vai querer brincar de quê?

Aurora ficou feliz e, com um grande sorriso, pulou e gritou:

— BONECA!

Enquanto ela gritava, Nathaly ficou com os olhos fechados. Quando os abriu, uma serva surgiu atrás da princesa, a uns metros de distância.

— Princesa... Eu estava procurando por você!...

"Seu cu!" Nathaly ficou indignada.

— Está na hora do seu banho. Vamos.

Aurora ficou triste e quase começou a chorar, olhando para Nathaly.

— Tchau...

Nathaly, com um sorriso, respondeu:

— A gente brinca depois. — Fez um cafuné na cabeça de Aurora.

— Tá bom. — A princesa ficou um pouco menos triste e, dando a mão à serva, foi levada para o banho.

Nathaly observou as duas saírem da biblioteca.

"Por que não me querem perto da princesa?"

Olhando novamente para o livro invisível sobre a mesa destruída, Paf... o fechou e o colocou na estante vazia. Em seguida, deixou o outro livro imaginário na estante de Raças.

Ao sair da biblioteca, fechou as duas portas, deixando-a no completo escuro novamente.



Comentários