A Mansão de Alamut Brasileira

Autor(a): Safe_Project


Volume 1

Capítulo 15: Pena de Morte

Atirada no chão, Jessie mostrava estar apenas desacordada. Felizmente, nenhum sinal de agressão física era notável, ao contrário de James, que nada apresentava além de lesões que ultrapassavam até a barreira do físico.

Diante a estátua alada e cercado por cópias dessa, a mente do detetive agora beirava o penhasco da própria sanidade.

“Ter liberdade… depende de mim!? Que situação repentina é essa??”

Vasculhando os arredores, não demorou à entender a possível razão de tal escalonamento. Um, dois, três… o-oito!? Um total de oito mandamentos já estavam completos, mas desde quando!??

Não mentirás e Não Trairás! Apenas aqueles dois malditos altares continuavam apagados, todos os outros haviam sido cumpridos!!

Se o plano já havia avançado até tal nível, a criatura deveria corresponder à altura, certo? A Fase Adulta e as Cinco Ordens… Qual delas seria usada para atacar dessa vez?

“Independente do que ela use, eu tô fudido de qualquer jeito. Mas… será que ela realmente quer me atacar?”

Exceto pela estátua no auge das escadas, as outras permaneciam imóveis, apesar dos olhares fixos no detetive.

Não pareciam ter vontade própria, eram mais como fantoches sendo controlados por uma linha invisível, cuja partia da imagem que James julgava ser a original.

Foi então que aquela voz perguntou:

Você tem medo?

E isso não seria normal do ser humano? Se tal questionamento saísse por sua boca, a chance de sobrevivência teria desabado com toda certeza!

“Você tem medo?” Não precisaria ser um gênio para descobrir ao que a figura se referia. Na verdade, com tantas incorporações da morte ao seu redor, aquele sentimento já começava a ser costumeiro em seu coração.

Uma curta hesitação travou sua garganta, mas as palavras saíram à base da força bruta.

— Eu não temo.

Um silêncio perdurou, deixando correr o tempo necessário para que o pesar daquela resposta fosse tangível ao homem.

“Esses dois últimos altares… Como exatamente eu posso cumpri-los? Será que eu consigo fazer isso sem a ajuda da Jessie?”

Para a sua infelicidade, as dúvidas que tapavam seus olhos com linhas de palavras impediram-no de reagir ao passo próximo.

Uma superfície áspera desceu contra seu rosto num embalo equivalente ao de uma avalanche.

Ao perceber que a cabeça poderia se desconectar do pescoço, o corpo reagiu e voou junto dela em direção à parede.

No momento em que o corpo colidiu e começou a se aproximar do chão, o tambor ecoou novamente.

Numa única batida, James estava de volta ao ponto zero. A estátua que lhe acertou já havia se misturado com as outras, e por mais que não tivesse, não era como se fosse capaz de puni-la ou algo do tipo.

A pergunta foi feita pela segunda vez. Você tem medo?

Nenhuma dor, absolutamente nada. O hematoma em seu abdômen estava ali, firme e forte, e agora sua saliva assumia um tom avermelhado, assim como o mal estar lhe impedia de sequer usar os braços para se levantar.

Mesmo considerando tudo isso, não havia qualquer dor ou sensação que de fato devesse evitar o corpo de se erguer. Naquela cena, ele era basicamente um homem saudável fazendo birra para uma criatura de pedra.

“A falta dessas sensações…!! Em qual das habilidades esse efeito se encaixaria?”

Talvez não se conecta-se com nenhuma, mas do que diabos essa informação ajudaria naquele momento!? Tempo era inexistente num momento em que seu corpo estava sendo levado ao limite em todos os sentidos.

A voz veio uma terceira vez. Eu perguntei. Você tem medo?

E entre as tremulações de seus lábios, a voz saiu. — Nã-não!

Blow!! Um chute certeiro em seu crânio fez o cérebro chacolhar incontáveis vezes e tão velozmente quanto um carro em alta velocidade.

Os braços cederam, e o rosto colidiu contra o chão duro. Agora mais imóvel que sua esposa, o corpo era observado pelo juiz.

Será que havia exagerado? A face inóspita parecia ponderar exatamente isso, ao mesmo tempo que almejava um resultado diferente. E para tal, uma reação causada por fator externo era mais que necessária.

Uma faísca elétrica atravessou os altares, e ao se aproximar o bastante, a descarga saltou até o corpo do detetive.

Então, como se emergisse depois de horas debaixo d’água, sua respiração retomou num ritmo acelerado.

“Tudo ficou branco por um segundo… Eu desmaiei? Não, foi algo diferente!!”

Apesar de ter aberto os olhos, tudo que enxergava era aquele chão de pedregulhos. O corpo não movia, sequer a cabeça ou o próprio olhar se movimentavam um centímetro que fosse.

Tudo que atravessava seus ouvidos era o lento som de passos. Mas… esses não deveriam ser inaudíveis? Desde que as asas cresceram, nenhum som provinha da estátua. Então… que-

Porra, não pensei que humanos estivessem tão frágeis.

Aquela voz!! Era ela, exatamente a mesma daquele momento horripilante no segundo andar!

“Não é quem estava falando agora! Até parece, mas é diferente!!”

Um arrepio subiu por sua espinha quando um último passo colocou a figura misteriosa bem ao seu lado. Quando essa pareceu se agachar, tudo que o investigador pôde fazer foi sentir aquela leve — quase nula — respiração alcançar seus ouvidos.

— Quanta ignorância, parece até alguém que eu conheço.

“O que!? Aquela potência na voz… sumiu? Agora parece um humano normal!!”

Sentiu algo tocar em sua cabeça, como uma criança cutucando um animal morto. — Ei, eu sei que você tá vivo, fiz questão de não te matar!

Questão? Que tipo de idiota metido a deus diria uma coisa dessas!!? Na verdade, não seria surpresa se esse homem fosse de fato um deus, apesar de que provavelmente seria do Abismo.

— Homens não podem morrer até concluírem seus objetivos mais valorosos. É assim que o povo dessa época pensa, ou estou errado? — Cutucou mais algumas vezes, reagindo à mais curta das movimentações. — Heh! Heh! É claro que não estou errado! Quem você acha que eu sou, afinal? Acho que adoraria ter essa resposta, né??

Naquela altura, a resposta já teria se transformado num grandessíssimo NÃO! Como se já não bastasse a estátua, agora um possível psicopata também fazia presença. Até quando figuras como essa continuariam surgindo?

Por mais que James tentasse responder aquelas perguntas e não adquirisse sucesso, toda essa incapacidade não passava despercebida pelo olho amarelo.

Pobre criatura. O nível de hipocrisia naquele lamento ultrapassava a barreira do humano. Criatura? Agora o sujo falava do mal lavado.

— Eu já te aviso, pequeno coitado. Você não faz ideia de quanto tempo eu aguardo por esse momento, e essa vai ser a sua última chance de sair, então é melhor não me decepcionar, entendeu?

Antes mesmo que pudesse sequer tentar negar com a cabeça, uma nova descarga de energia partiu de uma das mãos da figura e acertou o detetive em cheio, envolvendo seu cérebro numa luz dourada forte o suficiente para matar qualquer um, mas que dessa vez teve um efeito diferente.

Enquanto o ambiente se tornava branco, a consciência do homem acreditava ter apagado, sendo refutada pelo surgir de silhuetas negras naquela paisagem infinita.

                                                                                                    

Uma se inclinava para frente, cansada e ofegante, enquanto outra permanecia ereta, apesar de estar numa situação aparentemente tão complicada quanto a outra.

Essa segunda se colocava sob uma poça negra, formada por um líquido que pingada de si mesma. Por mais suja que estivesse, os braços abertos não mostravam medo ou nojo de nada, assim como as palavras que se seguiram.

— Espero que sua confiança em mim… ainda esteja viva.

                                                                                                    

Enfim, tudo escureceu-se ao passo que uma energia negra tomava a figura mais precária de energia, imbuindo não apenas o ambiente, mas todos que ali estavam presentes.

Bz-btzz! Um espasmo repentino percorreu seu corpo, quase ao ponto de controlá-lo, mas pelo menos lhe ajudando a erguer a cabeça.

JESSIE! Foi a primeira coisa que pensou em gritar antes de qualquer coisa, mas o que se colocava diante de seus olhos não parecia querer ser interrompido.

A estátua permanecia ali, parada e apenas espectando. Porém, a mão agora usava do dedo indicador para atrair a atenção do detetive para o lugar desejado.

Com dificuldade e hesitação, James o fez, girando a cabeça o máximo que conseguia para vislumbrar a paisagem atrás de si.

“Está… aberta.”

Esfregou os olhos e virou o corpo inteiro naquela direção. Por alguns segundos, tudo que fez fora apreciar a bela visão das árvores que a porta de entrada lhe proporcionava.

“Je-Jessie!” Ele agarrou o corpo da esposa. — Jessie!! Acorda!! Não é hora pra desmaiar, acorda!!!

Escolha!

“Hum?” Fitou a escultura. Sem sinal de movimentação. — E-escolher…?

Piscou repetidas vezes na intenção de ter certeza da realidade que enxergava, mas tudo que aconteceu nesse processo foi o aumento de sua dúvida no mundo.

Um dos lados de sua vista escureceu, ainda que o olho continuasse aberto. A voz do Abismo então disse:

Você é um detetive, né? Basta analisar a situação, tenho certeza que não preciso te fazer uma explicação chata.

Obedecendo aquele conselho em tom de ordem, seu único olho funcional deslizou pelos altares novamente. Não Mentirás e Não Trairás, ambos permaneciam apagados, ao mesmo tempo que a luz dourada dos outros altares parecia tentar alcançá-los.

O foco então caiu na porta aberta, a qual usava da leve brisa fresca do lado de fora para provar sua veracidade, além de atrair os impulsos do homem mais do que qualquer outra coisa.

Então, a escultura. Não mais apontava para a saída, se colocando na posição original e isenta de um punho na mão direita.

Não importava o resultado que James escolhesse, a resposta da estátua seria dada à altura de sua vontade, pelo menos era isso que o detetive sentia ser transmitido daquela calma criatura de pedra.

Por fim, mas nem de longe o menos importante, fitou de canto a esposa ainda desacordada, mas cuja respiração se mostrava cada vez mais vívida.

Então…?

Um sorriso surgiu no rosto de James, mas seria impossível dizer à quem aquele gesto pertencia exatamente.

— Realmente, não foi muito difícil entender.

Acompanhando o sorriso, uma gota de suor frio escorreu pela lateral ainda humana de seu rosto. O olho de mesmo lado se agraciou com as árvores outra vez, para então ser levado até a estátua.

À frente de sua mulher, formou-se uma barreira humana. Os braços agora cruzados e os pés firmes no chão falavam por si só, complementados com a certeza que os olhos castanhos transmitiam.

O sorriso se intensificou, e a voz então perguntou:

Você tem medo?

O homem engoliu seco. — Claro que tenho, mas meu medo seria superado pelo desgosto se eu simplesmente saísse por aquela porta.

Um movimento se fez por parte da estátua. Lentamente, ela desceu pelas escadas em direção ao homem, esse que simplesmente permaneceu parado, aguardando a aproximação da figura.

Quando o evento aconteceu, e a estátua estava a centímetros de distância, a mão direita se ergueu, deixando ao homem a escolha de como aproveitar o seu último instante de liberdade.

Em um raro tom de zombaria, James disse:

— Até um covarde possui valores dos quais não consegue fugir.

Heh! Bela resposta!

Um estalar de dedos pôde ser ouvido, sendo esse o último som a ecoar antes da mão julgadora desabar.

Excisar, aquela era a palavra escrita na quinta ordem. Uma palavra derivada do verbo “cortar”, mas que não fazia sentido à primeira vista. Como aquela estátua cortaria alguém se nem arma carregava?

James havia se esquecido de um detalhe. Aquela coisa não era daquele mundo, e algo tão incompreensível não se prende à meras palavras.

Com os quatro dedos alinhados e o polegar contra a palma de pedra, a mão nua rasgou o ar ao ponto de deixar um rastro por onde passou. Um corte liso e certeiro, que traçou sua trajetória a partir do ombro esquerdo e beirando o lado direito de seu quadril.

Seus olhos reviraram ao passo que os membros se desconectavam como num quebra cabeça. Por fim, o desequilíbrio o levou ao chão, terminando o serviço de evidenciar a fratura.

Para uma infeliz coincidência de uns e alegria de outros, foi nesse exato instante que Jessie finalmente se levantou.

— O que…? O que aconteceu? Ja…! Cadê o!!

Aquilo em sua frente não poderia mais ser considerado um corpo, apenas duas fatias.

O intestino inteiro abraçava o chão, junto de outros órgãos que choravam os últimos mares de sangue antes de perderem sua cor.

O chão agora se tornava vermelho, e uma voz distante suplicava seus últimos pedidos de socorro para a última alma viva no local, enquanto essa tentava processar um único questionamento; único que sua mente era atualmente capaz de se fazer.

— O que eu faço?



Comentários