A Voz das Estrelas Brasileira

Autor(a): Altair Vesta


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 12: Os Membros do Guerreiro – Confronto entre Marcados ⑦

Após a explosão atingir Isaac e Isabella, soldados armados avançaram pelos becos até cercarem todo o quarteirão. Mesmo se os dois tivessem sobrevivido ao ataque surpresa de alguma maneira, estariam envoltos por incontáveis metralhadoras prontas para os retaliar.

No entanto conforme a aglomeração de fumaça se esvaia, nenhuma silhueta foi encontrada no local em questão.

Nenhum dos marcados gêmeos estava ali.  

Todos os combatentes permaneceram em suas posições, ainda que indecisos quanto ao desaparecimento dos inimigos. Talvez segundos suficientes de atraso os permitiram fugir após terem sobrevivido. Ou então acabaram estourados num nível onde sequer membros inteiros dos corpos poderiam sobrar.

— Fiquem alertas! Atirem a qualquer movimento suspeito!

— Sim!!

Após a resposta simultânea, todos os soldados ajeitaram a postura à procura dos alvos sumidos. Enquanto alguns avançavam de forma ordenada pelas calçadas e invadiam os quintais em busca de posições favoráveis para o combate, outros percorriam os becos divisórios entre as residências.

Dos caminhos estreitos, o contra-ataque foi iniciado. Garras afiadas surgiram do nada até deceparem os pescoços expostos dos agressores num piscar. Nenhuma possibilidade de retruca foi permitida.

Os demais combatentes demoraram a perceber o banho de sangue que pintava as paredes estreitas. Os primeiros ruídos de tiros sendo disparados deixaram todos em alerta.

“Aquilo de antes realmente foi surpreendente”, Isaac puxou as duas facas da cintura e atacou o outro flanco de inimigos à medida que rodopiava pelo ar desprezando todas as leis da física. A força defensiva armada pelo marcado adversário começou a desmoronar rapidamente.

— Isso é ridículo! Esses caras... eles sobreviveram àquela explosão!? – Um dos combatentes se escondeu desesperado. – O senhor Levi utilizou seu poder milagroso e mesmo assim...!

Seu raciocínio em voz alta foi interrompido no momento que as lâminas sujas de sangue cortaram as folhas do arbusto à frente. Tendo a posição revelada, procurou mirar e atirar de qualquer forma, entretanto acabou por ser empalado na lateral do pescoço.

Ter a veia lacerada fez um chafariz de sangue jorrar para fora até tingir parte do solo gramado de vermelho-escuro. O rapaz executou um salto veloz até o telhado da casa adiante, o movimento chamou a atenção de todos os soldados que prontamente apontaram as metralhadoras em sua direção.

Graças a distração, Isabella surgiu das sombras e utilizou a agilidade fora do comum para derrubar os adversários sem lhes oferecer chances de revide.  

Enquanto isso...

— Como eu esperava – murmurou Levi –, esses jovens são um grandioso problema. Parece que precisarei cuidar disso pessoalmente.

Ainda na entrada da mansão, o marcado voltou a abaixar o tapa-olho sobre a vista esquerda. Encarou a menina que era segurada pelos guardas da porta principal e complementou:

— Você também virá. Preciso de seu poder para alcançar a vitória absoluta.

Afetada pela experiência anterior, Bianca nem ao menos conseguiu o responder. Seus olhos tremulavam mesmo cerrados, o frágil corpo pálido era dominado por calafrios intensos.

Levi pouco se importava. Desde que pudesse alcançar o próprio objetivo, a usaria inclusive se estivesse quebrada. Um gesto de cabeça rápido foi suficiente para ordenar os dois guardas a levarem a garota até próxima dele. Na sequência, prestaram a continência de costume e se dirigiram até os portões.

Conduzindo a enfraquecida criança, abriu um sorriso durante o rangido das estruturas metálicas sendo abertas. Sem pressa, avançou o primeiro passo na direção da rua principal.

Mais da metade dos soldados disponíveis já tinham sido derrotados. Conforme escapavam dos disparos velozes, Isaac e Isabella derrubavam os agressores através de ações conjuntas próximas do impecável.

Não muito distante, outra dupla de jovens observava o confronto explosivo pelo quarteirão...

— Esses malditos não se importam com os moradores? – Norman resmungou com sobrancelhas franzidas.

— Não... os dois estão sendo cautelosos. – Layla estreitou os olhos na direção dos irmãos. – Seus movimentos precisos evitam qualquer ataque despretensioso às pessoas dentro das residências. Dessa forma, podem anular os riscos de alguma bala perdida os afligir.

O garoto não queria acreditar, mas a observação precisa da companheira não parecia ser mero achismo. De qualquer forma, não tinha tempo para se preocupar com outras pessoas naquele momento. Mesmo que não desejasse a repetição do evento na universidade, pretendia disponibilizar total atenção ao conflito onde sua vida estaria em jogo.

E nem demorou muito até o destino os colocar frente a frente com o momento decisivo. Quando um arrepio agudo se alastrou da área onde residiam suas marcas, os gêmeos interromperam a onda de ataques. A atenção deles foi puxada pela presença dominante do homem que avançava a passos curtos até o local do combate.

Inclusive os próprios soldados cessaram o tiroteio desenfreado. Todos observaram o sorridente indivíduo de tapa-olho caminhar no meio da rua vazia. Junto dele, a pequena indisposta quase se arrastava conforme era acompanhada pelas mãos frias sobre seus ombros.

“São eles”, o Marcado de Altair rangeu os dentes e cerrou os punhos ao enxergar a dupla encontrada na noite anterior.

Layla manteve a frieza no olhar, aguardava quais seriam os primeiros deslocamentos efetuados pelos oponentes. O silêncio reinou absoluto por toda a área, nenhuma pessoa cogitava mexer um músculo sequer, todos à mercê da pressão absurda exalada pelo encontro entre os grandes adversários.

A ameaça dos soldados de preto não existia mais. A partir daquele instante a concentração de Isaac e Isabella estava tão somente focada no homem e na criança metros à frente.

— Isso é realmente emocionante – enunciou Levi, ao abrir um dos braços. – No entanto, sei que ainda faltam alguns atores principais para completarmos esta peça. Será que devo matar vocês dois para forçar a aparição deles?

— Desgraçado... então foi você que ordenou o ataque de ontem!? – O sangue de Isabella começou a subir à cabeça.

— Exatamente.

Com a resposta convencida do moreno, a garota de óculos ergueu as sobrancelhas permitindo a energia de seu Áster a envolver por completo. Isaac pensou em controlá-la, porém sentiu que seria um ato inútil visto o Transformismo Animal próximo ao ápice.

As garras nas mãos cresceram ainda mais, os dentes caninos afiaram-se prontos para rasgar qualquer matéria que encontrasse no caminho. Além disso as pupilas contraídas se tornaram finas como as de um felino.

Diante da transformação bestial da oponente, Levi soltou uma risada sarcástica.

— Está ressentida? Quer se vingar pela morte de seus colegas de classe? –Estendeu a mão aberta em direção a ela. – Então, que tal se matar primeiro?

— Hã!? O que disse!? – Isabella avançou o primeiro passo quase destruindo o asfalto.

— Veja bem. Caso vocês não escolhessem justo aquela universidade para atacarem os outros atores, então minha incursão não teria afligido o local.

As palavras controladas do comandante trouxeram um baque estranho sobre a garota, a ponto de permiti-la experimentar os batimentos cardíacos acelerados estufarem o peito.

— Não dê ouvidos a ele, Isabella – murmurou Isaac.

Mesmo com o aviso cauteloso do irmão, a Marcada de Betelgeuse não parecia disposta a recuar. O sentimento de culpa começou a permeá-la sem que pudesse lidar da maneira devida. A única válvula de escape ao alcance das mãos seria enfrentar o inimigo a curta distância.

Disparou em sua direção através de um impulso destrutivo. Quando arqueou o braço no intuito de cortar a garganta dele num único golpe, enfim um movimento simples foi executado; uma das mãos de Levi apertou o ombro decaído da cabisbaixa garotinha e...

— Esquerda...

Um fraco murmúrio soou da boca trêmula dela, porém o homem sorridente foi capaz de escutá-lo. Logo na sequência, a marcada realizou o primeiro ataque com a canhota, mas cortou apenas o ar. Seus olhos afiados arregalaram no momento que o homem saltou para trás junto da menina e desviou sem problemas.

Dessa vez não houveram truques. O deslocamento praticado por ele foi puro, apenas uma antecipação ágil ao golpe da inimiga. Apesar da surpresa repentina, a garota buscou prosseguir na ofensiva, dessa vez ainda mais veloz em comparação a investida anterior...

— Embaixo... direita...

Como proferido pela criança que tinha os olhos enfraquecidos cobertos pela franja do cabelo, Isabella buscou um ataque de baixo para o alto onde quase arrastou as garras no asfalto.

Mais uma vez Levi foi bem-sucedido em se afastar antes da conclusão do golpe. Assim como a Marcada de Betelgeuse, seu irmão e até o distante Norman demonstravam espanto conforme as reações velozes do comandante prosseguiam. Apenas a Marcada de Vega manteve a serenidade perante a sequência que sucedeu...

— Por cima... esquerda... d-direita... direita embaixo... ao lado pra baixo... esquerda... por trás...

Bianca continuava a oferecer as coordenadas precisas de todos os golpes consecutivos realizados pela bestial, todos evitados sem dificuldades pelo caolho.

“Ele consegue prever todos os ataques dela?”, Isaac estreitou as vistas na busca por alguma brecha. Ninguém além do próprio oponente podia escutar os fracos, contudo, esclarecedores sussurros de Bianca.

Não importava se fosse pela esquerda, direita, por cima, por baixo, pela dianteira ou então na altura da retaguarda. O indivíduo de cabelo escuro seguia soberano defensivamente.

O nervosismo já aflorava nos movimentos da marcada. A precisão inicial – embora sem ter sucesso em atingir o alvo – se esvaiu aos poucos e foi substituída por pequenos vacilos cruciais. Esses permitiam a Levi se desvencilhar sem necessitar do poder da menina.

“Se continuar assim ela vai perder o Áster”, o jovem afastado girou as facas empunhadas e se preparou para o confronto mesmo sem nenhuma abertura.

Levi percebeu o momento e puxou o braço da criança para trás. Ao acompanhar a atitude do homem, Norman pensou em se revelar no objetivo de resgatar a garotinha, mas foi seguro por Layla no instante derradeiro. Tal atitude da jovem foi essencial para evitar o que viria a seguir.

Antes de Isabella poder desferir uma nova incisão, o moreno levou a mão até o tapa-olho escuro. Quando o retirou de cima, o olho esquerdo se abriu emitindo um poderoso cintilar cerúleo. Todos os presentes reagiram da mesma forma, boquiabertos com estupefação no olhar.

De repente, tudo ao redor congelou. Com exceção dos jovens escondidos, todos os indivíduos na linha de visão do homem simplesmente interromperam os movimentos como se estivessem congelados no tempo.

A mesma sensação vivenciada no beco da noite anterior atingiu o Marcado de Altair. Só que, dessa vez, foi ainda mais arrepiante. Ele engoliu em seco ao perceber que os irmãos adiante não estavam paralisados como cogitou num primeiro instante. Pareciam seguir com os movimentos pretendidos, contudo, avançavam numa velocidade superlenta.

Além disso, a marca estampada no lugar de sua íris revelava a constelação que o escolheu. Seis pontos dispostos criavam a forma de uma foice, representação de cabeça e peito onde mais três puxavam um pequeno triângulo na traseira. O maior deles podia ser visto no fim do asterismo, o ponto do canto inferior direito.

— A Constelação do Leão – murmurou o rapaz.

— Isso mesmo... esse é o Marcado de Regulus – a aliada complementou com as sobrancelhas contraídas em preocupação.

Enquanto todos permaneciam em câmera lenta com exceção deles, Levi caminhou na direção do Marcado de Rígel mantendo o olho especial aberto. Por meio de passos rápidos, o alcançou e retirou as duas armas de suas mãos.

Layla estava próxima de compreender o significado daquela sequência, responsável por indicar as verdadeiras capacidades daquele Áster. No entanto os pensamentos dela foram sobrepostos quando o Marcado de Regulus empalou o abdômen de Isaac com uma das lâminas.

Norman desejava impedi-lo mais do que tudo, entretanto se o fizesse poderia ser afetado pela habilidade do inimigo. Incapaz de concretizar qualquer ação temerária, preservou-se a observar o longo proceder dos segundos até o comandante perfurar a barriga da bestial na sequência.

Com os dois oponentes feridos, o homem retornou a mesma posição de onde ativou seu Áster. Em silêncio contou até cinco e levou o tapa-olho da testa de volta ao olho canhoto. Tal ação permitiu a velocidade do tempo sobre os indivíduos afetados retornar ao normal.

Para os irmãos gêmeos apresentou-se como um evento semelhante ao da perseguição anterior, onde a van havia desaparecido num piscar. Dessa vez eles foram dominados pela dor graças à faca que perfurou seus torsos após piscarem da mesma forma, um milissegundo entre a mudança brusca de acontecimentos.

Cuspiram sangue antes de sucumbirem ao solo. Apesar do incômodo ardente na área afetada, sabiam que seriam mortos caso retirassem as lâminas dali sem nenhum atendimento prontificado.

“De novo isso”, Isaac manteve-se erguido com muito esforço, apesar de tocar um dos joelhos sobre o asfalto. “Que merda de Áster é esse?”, ergueu os olhos trêmulos até o inimigo sorridente.

— Seu... desgraçaaaado!! – Isabella vociferou a fim de vencer a própria agonia e manter-se ofensiva contra o adversário.

Esse que estreitou o olhar afiado.

— Ainda consegue lutar...

Bianca não era capaz de demonstrar outro semblante que não fosse enrugar as sobrancelhas e segurar as lágrimas acumuladas. Levou as mãos até a boca enquanto balançava a cabeça para os lados, como se quisesse renegar a imagem à frente.

Mas seu maior desejo de momento era desaparecer. Por culpa dela, mais do que o próprio Levi, os irmãos foram feridos a um nível que poderia se tornar letal. E apesar disso, a Marcada de Betelgeuse rugiu contra o adversário de capacidades indecifráveis.

Pelo menos para eles...

— Se deseja tanto se debater... – O homem direcionou a mão ao tapa-olho de novo. – Irei ajudá-la a encontrar a própria cova.

“É agora”, Layla lançou o olhar arregalado ao companheiro que não demorou a assimilar sua motivação.

Com um estalo forte da língua, o garoto saiu de trás do carro estacionado onde observava tudo junto da aliada. O caolho levou um susto ao enxergá-lo pronto para utilizar seu Áster da Telecinesia, porém não pôde interromper a ativação do Controle Temporal.

O brilho irradiou da vista canhota, todavia o espanto repentino fez com que a habilidade não usufruísse de total precisão. Obteve sucesso ao desacelerar o tempo de Isabella e alguns soldados remanescentes nos arredores, enquanto Norman, Isaac e Bianca permaneceram inatingíveis.

— Eles apareceram! – Seu sorriso se alargou até mostrar os dentes.

Se fosse muito rápido, poderia ajeitar os focos desviados do próprio Áster e recuperar a vantagem absoluta, mas um sopro de vento no meio do caos fez seu coração disparar pela primeira vez durante todo o encontro.

Isaac desapareceu do campo de visão deles no decorrer de um movimento veloz, os limites quanto ao Áster da Levitação puderam ser ultrapassados. O ataque surpresa veio mais rápido que o pensamento, permitindo ao Marcado de Rígel elevar-se na retaguarda do alvo com uma nova arma empunhada.

“Você precisa morrer aqui e agora!”, mirou empalar a garganta do homem inerte. Só não contava com a ocorrência diferenciada que antecipou o toque da ponta afiada sobre o membro exposto.

O brilho do símbolo da Constelação do Leão cresceu tanto a ponto de iluminar o quarteirão inteiro. As vistas arregaladas ofereciam o tom da concentração acima do normal. Determinado a superar aquele obstáculo, o sujeito de pele morena reverteu os efeitos do poder pessoal.

Quando a velocidade dos atingidos retornou ao normal, moveu o corpo de maneira tão vertiginosa que nenhum presente pôde acompanhar com perfeição. Isaac foi incapaz de prever essa reação. Ao errar o alvo, agora posicionado em sua traseira, o rapaz sentiu o sangue jorrar da ferida na barriga.

A faca não estava mais ali, mas nas mãos do Marcado de Regulus.

Até mesmo Layla reagiu espantada perante a nova demonstração de poder do inimigo. Afetado pela abertura do ferimento no abdômen, Isaac sabia que não seria capaz de se proteger. Com a retomada do tempo original, notou sua irmã sem reação adiante.

Conforme se aproximava do solo, abriu um sorriso fraco em direção a ela. No fim terminou tendo o pescoço enroscado pelo braço de Levi e, em seguida, a faca o apunhalou no centro do peito.

Não foi pelo Áster de Regulus, mas o momento pareceu congelar diante dos olhos estremecidos de todos os marcados...



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