Volume 2 – Arco 3: Dia do Tarche
Relatório 19: Previsões
Dia 28 de Abril, 20:00 da noite
Era chegada a hora! As luzes dos postes já não brilhavam mais apenas em branco, mas em verde, vermelho e amarelo, decorando cada centímetro da larga Avenida Romantusk, assim como as centenas de pessoas que ali se encontravam.
O foco era nada menos que a praça do Escudo de Bronze, onde louvores eram entregues ao monumento através da palavra “Kimkobulam”, pronunciada principalmente por indivíduos trajados à moda aborígene.
E além dessa vestimenta e as falsas espadas de ouro que muitos empunhavam, a mais comum das tradições eram chapéus com o rosto unicamente de um cervo, animal característico do feriado e nada menos que o ingrediente principal para a iguaria que era o prato que dava nome ao evento todo.
No entanto, um pouco afastados dessa concentração, um trio especial se colocava em posição mais elevada, analisando previamente o cenário onde o grande evento deste dia iria se desenvolver.
Em outra de suas várias falsas aparências, Romanov procurava por algo em específico, franzindo o cenho ao falhar em encontrar esse. Para completar sua dose de ansiedade, um comentário veio de quem estava ao seu lado.
— Com medo? Pensei que o seu tipo amasse uma boa briga. — Xeps cuspiu para o lado, direcionando o olhar zombeteiro para aquele que deveria ser seu parceiro.
Uma veia saltou na testa do agente, tendo acrescentada um toque à mais de raiva com a voz que se seguiu.
— Me parece é que vocês dois estão desesperados. — Alpina usava um binóculo para analisar as pessoas. — Podem ir pra casa tomar café com leite, eu dou conta das coisas por aqui.
Dessa vez, fora Xeps quem se emputeceu, e nem a farda militar conseguiu esconder as veias que saltavam de seu braço.
Enquanto os dois começavam outra de suas várias brigas, Romanov tentava se concentrar para reviver o plano que foi passado ao seu trio.
A voz do líder logo atingiu-o em cheio. Era um plano bastante simples. Dividir para conquistar! Cada um dos três faria seu próprio tipo de atuação no evento, mas com os mesmos alvos, obviamente.
Lutar contra o atual portador do dito Fator B mais poderoso não apenas parecia, era perigoso; morte quase que certeira! Por mais que ninguém conhecesse as capacidades da habilidade, sua mera citação era o suficiente para causar arrepios em qualquer um.
E piorando ainda mais, o segundo alvo se tratava do Homem Intangível. “Aquela cena não vai sair da minha cabeça tão cedo… Como que alguém é capaz de fazer aquilo!?”
Uma curta imagem de um corpo gordo passou diante de seus olhos, esse cuja cabeça havia sido misturada à madeira de uma mesa de escritório. Estava morto, era fato, mas aquilo que assustava era ter de desmontar a mesa para encontrar fragmentos de carne mesclados com a madeira.
“Se-Será que eu consigo derrotar ele sozinho?” Um aperto veio até seu peito, assim como sua própria mão, que pressionou firmemente o pingente amarelado por debaixo da camisa.
Em meio às suas divagações, a voz do General Xeps tomou seus ouvidos outra vez.
— Mas e aí, agente de rua. Quem exatamente você tava procurando esse tempo todo, ein?
— Hã? E-Eu? — “Não te interessa!” Teria gritado se não fosse pela impaciência de gerar outra discussão. — Estou preocupado com um rapaz. Hector Wanderlust. Ele é um amigo próximo de Victor, o detetive que está me caçando diretamente.
Alpina conteve um riso, enquanto Xeps simplesmente deu uma boa gargalhada, não se importando nem um pouco em chamar a atenção.
— Você ainda tá preocupado com o da cartola? Ele não conseguiu nem se aproximar do tal do Isaac, quem dirá ser capaz de te pegar! É como disseram, ele não passa de uma mera falha, um defeito que deu a sorte de ainda existir.
Mas!! Foi interrompido antes mesmo que pudesse se defender. — Você mesmo disse, não é? Esse tal de Hector fez parte da FESOL, então isso só diminui ainda mais as nossas preocupações.
Alpina assentiu e completou: — Realmente, ninguém que trabalhou lá se lembra do que passou dentro da corporação, absolutamente ninguém.
Romanov gaguejou, se virando para os dois em postura inferior. — Mas e se ele, sei lá, de alguma maneira recobrar as memórias? Quem sabe ele também não é um usuário de Fator B, ou talvez ele tenha até um…!!
Xeps estendeu a mão, uma ação suficiente para calar o agente. Por sua vez, Alpina suspirou e balançou a cabeça negativamente, como se encarasse uma criança burra que não entende nada da vida.
Ela então reafirmou:
— Não tem como ele ter um Fator B. E mesmo que tivesse — Passou a mão sobre a espada embainhada em sua cintura. —, ele nunca seria capaz de me enfrentar de frente, não enquanto eu tiver isto!
Um sorriso cínico surgiu no rosto da mulher, que nada gerou além de um rápido passo para trás por parte de ambos os homens.
Maluca! Definitivamente maluca! Se tinha alguém que ninguém da corporação gostaria de lutar em um combate frontal, seria essa doida!
Enfim, com os ânimos um pouco mais calmos, Romanov mirou novamente a multidão, pronto para seguir até essa e iniciar o plano de uma vez por todas.
Espere! Xeps chamou em tom mais sério. — Uma ligação? Hum… É de alguém da corporação.
Ele atendeu a chamada, identificado como General de Forças de Ataque. A voz que veio do outro lado, entretanto, fez seu cenho franzir de repentino, assustando ambos os colegas.
— Co-Contenção de Pragas? Com que eu falo exatamente?… Líder do Setor Sul!!… Hã? Ah, sim! Me desculpe, eu apenas me exaltei um pouco. Que-Que surpresa inesperada receber uma ligação de vocês.
A ligação seguiu com Xeps, o homem de poucas palavras, que ninguém dava ordens além dele mesmo, concordando com absolutamente tudo que a voz sussurrante falava em seu ouvido.
Por mais que tentasse, nem Romanov ou Alpina eram capazes de entender uma palavra sequer. Mas isso não se fez necessário, pois o General fez essa tarefa por eles.
— O Demônio das Ruas… vai colaborar? Certo.
O olhar de Xeps passeou pelos companheiros, garantindo que ambos tivessem entendido a mensagem.
Ao fim da ligação, guardou o aparelho e aguardou o inevitável. O primeiro a questionar foi Romanov, respondido com um rápido “Não!”.
— Não estamos falando do tal Hector. Parece que tem uma pessoa tentando saber mais do que deve, e por isso eles apenas nos avisaram que a Contenção de Pragas foi enviada para tomar conta dela. Basicamente, não muda em nada a nossa situação.
Agora mais confuso do que preocupado, Romanov fez outro questionamento. O que diabos era essa tal de Contenção de Pragas? E assim como deveria esperar, a cara pasma de Xeps dizia mais que o suficiente.
— Você está aqui faz tanto tempo e ainda não sabe uma coisa dessas!? Cacete, tinha que ser você mesmo!!
— De qualquer jeito, você nem precisa saber. Não vamos nos envolver com eles mesmo — disse Alpina, bocejando em seguida. — Podemos ir agora? Nesse ritmo, os alvos vão passar sem a gente nem ver.
Por mais incrível que pudesse parecer, os três concordaram com alguma coisa sem qualquer tipo de discussão. O evento não pedia por outra coisa! Os olhares determinados do trio rastreavam as pessoas assim como os caçadores homenageados neste dia faziam séculos atrás.
Empecilhos? Isso não assustava sequer uma mosca, muito pelo contrário, apenas trazia ainda mais vontade aos corações de cada um dos envolvidos neste evento.
Seja pela paz, por algo material ou algum tipo de vontade, cada uma das peças que agora foram jogadas no tabuleiro iniciaram suas próprias jogadas definitivas, prontas para encerrar a partida na primeira oportunidade que surgisse diante de seus olhos.
E então, Xeps deu o tiro final com sua brava voz: — Muito bem! Iniciar Operação Paranoico. Dispersar!
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