Volume 2
Capítulo 50: Presas e Caveiras
GRIS
Já se passaram dois dias desde a luta conta Malak e Hector. Bem como, passaram-se seis dias desde que Valefar saiu ao socorro de seu amigo Átrios. Faz bastante tempo, começo a me preocupar com a segurança do professor.
Nesses dois dias, Alienor e eu descansamos bastante. Ela curou o ferimento da minha barriga, o que me deixou bastante surpreso, pois a ruiva não gosta de gastar seu fluxo com outras coisas que não suas explosões.
Às vezes, eu até me esqueço que ela também tem alinhamento de vida e que pode realizar algumas magias de cura mais simples. Acho que o mais surpreendente é que ela consegue conjurar até água com o alinhamento de vida, mas a ruiva disse que isso lhe dá calafrios, só de pensar.
Além disso, conversamos bastante sobre nossas impressões e estratégias a respeito dos próximos adversários, os dois gigantes de Anak. Eles são realmente poderosos, porém será uma luta completamente diferente da anterior. Esses guerreiros se baseiam na força bruta e confronto direto.
É de manhã agora, e de tarde será a nossa luta contra os dois competidores da Ilha de Anak.
Adquirimos uma rotina nessa última semana que passamos em Ticandar, e toda manhã eu saio para comprar mantimentos no segundo andar para tomarmos café da manhã. Em especial agora, que estou cheio da grana, como disse Alienor.
Por falar nela, a ruiva é quem cuida de fazer o café. Fica amargo e bastante doce, mas ela disse que nas terras vermelhas eles preferem assim. A verdade é que teorizo que a ruiva só não é boa em prepará-lo mesmo. Porém manterei isso em segredo, afinal valorizo minha vida.
Não há muitas opções, deixá-la sair para comprar as coisas seria um erro. Ela acabaria presa por atear fogo em alguém ou destruir algum estabelecimento. Se não fizer algo pior.
Por falar em ser presa, eu tentei entrar em contato com Malak e terminar de interrogá-lo na prisão. Entretanto o Sr. Khan definiu que ninguém pode se aproximar dele até que o julgamento tenha acabado.
Não consegui retirar muitas informações dele durante a luta. Porém o colega dele, Hector, é um nobre de Thar. Então estou inclinado a deduzir que o próprio Malak seja de lá.
Assim que perdeu sua luta, Hector deixou a cidade e seu amigo para trás, não consegui falar com ele. Precisarei encontrá-lo em Thar, se for o caso.
O Sr. Coiotes até tentou ajudar a me encontrar com Malak, mas ele concluiu que se o Lorde Khan determinou o isolamento, então o mascarado não pode fazer mais nada, afinal é seu líder máximo. Bom, eu o agradeci por tentar.
O Karakhan já me ajudou muito além do que precisava, e seu trabalho nem era esse, mas apenas vigiar Kali.
Por falar no mascarado, ele ficou muito animado com a luta. Disse que aquele arrombado do Malak merecia sofrer até mais. Além disso, ficou surpreso com o fato de Alienor e eu termos lidado com tanta facilidade com um inimigo problemático como aquele.
Nós tivemos tempo para nos preparar e também conseguimos as informações cruciais que fizeram toda a diferença. Assim, pude agir da maneira que um caçador faz. O restante foi só consequência.
— E para hoje, meu garoto? — pergunta o atendente. Um senhor loiro com um avental branco.
O cheiro do pão fresco inunda minhas narinas. Estou até com mais fome agora.
Este local é uma tenda a céu aberto, uma padaria do segundo andar, e esta rua poderia ser descrita como uma feira, pois há mais dezenas de outras barracas por aqui.
— Quero duas baguetes, quatro pães doces e dez pães de queijo, por gentileza.
— Só um minuto, meu bom jovem. — O atendente vira as costas e começa a preparar as sacolas com os produtos.
— Hey, Gris! — Escuto uma voz familiar.
Quando me viro, vislumbro um anão loiro da minha altura, com barbas longas, vestido de uma armadura pesada completa, com um escudo torre nas mãos e um martelo de guerra nas costas. É o Barathun.
Por que será que ele está com uma armadura tão pesada dentro da cidade?
— Oi, Sr. Barathun. Achei que tivessem partido já. Nunca mais os vi.
— Não, não, nós não partimos. — Ele balança a cabeça em negação, responde com pressa e gesticula de forma grosseira, parece aflito. — Mas não tenho tempo para isso agora, eu preciso da sua ajuda, garoto. Você é um caçador, certo?
— Sou. Do que o Sr. precisa?
Ele fita a espada em minha cintura e responde: — Meus amigos e eu saímos para a Floresta de Prata, ao sul daqui, para cumprir uma missão da Guilda e juntar um dinheiro. Mas deu tudo errado, Verônica foi picada por um escorpião vermelho de um metro de comprimento. Filemon está lá cuidando dela, mas eu preciso levar um antídoto. Você sabe onde comprar?
— Hum... Só pode ser um ferrão virulento. Mas isso é estranho, os insetos, aracnídeos e outros invertebrados gigantes da Floresta de Prata ficam a leste e não ao sul de Ticandar.
O anão coça a cabeça, depois sua barba e raciocina por um instante, então diz: — Você tem razão, foi ao leste mesmo. Eu não sou bom em me orientar assim... Mas esse não é o caso, você pode me ajudar? Verônica está desmaiada e muito mal.
— Sim, eu posso. Na verdade, eu tenho aqui na minha mochila um antídoto para isso. Tenho para todos os principais animais venenosos e peçonhentos da...
— Deixe os detalhes técnicos para depois... Você pode vir comigo?
— Aqui está seu pedido, meu jovem — diz o atendente da padaria ao me entregar as sacolas.
Entretanto, eu as devolvo e entrego cinco moedas de bronze, então digo: — O Sr. poderia guardar meu pedido aqui um instante, eu deixarei pago. Preciso ajudar meus amigos que estão em perigo.
— Claro, estará aqui te esperando. — O atendente coça a cabeça e nos vê partir.
— Obrigado, Gris, não sabia mais a quem recorrer...
Conforme caminhamos para longe de Ticandar e entramos nas profundezas da orla interior, cada vez mais a luz enfraquece, e os vaga-lumes diminuem de quantidade.
Passamos por algumas bestas perigosas, entretanto elas são mansas, pois ainda estamos dentro da magia que cerca Ticandar, o que nos permite conversarmos sem qualquer risco ainda.
Durante o trajeto que fazemos a passos largos, me chama a atenção que o anão não para de olhar para a espada embainhada em minha cintura.
— Do que se tratava mesmo a missão? — eu pergunto.
— Ah! Era para caçar alguns demônios, cães pretos, que apareceram por aqui.
— Soube mesmo que surgiram demônios na floresta. Creio que as bestas devam estar agitadas por conta disso também, precisamos tomar mais cuidado do que nunca.
— Sim, foi um descuido nosso, deveríamos ter nos precavido mais... — O anão olha para os lados, como se procurasse algo.
— Esqueci de perguntar, Sr. Barathun, o escorpião vermelho tinha um desenho nas costas parecido com um losango ou um círculo?
O anão pensa por alguns instantes, checa os arredores, ao passo que coça sua cabeça, então responde: — Acho que era um losango. Por quê?
Também olho aos arredores, e estamos em uma clareira cercada por árvores gigantes e alguns arbustos menores. O solo é regular e há grama rasteira sob nossos pés.
Daqui para frente, os vaga-lumes estão mais agitados. Isso é sinal de que mais algumas dezenas de passos, na direção oposta à cidade lumen, e estaremos fora da magia que deixa as bestas calmas.
— Era só para confirmar qual dos antídotos deveríamos usar. Não quero usar o errado — digo isso, e tiro o meu amuleto que estava no bolso da calça e o coloco na minha mochila, sem que o anão veja.
— Muito esperto, que sorte a minha por encontrar um profissional.
— Daqui por diante, nós precisamos falar bem baixo, Sr. Barathun. Na verdade, seria melhor não fazermos qualquer barulho.
O que é praticamente impossível, dada a armadura pesada do anão.
— Sério?
— Sim, qualquer som pode atrair uma besta perigosa.
— Igual àquela ali? — O anão aponta na direção das minhas costas.
Solto minha mochila no chão e ativo os dons do impetus. Eu me viro, mas não há qualquer besta no local apontado, algo que eu já esperava.
Em contrapartida, escuto o som da armadura pesada do anão se deslocar, assim como o ar em volta dele. Seus movimentos são todos grosseiros, não compatíveis com este ambiente.
Salto para trás e saco de minha espada. A aponto em sua direção. Olho para o anão, e é evidente ele tentou me agarrar.
— Ahm?! Aconteceu algo, Gris? — Ele olha para os lados e começa a suar.
Seria quase uma cena cômica, se não fossem tão evidentes suas verdadeiras intenções.
— O que você quer de mim, Sr. Barathun? Já pode parar de fingir.
Ele suspira e bate com o escudo torre no chão causando um som forte que espanta as aves das árvores, depois pega seu martelo de guerra das costas. Uma arma para empunhar com ambas as mãos, mas ele a manuseia como se fosse um graveto.
Pelo tamanho, som e espessura de seus equipamentos, estimo que devem pesar uns seiscentos a oitocentos quilos, se somados. Ou seja, ele é um anão de uma tonelada. Provavelmente, estava com impetus ativo o tempo todo para suportar esses pesos.
— Pensei que você tivesse baixado a guarda, meu jovem. Assim seria menos doloroso para ambos.
Anão tolo, não existem escorpiões vermelhos com desenhos de losango ou círculos nas costas. Formas geométricas perfeitas são raras nos animais da Floresta de Prata.
Só há duas espécies de ferrões virulentos, uma com desenho de presas e dentes afiados, outra com caveiras desenhadas nas costas, ambas para assustar os predadores. Os detalhes técnicos sempre fazem a diferença no final. Além disso: — Eu nunca abaixo a guarda dentro da Floresta de Prata.
— Hahahaha! — Ele solta uma gargalhada digna de um cidadão da Capital do Aço, enquanto aponta para mim. — Um garoto tão pequeno e com um pensamento assim?! Eu deveria imaginar que o aprendiz daquela aberração só poderia ser um pequeno monstro também.
— Então seu objetivo é ele, meu professor.
— Aquele assassino não merece um título tão nobre, mas você está certo. Queremos ele, então apenas desista para eu não te machucar.
Eu levanto minha guarda. Um caçador mata ou foge para voltar outro dia, mas nunca se rende.
— Tsk! Eu preferiria não ter que espancar uma criança, mas está tudo bem, se é o que você quer.
Ele não possui aura, portanto é certo que é um usuário de impetus. Seu equipamento parece pesar muito além do normal, então creio que além de resistente, sirva para compensar a falta do aumento de massa.
Um dos dons, eu já sei que ele não tem. Será que possui somente aumento de força e resistência?
Eu deveria fugir, seria o mais lógico, pois ele pretende me usar como refém para alcançar o professor. Todavia, eu quero saber antes como é lutar contra um adversário que usa impetus.
Invisto contra ele a toda velocidade.
— Rá! Você é corajoso! — exclama o anão.
Não adiantará usar minha espada contra essa armadura grossa, preciso encontrar vulnerabilidades, como daquela vez contra Fineas.
Ao me acercar dele, finto e salto ao seu lado esquerdo, longe de sua arma. Tento estocá-lo no pescoço. Entretanto, o anão balança seu escudo como se fosse uma folha de papel e golpeia meu corpo com uma força surreal.
O impacto do golpe me lança para longe, e perco a noção da gravidade enquanto rolo pelo chão.
Tum! Minhas costas colidem contra uma árvore gigante, e eu paro. Gotas de sangue são expelidas de minha boca, borrifadas e voam mescladas com os vaga-lumes prateados que se assustaram com o impacto. Que visão bonita.
— Rahm! — Busco ar, mas a respiração não vem.
Acho que perdi minha oportunidade de fugir.
Peço que deixem suas impressões (👍|😝|😍|😮|😢) e comentem o que acharam deste capítulo,
esse é o melhor presente que um escritor pode receber.
Clique aqui e siga Aelum nas redes sociais