A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 1

Capítulo 4: Investigação (2)

Um único momento de distração foi o suficiente para que a situação piorasse ainda mais! Quando olharam o céu através do vitral, notaram algo de muito errado acontecendo.

Sem qualquer aviso ou explicação, o sol atravessou o céu rapidamente e o dia tornou-se em noite. A resposta no momento era inacreditável, mas também se tratava da única que tinham, o tempo estava correndo mais depressa!

Piorando ainda mais, a estátua começou a se mover ao ser envolvida pela escuridão. O lampião estava aceso, e a imagem caminhava na direção dos detetives.

— Cuidado! Ela pode atacar a qualquer instante! — avisou James, escondido atrás da esposa.

Porém, mesmo que ficasse ciente do perigo, Jessie não conseguia se mover, estava completamente paralisada. Ninguém nunca contou que coisas assim existiam! Que tipo de inferno era esse para o qual eles foram enviados?!

A criatura de pedra se movia tão naturalmente que — apenas com a silhueta — seria impossível dizer que não era uma pessoa. No fim das contas, será que realmente não era? D. Rossi… A dúvida de quem era aquela pessoa morreria ali?

A garota rangeu os dentes, recusando-se a aceitar a derrota. Ignorando o parceiro, ela colocou os braços à frente do corpo e se preparou para atacar da maneira que podia.

“Tenho que fazer alguma coisa, nem que seja só imobilizá-la por dois segundos!”

No entanto, tantas preocupações foram jogadas para longe logo em seguida.

Tum! Quando o passo que lhe dava distância perfeita para atacar foi dado, o punho não foi erguido. Tum! Posteriormente, ela seguiu o caminho em linha reta, passando direto pela dupla amedrontada.

O que? Ela estava cega, por acaso? Simplesmente passou reto como se eles nem existissem!

A resposta não tardou a ser revelada. Seu destino era a porta, mas ao contrário do que os detetives gostariam, ela não foi até lá para abri-la.

Clank! Um puxão confirmou, estava trancada. Agora, tão alto quanto os passos da estátua, que começou a ir até a porta da cozinha, eram os batimentos sincronizados do casal.

Por minutos que mais pareciam horas — e talvez realmente fossem —, eles ficaram totalmente parados. A imagem viva caminhava de um lado para o outro, sendo até possível vê-la jogar um pouco de lenha na fogueira do outro cômodo. Ela estava… averiguando o lugar?

Com certeza ela não responderia aquilo, nem uma boca tinha, afinal. Independente disso, parecia estar cumprindo seu papel como guardiã daquele local, pois logo que passou por cada cômodo do primeiro andar, subiu o lance de escadas à esquerda, prosseguindo com o que aparentava ser uma rotina.

— Ca-ca-cacete… Mas que merda é aquela co-coisa? — James caiu de joelhos.

Sua respiração estava tão pesada que uma bigorna parecia lhe pressionar os pulmões. O peito latejava, o coração tentava saltar para fora do corpo, e cada segundo as pontadas no hematoma recente aumentavam. Por hora, tudo que pôde fazer foi abaixar a cabeça e reclamar em silêncio.

E agindo como seu total oposto, Jessie pronunciou-se:

— Ela não nos atacou… James, é a nossa de explorar!

— Tá… maluca? Não tem como eu ficar tranquilo, arfa! com uma coisa daquelas… andando por aí!

— Me apresenta uma escolha melhor, se não tiver, tenta me acompanhar!

Rígida como sempre, lembrava até o pai, um militar da velha guarda. Ao invés de se intimidar, James conteve um riso. Era impressionante o quão motivador uma ameaça da esposa podia ser.

— Me dê mais um minuto. Arfa! Só preciso recuperar o fôlego.

Ela sorriu de canto, voltando a prestar atenção nos arredores. O primeiro lugar onde seu olhar caiu foi, inevitavelmente, os altares. 

Todos aqueles considerados “concluídos” ainda tinham um leve brilho dourado que circundava as respectivas frases. Olhando daquela maneira, não faltavam tantos assim, um fato que encheu a garota de determinação.

Entretanto, havia algo peculiar naqueles itens. Não sabia quanto a James, mas aquelas decorações estavam munidas de algo especial; que atraiu mais do que a curiosidade da mulher.

Antes que percebesse, seu braço já havia se estendido na direção do altar, e os dedos esticaram na direção da luz reconfortante.

Brr-bzzz! Na mesma hora, uma fina e veloz corrente elétrica saltou daquela luz, tendo como o alvo a ponta dos dedos da garota. Ao atingi-la, fez um forte arrepio percorrer todo o seu corpo, e por um instante, seus olhos brilharam naquela mesma cor, enquanto a mente era dominada por outra coisa.

Escuridão. Num único segundo, o mundo se tornou unicamente naquilo. Não sentia os pelos arrepiarem, o suor transbordar nem nada do tipo, era apenas silencioso pelos primeiros momentos, pois isso foi quebrado rapidamente.

Não se preocupe, mamãe!...

Uma voz distante e, ao mesmo tempo, extremamente próxima. Sem qualquer senso de direção, tudo que a Jessie pôde fazer foi escutar atentamente.

Eu e o irmãozinho nunca mais faremos essas coisas de novo, é uma promessa!

Huhu! Eu sei disso, afinal… vocês dois são crianças abençoadas.

Em sequência da voz feminina, a detetive sentiu um baque em seu peito, o que arremessou sua consciência de volta para o corpo num piscar de olhos.

Gah!! Quando se viu na mansão novamente, teve de se apoiar no mesmo altar para não despencar ao chão. Junto de tosses fortes e um zumbido ensurdecedor, ela lentamente recuperou os sentidos.

— Jessie!... Jessie!!

A voz de seu marido aproximava-se lentamente, soando cada vez mais desesperada. O mais rápido que pôde, ela recuperou a postura e avisou:

— Eu tô bem, não se preocupa.

— Tem certeza? Parecia que você tinha desmaiado por um instante. 

A garota levou alguns segundos, mas logo tratou de perguntar. Será que ele também havia escutado aquela voz? Soou tão distante que era bem improvável.

James negou, tudo que viu foi Jessie cambalear e se apoiar no altar. Em resposta, a mulher apenas abaixou a cabeça e, recuperada da tontura, encarou a ala do segundo andar por onde a estátua desapareceu.

Aquilo foi… algo dela? Talvez, tudo parecia estar conectado com aquela criatura, como se a própria mansão fosse um livro, lido conforme os detetives avançavam ali dentro.

— Tem certeza que não ouviu? Uma voz era de uma criança e outra era de uma mulher adulta.

— Nadica de nada

Bem, tanto faz. Com tantas coisas para se preocupar, discutir aquilo não fazia sentido. 

Diante dos rios de suor que escorriam pela testa de sua esposa, James até tentou convencê-la a descansar, mas naquele instante, ela não mostrava nada além de pressa.

Não era por menos, afinal o tempo estava correndo mais depressa. Que tipo de efeitos aquilo poderia ter a longo prazo? Isso era algo que o homem não estava muito afim de descobrir, mas não podia negar uma coisa.

“A dor no meu abdômen… parou? Não, ainda tô sentindo, mas tá mais fraca.”

Outra pergunta surgiu em sua mente, entretanto, Jessie não parecia interessada em responder essa, muito menos as outras que não estivessem relacionadas com o plano de fuga.

Enquanto a mulher estava focada em sair viva, James ficava cada vez mais interessado no local, aos poucos se sentindo mais seguro, por mais estranho que isso pudesse parecer.

O caminho até as escadas seguiu silencioso, com ambos agindo como totais opostos enquanto o segundo andar lentamente se tornava analisável.

***

Enquanto os detetives davam seus primeiros passos para fugir daquele inferno, Jon Alamut — agora mais calmo — ponderava distraído em seu quarto, observando as nuvens através da janela.

Um mordomo entrou no cômodo e, vendo o patrão daquela forma, tentou deixar um prato de comida e sair de forma silenciosa. No entanto, alamut lhe chamou:

— Severino, fique aqui um pouco.

O servente largou a maçaneta na mesma hora, fechando a porta e se colocando ao lado da grande cama. O chefe queria lhe contar uma história da infância, algo bastante peculiar, mas foi um pedido que o homem decidiu atender.

Claro, senhor. O tom alegre de Severino tirou um sorriso do chefe, cujo se sentou na beirada da cama, ainda encarando o céu parcialmente nublado.

— Quando eu era criança, meu pai me contava sobre meus antepassados, e um dia me contou sobre a mansão…

Sua mente viajou para aquele tempo. Lembrava bem que, mesmo seu pai, não sabia ao certo quem foi o primeiro proprietário da mansão. O nome desse, iniciado em D, nunca era citado de forma comum, sempre referido como “Ele” ou “O Primeiro”.

Ainda que uma criança, Jon se destacava como uma criança especial. De forma inexplicável, uma suposição sua podia ser facilmente provada como verdade, algo que podia soar estranho ou até conveniente, mas que tinha uma explicação.

— Ele me contava sobre as habilidades que nossa família carregava em seu sangue, algo herdado dos fundadores do nome Alamut.

Nem ele ou o seu velho sabiam o que era essa tal habilidade, mas ela existia, era um fato. Contudo, não era apenas a família alamut que detinha essa característica, muitas outras compartilhavam disso.

— Eu me perguntava a razão do Primeiro ter construído uma mansão tão grande. Será que tinha muitos filhos? Ele alugava o lugar?

Mesmo com tantas suposições, ele sentia que nunca estava certo. Não era de tanta surpresa, já que era impossível saber o que as pessoas de tantos séculos atrás tinham em suas cabeças.

Porém, mesmo quando criança, Jon não teve vontade de desistir. Fez tudo que podia para tentar descobrir a verdade, e acredita que chegou perto, talvez até demais. Na última exploração que fez, acabou matando um louva-deus usando a mão esquerda, e lembrava-se de ter causado uma reação estranha em todo o local.

— Foi naquele mesmo dia em que perdi meu braço, e agora sou covarde demais pra voltar…

Severino lhe ofereceu o café que havia trago, o qual seu chefe virou num único gole. Batendo a xícara no criado-mudo, ele então completou:

— É como meu avô dizia: “Rossi era uma pessoa abençoada e, ao mesmo tempo, severamente amaldiçoada.”

Humph. O mordomo suspirou, confuso. Assim como seu patrão, ponderou por apenas alguns instantes, e quando julgou a si — e ao mestre — satisfeito, se retirou do quarto.

Não era necessário colocar em palavras o fim daquela conversa. Independente das coisas que tenham acontecido naquele local, tudo que podiam fazer era rezar pelo retorno seguro de Jessie e James.

Ainda que não estivesse lá, Alamut tinha certeza de que ambos estavam passando por dificuldades tão grandes que ninguém poderia sequer imaginar. Outra vez, ele rezou.

Enquanto o olhar do nobre vagava pelo céu, o dos detetives recaia sobre outra coisa.

— É bem longo, né? — disse Jessie.

— Nunca vi um tão comprido. Qual a necessidade de um tão grande?

— Ora! Estamos em uma mansão, é de se esperar que os corredores sejam longos. — Ela subiu o último degrau da escada.

Finalmente, eles estavam no segundo andar. No corredor contrário, a estátua já havia desaparecido.

Do local onde estavam, era notável que, acima da porta principal havia uma varanda interna, um ótimo ponto de referência para saber se a criatura de pedra estava contornando-os.

Bora lá! Jessie tomou a iniciativa e começou conferindo as portas, enquanto James ficava de vigia na beira da escada.

Um total de sete quartos foram contados, cada um numerado em ordem crescente em direção ao fim do corredor. No entanto, existia uma peculiaridade, pois todos os números eram precedidos da letra D.

— Isso virou um hotel agora? — De relance, ele analisou o interior de alguns dos cômodos. — São todos quartos normais, e com poucas diferenças, pelo que vejo.

De instante, teve de se apoiar na parede ao sentir uma pontada na lateral do corpo. A dor ia e voltava, como um trem numa ferrovia circular. Além daquilo, outro incômodo era aquele “D”. Será que todos os quartos eram de D. Rossi? Seria sacanagem.

Fazendo seu papel de voz da razão, Jessie tratou de responder.

— Deve ser D de Dormitório, mas depois de ver uma estátua viva, eu não duvido de mais nada. — Ela entrou em dos quartos, atraída por algo. — Ei, vem ver isso aqui!

Usando a parede de apoio, o homem empurrou o próprio corpo até o D3. Encostando-se na batente da porta, observou a mulher puxar uma caixa preta bastante empoeirada debaixo da cama.

Numa vasculhada rápida, não encontrou nome, assinatura nem qualquer outro sinal de identificação, era literalmente apenas uma caixa negra. Movida pela curiosidade, ela lentamente retirou a tampa, tendo o nariz atacado por um poderosa ardência.

ATCHIM! Após erguer uma nuvem de sujeira tão densa quanto a névoa da floresta, ela se pôs a analisar o conteúdo junto do marido.

O interior estava preenchido por lenços pretos, os quais protegiam de qualquer male externo uma câmera, bastante habitual para os detetives. Era semelhante ao modelo polaroid, talvez uma das primeiras versões desse.

— Impressionante — iniciou James —, esse modelo é bem desenvolvido, considerando que deve ser de séculos atrás.

Em um reflexo, Jessie pressionou o botão para fotografar, surpreendida por um flash que quase cegou tanto ela quanto o parceiro. Independente disso, um sorriso se formou na face de ambos. Ela funcionava!

No entanto, a surpresa ainda não havia acabado, pois segundos após a foto, um papel fotográfico foi expelido pela saída, mas não como estavam acostumados.

— A foto… já veio revelada!? — A mulher parecia uma criança impressionada com um truque de mágica. — Que tipo de tecnologia é essa??

James se aproximou e, com dificuldade, ajoelhou-se ao lado da mulher. Os dois estavam pasmos com aquela câmera, tanto que demorou para notarem algo muito mais importante.

Tum…

Apesar de não se igualar, foi como uma explosão em suas mentes, que lhes trouxe de volta à realidade.

Nenhuma palavra foi dita, apenas as atenções que foram levadas até a porta do cômodo. Diferente de um segundo atrás, essa estava bloqueada por uma parede viva, a qual encarava a alma dos detetives com afinco.

“Como ela veio parar aqui? Eu conferi o corredor antes de entrar!!”

James se perdeu em suas próprias lamentações, enquanto Jessie outra vez bolava um plano de emergência.

Um local tão pequeno, e aquela coisa era extremamente poderosa, um simples balançar de braço ali seria o bastante para atingir qualquer um dos dois.

Tum…

Sem tempo a perder, a criatura avançou.



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