Volume 4
Capítulo 3: Palavras para Parar um Coração
Parte 1
A Academia Real de Maquinagem, Walpurgis, estava sendo iluminada pela luz pálida do anoitecer.
Atrás da Faculdade de Medicina, dentro de um bosque, prestes a escurecer.
Com um meio-manto envolto por cima de seu ombro, Loki o adentrou. Sua marionete, Cherubim, seguiu atrás dele, olhando para seu mestre com brilho nos olhos.
— Loki.
Levantando-se de um banco, uma garota descalça o cumprimentou. Seu vestido branco era como uma outra lua no céu. Seus longos cabelos fluíam ao vento, oscilando momentaneamente.
Sua pele branca enrubesceu e ela sorriu brilhantemente, como uma flor se abrindo.
— Você veio.
— ... Eu era aquele que se perguntava se poderíamos nos encontrar novamente.
— Está tudo bem? Você não estava proibido de sair da Enfermaria?
— Isso não é algo com o que você precise se preocupar.
A garota pôs-se a olhar para baixo. Loki rapidamente acrescentou,
— O Cruel não é uma pessoa teimosa. Há muitas formas de acalmá-lo.
— ... Obrigada. O Loki é muito gentil.
— Não seja ridícula. Eu não sou uma pessoa amável de forma alguma.
— Eu sinto muito...
Ela voltou a olhar para baixo. Loki estalou a língua.
— Não fique aí parada, sente-se.
— Tudo bem...
Ela baixou sua cintura fina sobre o banco. Ao fazê-lo, seus ombros tremeram ligeiramente.
Loki tirou seu manto, colocando-o sobre a cabeça dela.
— Loki...?
— ... Ver você tremendo desse jeito é desagradável.
Ela escondeu o rosto no manto e o apertou contra si mesma.
— É quente...
O habitual olhar penetrante de Loki desapareceu. Quando ele mesmo notou isso, Loki forçou um olhar severo e sentou-se ao lado dela de forma um pouco violenta.
— ... Eu não sei seu nome.
A garota se assustou e, em seguida, deu uma risada autodepreciativa.
— Eu sou Fragarach Mark 5—
— Isso não é um nome para um ser humano.
— Mas você já notou isso, não é? Eu sou um autômato...
— Você é humana.
— ...!
— Se eu aceitar que você é um autômato, isso significaria dizer que minha irmã e eu também somos autômatos.... Você já deve saber disso, certo? Minha irmã e eu possuímos um coração mecânico.
Eventualmente, a garota sussurrou suavemente seu nome como se fosse algum tipo de segredo.
— Sophia.
— Sophia, hum?
— E quanto ao verdadeiro nome do Loki?
— Loki está bom.
— Isso é injusto.
— Não é injusto. Isso é uma punição.
— ... Punição?
— Decidimos nos chamar desse jeito.
A garota— Sophia assentiu em entendimento, em seguida ficou em silêncio.
Ela permaneceu presa em profundos pensamentos por cerca de dez segundos.
Finalmente, ela se virou para Loki como se tivesse tomado sua decisão.
— Ei, Loki. Você já pensou ‘Eu quero morrer’ ...?
— ... Não. Eu não sou tão nobre assim. Se você perguntar sobre quantas vezes eu pensei ‘Eu não quero morrer’, no entanto, suponho que eu possa dizer que foram inúmeras vezes.
— Você é forte.
— Eu não sou—
— Eu apenas estou... muito cansada...
A voz dela estava emocionada. Roubando um olhar para ela, a respiração de Loki congelou.
Algo brilhante e molhado estava fluindo pelas bochechas dela.
— Eu odeio... conflitos.
— ...
— Eu odeio... pessoas morrendo... toda aquela matança...!
Suas lágrimas continuavam a cair uma após a outra.
Seus pequenos ombros tremiam como se ela estivesse tentando suportar a dor. Ela abraçou a si mesma.
No calor do momento, Loki estendeu a mão para ela—
Mas parou no meio do caminho.
Enquanto sentia-se irritado com sua impotência e, ao mesmo tempo, ficava completamente perdido quanto ao que fazer, ele esperou até que ela parasse de chorar.
Depois que se acalmou, Sophia enxugou as lágrimas e se desculpou.
Ela lançou um olhar sério para Loki enquanto falava.
— Sabe... Na verdade, eu tenho um pedido para o Loki.
— Um pedido?
— Eu—
Ela contou a ele o seu pedido. Ouvindo-a, por um breve momento, o coração de Loki parou de bater.
Parte 2
No momento em que compreendeu as palavras de Shouko, por uma fração de segundo o coração de Raishin deu um salto.
Ele virou-se reflexivamente em direção a Irori. No entanto, Irori não devolveu seu olhar.
Shouko enfiou a mão na manga, retirando de lá uma placa que tinha aproximadamente o tamanho de um espelho de mão.
Entalhes finos tinham sido esculpidos tanto vertical quanto horizontalmente e as palavras tinham sido inscritas delicadamente na forma de códigos. Apenas de olhar para ele, Raishin podia sentir a energia mágica que ele irradiava. Haviam duas luzes brilhantes acima dele, como se fossem vaga-lumes.
— Este painel corresponde aproximadamente a Cidade das Máquinas. Esta luz representa a Irori e essa outra é a Komurasaki.
— ... Onde está a Yaya?
— Desapareceu. A reação da Yaya desapareceu. Em outras palavras, ela está morta.
O que foi que ela disse...!?
— —Ou isso poderia significar que a energia mágica dela foi selada. Em outras palavras, ela caiu nas mãos de outra pessoa. Suas funções já foram interrompidas e ela está sendo mantida neste estado.
— Nesse caso, isso quer dizer que ela está viva.
— É igual a como se ela estivesse morta. Não é possível trazê-la de volta. É por isso que você deve desistir dela. Em seu lugar, você irá usar a Irori—
— Como você pode esperar que eu simplesmente aceite isso!?
— Eu posso. Observe atentamente.
Ao mesmo tempo em que falava, Shouko liberou energia mágica.
Com seu circuito mágico sendo carregado, os olhos de Irori começaram a brilhar com uma luz prateada e o ar, o vento, a atmosfera ao redor deles literalmente congelou.
Uma grande coluna de gelo formou-se ao lado de Raishin. Seu tamanho e altura rivalizavam com a Torre do Relógio.
O vapor de água na atmosfera tinha sido completamente congelado em apenas um instante. Junto com o ar gélido, isso passava um frio sentimento de morte. As pernas dos alunos que passavam por ali cederam e eles gritaram de medo.
Com um estalar de dedos, o pilar se quebrou. Houve um misterioso ruído de crepitação quando o pilar desintegrou-se em uma névoa de gelo, derretendo ao ser tocada pelo vento quente.
— Este é o circuito Himokagami. O poder ofensivo da Irori é muito superior ao da Yaya—
— Eu não estava falando sobre isso!
Raishin levantou-se, aproximando-se de Shouko com força o bastante para prender sua atenção.
— Se ela está viva, por que você não vai tentar salvá-la!? Se ela foi roubada, por que você não vai fazer nada para recuperá-la!? Se você não quiser fazer isso, então eu vou ir procurar por ela—
Ele tentou girar sobre os calcanhares, mas então notou algo estranho. Suas pernas não se moviam. Elas nem sequer se mexiam!
Olhando para baixo, ele viu que seus sapatos tinham sido congelados, prendendo-o firmemente ao pavimento de pedra.
Incapaz de se mover, Shouko lhe deu um tapa.
A força dela era inacreditável. O gelo ao redor de seus pés se quebrou e Raishin foi jogado na calçada.
— Ouça até o fim, garoto.
Suas palavras eram frias. Olhando nos olhos dela, ele podia ver a intenção assassina que havia no olhar de Shouko.
— Esta manhã, um convidado apareceu. Escolher o contato direto foi algo bastante audacioso, posso acrescentar.
Raishin pensou no telefonema daquela manhã. Do outro lado, algo havia acontecido.
Pelas palavras da Shouko, quando ela disse ‘convidado’, ela provavelmente estava querendo dizer ‘inimigo’ —
— O que você acha que esse convidado disse?
Shouko riu cinicamente enquanto fazia uma pergunta retórica. Em seguida, ela continuou,
— Desejamos uma relação de amizade entre nossos países. No entanto, não podemos ignorar calúnia ou difamação contra o nome do nosso país. Nós recomendamos fortemente que vocês considerem cuidadosamente a situação— em resumo, se vocês nos acusarem falsamente de qualquer coisa, isso vai levar a uma guerra.
— Acusar falsamente? Mas nós não dissemos nada ainda...
— Exatamente. Eles fizeram essa declaração enquanto ainda não tínhamos nenhuma compreensão quanto a situação. Em suma, eles já se anteciparam a nós.
Dizer a eles para não tomar quaisquer medidas era, efetivamente, um aviso para que se rendessem.
— A Inteligência investigou o assunto. O líder é um membro de uma Família nobre Alemã, Rosenberg. Se você agir de forma imprudente, então posso dizer com certeza que isso vai acabar se transformando em uma guerra.
Suor frio escorreu pelas costas de Raishin.
Ele sentia que a situação era muito maior do que havia pensado. Isso já não era mais apenas um problema pessoal dele.
— Mas não podemos simplesmente deixar isso passar! A Yaya ainda está nas mãos deles...
— A construção e o circuito mágico da Yaya não são assim tão simples. Eles irão levar vários anos para desmontá-la. Replicar o mecanismo interno dela vai demorar mais ainda. Mesmo quando eles conseguirem reproduzir uma cópia completa da Yaya, serão precisos vários anos até que eles consigam implantá-la em um combate real. Além disso, se tivéssemos que ir à guerra, a verdade é que o Exército Japonês não ficaria em desvantagem—
— Eu não me importo com nada disso!
Raishin bateu no pavimento de pedra enquanto olhava para Shouko, cujo rosto estava sereno.
— Você está me dizendo para me afastar e assistir a Yaya morrer...!?
— Foi o que as altas patentes decidiram.
— Mesmo assim!
— Quem é sua mestre, garoto?
Raishin ficou em silêncio. Shouko continuou a pressioná-lo.
— Você já desobedeceu minhas ordens incontáveis vezes, garoto. Você até mesmo mentiu para mim uma vez.
Raishin cerrou os punhos. Ele não podia argumentar contra isso.
— E você ainda tem que realizar uma coisa. Você quer voltar para o Japão e viver a vida amarga que costumava ter?
— ...
— Se é esse o caso, você vai ser... eliminado, uma vez que conhece segredos militares.
— ...
— Você se lembra da nossa aposta? Eu posso tomar sua vida agora mesmo, é o que você deseja?
— ... Você realmente acredita que eu desistiria da Yaya para salvar minha própria vida?
Obviamente, ele não estava planejando morrer. Ainda havia a questão dela tomar sua vida.
— É verdade. Usar sua própria vida para fazê-lo refém seria completamente inútil. Nesse caso, eu vou perguntar isso a você. Você compreende plenamente as implicações de ‘começar uma guerra’, garoto?
Raishin franziu a testa.
— O que isso quer dizer?
— Você já ouviu falar da frase ‘Barril de pólvora da Europa’?
— ... A península Balcânica?
Ele havia escutado algo assim durante suas aulas de História. Ele não tinha um conhecimento profundo do tema, no entanto.
— É um lugar no qual pessoas de diferentes nacionalidades estão todas misturadas. E cada uma delas deseja estabelecer seu próprio país. Essa é a pólvora.
Raishin esperou em silêncio que Shouko continuasse. Irori também parecia intrigada e ouvia atentamente.
— Há uma tensão muito volátil entre a Áustria e a Sérvia quanto a uma disputa territorial. Por trás da Áustria está a Alemanha e a Rússia é quem está controlando a Sérvia pelos bastidores.
— ... Portanto, uma guerra entre representantes de países de maior dimensão?
— Levando-se em conta todas as probabilidades, dessa vez é a Rússia que terá que fazer concessões. Entre a guerra Russo-Japonesa e a Revolução Civil, o Império Russo está à beira do colapso. No entanto—
De repente, ela apontou seu longo e bonito dedo para o peito de Raishin.
— É aí que você entra, garoto. O Japão é um aliado da Inglaterra. Se a informação de que um autômato— que contém informações militares— foi roubado, o que você acha que a Inglaterra faria?
— Bom... Para manter as aparências, eles teriam que pressionar a Alemanha a devolvê-la...
— Exatamente. Além disso, dependendo das circunstâncias, eles poderiam até mesmo desenvolver projetos secretos com base nesses segredos. Além disso, obviamente a Alemanha recusaria tal pedido apenas por uma questão de orgulho. Se esta disputa entre Alemanha e Inglaterra acabasse se tornando pública, então a Rússia já não teria razões para temer a Alemanha. Você pode ter certeza de que a Áustria e a Sérvia entrariam em guerra logo em seguida... E se isso vier a acontecer, todos os países vizinhos vão ser envolvidos.
As chamas da guerra se espalhariam por todo o mundo.
Seria uma guerra de escalas que o mundo nunca viu até agora. Toda a Europa estaria envolvida no conflito!
— Algo como o autômato de um estudante transferido é apenas uma pequena faísca, mas essa pequena faísca poderia explodir um barril de pólvora. Eu não tenho nenhum interesse em ver o mundo queimar... Mas você tem mesmo a vontade para puxar o gatilho e iniciar uma Guerra Mundial, garoto?
Raishin mordeu o lábio.
Nenhum som escapou por sua boca.
(Eu... eu tenho sido um pirralho ingênuo!)
Ele só estava pensando em si mesmo. Ele não tinha considerado a imagem como um todo.
Este não era mais um problema que Raishin poderia esperar resolver apenas descuidadamente arriscando sua própria vida.
O mundo e a Yaya.
Se ambos fossem colocados em uma balança, ela penderia completamente para um único lado.
— Se você entendeu, mostre um pouco de autocontenção, garoto. Irori, vou deixá-lo em suas mãos.
— Sim, Senhora.
Deixando o restante para Irori, Shouko virou-se e partiu rapidamente.
Parte 3
Com Irori atrás dele, Raishin voltou para a Faculdade de Medicina.
Cruel era como um vulcão em erupção. Suas reclamações voavam como balas de uma metralhadora. No entanto, assim que ele viu que Raishin não mostrava nenhuma reação as suas broncas,
— ... Chega. Apenas volte logo para a cama e se recupere!
Cuspindo essas palavras, ele dispensou Raishin.
Saindo do consultório médico, ele entrou na Enfermaria.
Ela estava completamente vazia. A figura de Loki não estava em lugar algum em seu campo de visão. Cherubim e Frey também não estavam lá.
De repente, ele percebeu que havia um envelope sobre sua cama.
Abrindo-a, ele pegou o conteúdo e leu.
— Raishin? O que é isso? Uma carta...?
— É uma carta de amor.
— Eh!? O-O Raishin inesperadamente é muito popular!
Irori estava surpresa. Embora tivesse uma figura esbelta e bonita e apesar de seu ar de maturidade, ela era totalmente ignorante quando se tratava de assuntos de amor. Raishin dobrou a carta e a guardou no bolso.
— Sabe, agora que você está aqui, quem é que está protegendo a Shouko?
— Não se preocupe com a Shouko. O exército enviou alguém para protegê-la.
——A inquietação dele aumentou.
Em primeiro lugar, considerando e comparando com a força de Irori, não importa quem eles tivessem enviado, isso ainda o deixaria desconfortável.
— Ah, a propósito, Raishin...
— O que? Por que você está se remexendo assim?
— Está realmente tudo bem eu desempenhar minhas obrigações noturnas em um lugar em que vão haver outras pessoas ao redor?
— Você não precisa fazer isso! Ou melhor, não faça!
— Mas a Yaya diz que serve a você todas as noites—
— Isso é apenas o que ela diz! Nunca aconteceu nada!
— Mas a senhora diz que jovens como o Raishin entram em depressão se não conseguirem liberar suas sementes—
— Até a Shouko!? Que tipo de educação ela deu a vocês!?
Vendo Raishin negar com veemência, Irori riu.
— Eu estou brincando. É apenas uma piada, Raishin.
Colocando a mão sobre a boca, ela riu com elegância. Raishin sentiu uma dor no peito, sobre a qual ele não pôde fazer nada.
— ... Não exagere, Irori.
— Você disse alguma coisa, Raishin?
Ela sorriu para ele. Irori provavelmente tinha fingido não escutar sua última frase.
Sendo assim, Raishin também fingiu não ter dito aquilo.
— Desculpe. Você poderia fazer um pouco de chá?
— Claro.
Irori sorriu quando balançou a cabeça, saindo da Enfermaria.
Quando ela fechou a porta, o fato de que havia um brilho não natural em seus olhos não escapou a atenção de Raishin.
Embora Yaya a considerasse um incômodo, Irori amava muito a Yaya. O fato de que a Irori estava muito mais falante do que o habitual provavelmente era devido ao quanto ela estava preocupada com a Yaya.
Ele só podia imaginar como ela estava se sentindo, após dizerem a ele para desistir da Yaya.
Sua impotência transformou-se em raiva e Raishin cerrou os punhos. Naquele momento, houve uma batida no vidro, como se um certo alguém estivesse apenas esperando até que Irori saísse do quarto.
Depois de um tempo, Irori voltou com um bule de chá preto.
— ... Raishin?
Não havia mais ninguém no quarto.
O vento soprava pela janela aberta, fazendo com que a cortina branca balançasse.
Parte 4
Guiado por Sigmund, Raishin saiu para a Rua Principal.
Estava barulhento por causa de toda a atividade. As ruas estavam cheias com estudantes, todos indo em direção ao campo de batalha. Como ontem tinha sido a primeira batalha de verdade em algum tempo, havia um burburinho de expectativa também para esta noite.
Na lateral da rua, Charl estava sentada em um banco iluminado pela luz de um poste. Uma expressão mal-humorada podia ser vista em seu rosto.
Sem Sigmund ao seu lado, ela parecia muito desconfortável enquanto ficava olhando para os arredores.
— Obrigado por vir, Charl.
Ouvindo a voz de Raishin, a expressão de Charl suavizou e, em seguida, ela virou a cabeça com arrogância.
— Eu escutei algo sobre os Kreuzritter, então eu saí do meu caminho apenas para te contar sobre isso. Seja grato e ouça com reverência.
— Ah, sim, você tem minha gratidão. Eu humildemente peço que você me conte.
— Vo... vo-você está sendo tão honesto que chega a ser assustador. É inquietante e repugnante.
Com o rosto vermelho, Charl atirou insultos a ele. Ela então tossiu e fez um gesto exagerado para limpar a garganta.
— O participante programado para fazer sua entrada esta noite é o 74º Assento e eu chequei todas as entradas até o Assento que tomará parte esta noite na Festa Noturna. Inglaterra, Holanda, Espanha, Índia— os países dos quais vem os participantes estão por todos os lados.
— Mas eles são da Alemanha, não são? As nacionalidades deles são todas falsas?
— Não, são todas reais. Mentir sobre algo assim faria com que você fosse expulso.
Exatamente como no caso da Henri, cujos documentos tinham sido falsificados e, por isso, ela acabou sendo expulsa.
— Embora à primeira vista eles possam parecer com pessoas aleatórias unidas em um grupo, todos têm algo em comum, além de seus autômatos. Todos eles entraram na Academia através de algo chamado de Bolsa Lawrence.
— Uma bolsa de estudos... então eles estão pagando as mensalidades?
— Eles estão pagando através da bolsa de estudos. A Bolsa Lawrence baseia-se em Londres. Ela recolhe doações do público e paga a mensalidade de estudantes superdotados.
— Essa é uma forma indireta de fazer isso. Então? Aqueles fazendo as doações são da Alemanha, eu suponho?
— Os Kreuzritter nem sequer se preocupam em esconder quem são de verdade. Eles orgulhosamente se anunciaram, ao que parece. Na verdade, ao revelar ao público que estão patrocinando vários alunos, isso também poderia funcionar como método de aplicar pressão aos demais participantes da Festa Noturna.
Hipoteticamente, se Loki, Frey e Raishin desistissem na noite de hoje.
Isso significaria que apenas os Kreuzritter seriam deixados no campo de batalha. Cada participante futuro teria que desafiá-los sozinho.
A única alternativa seria reunir aliados, exatamente como eles...
— A propósito, por que eles se colocaram em Assentos tão baixos?
— Estou chocada, seu idiota. De cabeça, eu posso pensar em três motivos. Em primeiro lugar, os resultados poderiam ser facilmente manipulados. Seus esforços não teriam sentido se eles não estivessem agrupados. Conseguir ficar posicionados em sequência seria muito mais fácil nos Assentos inferiores do que nos superiores.
— Entendo. E quanto ao segundo?
— O estado da Festa Noturna ainda está em andamento. Se outra equipe se formasse diante deles, isso poderia fazer com que a situação como um todo ficasse bastante complicada.
— Isso soa razoável. E o terceiro?
— Eles seriam capazes de desafiar setenta pessoas diferentes. Você entendeu?
Charl aproximou seus lábios dele, baixando a voz para que as outras pessoas não pudessem ouvi-la.
— O objetivo final da Festa Noturna não apenas obter o trono do Wiseman. Assim como a D-Works fez...
— Testes de artes mágicas.
— Todos tem dito isso, sabe. Há um bom número de protótipos que entraram para a Festa Noturna. Em outras palavras:
— Ao lutar contra protótipos de outros países, eles podem roubar suas técnicas mais recentes?
— Não há melhor maneira de coletar informações do que em um combate real. Ao participar de um combate prático, você pode facilmente analisar os pontos fortes e fracos do oponente.
Essa era a razão para um número tão elevado de pessoas!?
Existiam quatorze— embora cinco já tivessem caído, ainda restavam nove deles. Seria muito difícil que eles fossem derrotados.
Se eles conseguissem durar todo o caminho até o fim, então o Wiseman agora e nos próximos anos seria—
Além disso, eles seriam capazes de investigar as artes mágicas dos outros países e, se as circunstâncias permitissem, até mesmo de roubá-las.
Que grupo esperto. Para não mencionar sua ganância também.
— É revoltante... Obrigado por investigar tudo isso para mim.
— Na-Não tenha a ideia errada. Eu disse que isso é apenas uma coisa que eu escutei. A sua audição deve ser tão ruim quanto o seu rosto. Sua memória também é terrível. Eu sou Charlotte, da Casa Belew. Por que alguém como eu iria passar por todos esses problemas apenas por sua causa?
— A Charl foi até o Comitê Executivo e exigiu todas as informações que eles tivessem.
— Fi-Fi-Fique quieto, Sigmund! Eu vou trocar seu almoço de frango para larvas de grilo!
Charl ficou vermelho brilhante e virou o rosto para o outro lado.
— Eu poderia ter que enfrentá-los eventualmente, assumindo que eles vão continuar vencendo e avançando rodada após rodada. É natural que eu simplesmente planeje uma contramedida para quando essa hora chegar. Além disso... eles são pessoas que sequestram autômatos dos outros e autômatos não são apenas objetos.
Havia um brilho de raiva em seus olhos. Assim como Frey e seus tipos Garm, Charl também tratava os autômatos como se fossem parte de sua família.
Sentindo seu peito aquecer subitamente, Raishin desviou o olhar.
— ... Obrigado.
— Ma-Ma-Ma-Mais importante que isso, o que você vai fazer!? Mesmo com a minha força, eu ainda não consegui descobrir para onde eles a levaram. Não temos nenhuma carta sobrando para jogar.
— Não, eu sei para onde eles foram. A verdade é que a Frey simplesmente—
No meio de sua sentença, ele percebeu uma coisa importante.
Ele enrijeceu, como se algo tivesse acabado de colidir com ele.
(Eu sou um idiota! Exatamente como a Charl disse, eu sou um idiota inacreditável!)
Isso tinha passado por sua mente. Ele realmente não tinha percebido isso ainda. Todos os seus planos tinham deixado de considerar um fator importante.
Com Loki e Raishin hospitalizados, eles foram dispensados de participar, mas—
— O que a Frey vai fazer!?
Charl e Sigmund entreolharam-se, com expressões espantadas em seus rostos.
Frey não tinha nenhuma desculpa para se retirar da luta sem ser considerada derrotada. Em outras palavras, ela teria que enfrentar todos os nove sozinha!
(O que podemos fazer...!?)
(O Loki e eu deveríamos ir ajudá-la?)
Não, esse seria um plano idiota. Existiam nove deles. Mesmo com um pequeno aumento no número de pessoas do lado deles, a desvantagem ainda seria esmagadora.
Além disso, ele lembrou-se do ocorrido daquela tarde. Loki tinha sido derrotado em um instante. Seu corpo ainda estava machucado e desgastado. Havia também a questão dele não saber se os reparos no Cherubim já haviam sido ou não completados...
E também, Raishin não tinha sua parceira ao seu lado.
Apesar do poder da Irori ser superior ao da Yaya, eles não tinham o vínculo forjado através de treinos em conjunto que ele e Yaya possuíam. Ele também nunca controlou o circuito mágico da Irori antes.
Isso seria como realizar um teste. Sem mencionar que o corpo de Raishin também estava muito ferido.
A este ritmo, a vitória dos Kreuzritter estaria completamente assegurada...
— Ela deveria se retirar.
Charl não tinha hesitação em sua voz.
— É uma pena, mas é o que ela deveria fazer se não quiser que seus tipos Garm morram impotentes no campo de batalha.
Os tipos Garm de Frey foram construídos com cães vivos como sua base. Eles não poderiam ser reparados como autômatos comuns. Se fossem destruídos, seria o fim para eles.
Tentando confortar um deprimido Raishin, Charl tinha uma delicadeza incomum em seu tom de voz.
— Os objetivos deles são iguais, certo? Enquanto o Loki ainda estiver participando, as esperanças de ambos não irão desaparecer. Uma vez que o Loki esteja completamente recuperado, quem poderia dizer que ele não teria chances de vencer? Até lá, os Kreuzritter podem até mesmo ter seu número reduzido.
Esse era o melhor dos cenários.
— Além disso, mesmo para alguém como o Loki, foi exagero lutar com essas pessoas quando estava prestes a se recuperar.
Originalmente, a suspensão temporária devido a lesão era algo desvantajoso. Os alunos que se retiravam por este motivo tinham uma lacuna a superar. Eles tinham que lutar contra estudantes de classificação mais elevada enquanto seus sentidos ainda estavam entorpecidos pela inatividade.
Inicialmente, o Loki era um membro dos Rounds. Quando leva-se isso em conta, normalmente não haveriam muitos estudantes com classificação maior que a dele, então isso não deveria ser um problema. No entanto, os Kreuzritter tinham deliberadamente se posicionado em Assentos inferiores enquanto escondiam sua verdadeira força. Mesmo que ele tivesse vários planos para colocar em prática, em última análise eram os Kreuzritter quem tinham a vantagem.
Raishin rangeu os dentes, pensando.
A Frey muito provavelmente não aceitaria se retirar.
Essa era a força de sua determinação. Ela certamente tinha colocado todo seu coração e sua alma nisso.
Se fosse esse o caso, o Loki certamente iria ignorar seus ferimentos e ir ajudar a Frey.
Loki jamais abandonaria a Frey. Ele iria protege-la até seu último suspiro. Seus corações eram equipados com um poder especial. Se ele fosse deixado à beira da morte, então esse poder seria liberado...
O autômato iria quebrar— ou o marionetista iria morrer primeiro. Uma dessas alternativas certamente aconteceria.
(Droga! Não há nada que eu possa fazer...!?)
Frey e Loki eram adversários contra os quais ele eventualmente teria que lutar.
Porém, quando ele pensava no belo sorriso da Frey, ou nas vezes em que ele e Loki lutaram lado a lado, ou nos tipos Garm abanando os rabos... Por alguma razão, desistir deles era algo que ele simplesmente não podia fazer.
Ele teria que recuperar a Yaya. De uma só vez!
Raishin apenas estava usando a Yaya como uma ferramenta para sua vingança. Yaya sorria enquanto emprestava a ele sua força. Ele sabia que precisava pagar pelos pensamentos e pelos sentimentos que ela tinha.
Ele simplesmente não podia abandonar a Frey ou a Yaya.
Então, o que ele deveria fazer? O que ele poderia fazer? O que ele poderia fazer...
Neste momento, uma luz se acendeu dentro de sua cabeça.
— ... Haha... Há...
Charl saltou de surpresa, olhando para Raishin como se ele fosse algo inquietante.
— O-O que há com você para começar a rir do nada? Você realmente é nojento.
— ... Eu pensei em algo.
Sigmund inclinou a cabeça, olhando direto para o rosto de Raishin.
— Uma solução para solucionar este problema?
— Sim. Um método para reaver a Yaya sem que a Frey tenha que se retirar.
— Hum? Você realmente pode fazer algo tão conveniente quanto isso?
Charl o fitou com uma mistura de fé e dúvida. No entanto, Raishin apenas se levantou do banco.
— Eu posso. O tempo limite é uma hora antes da meia noite— ainda temos pouco mais de cinco horas.
Com o objetivo de cumprir a obrigação de tempo, Frey teria que ir para o campo de batalha no máximo até as onze horas. Vendo isso de outra forma, desde que eles pudessem resolver a situação até lá, tudo ficaria bem.
— Bem então, o que você vai fazer, Raishin?
— É simples— Nós apenas precisamos esmagá-los.
Rindo em resposta à pergunta de Sigmund, ele colocou a mão no ombro da garota.
— O-O-O que você está fazendo, seu pervertido?
— Charl, Sigmund. Eu sei muito bem que não tenho o direito de pedir isso a vocês, mas, por favor. Me emprestem a força de vocês.
Charl soltou um “Hmph!” e virou a cabeça. Afastando a mão de Raishin, ela cruzou os braços.
— Você realmente é um idiota inacreditável. O Rei de todos os idiotas. Eu disse isso antes, não disse? Desde que seja apenas uma vez... Não importa o que aconteça eu vou proteger você.
— Charl... Isso quer dizer?
— Se você me disser para não ajudar, eu vou transformá-lo em carvão com o Canhão Lustre.
— Você é uma salva-vidas!
Raishin a abraçou sem pensar. Ela parecia suave através de seu uniforme e frágil, como se pudesse quebrar a qualquer momento. Charl, sendo abraçada do nada, rapidamente entrou em pânico.
— Ah— Não— Você— Pare com isso! Não... Ah... Canhão Lustre!
Parte 5
— Então, o que você está esperando que eu faça?
Eles estavam no último andar da Faculdade de Física. Era o andar reservado para os professores.
Em uma sala, a sala da Professora Kimberley, um Raishin com o rosto coberto de fuligem, uma ainda mal-humorada Charl e Sigmund estavam conversando com ela.
O interior da sala estava limpo e arrumado. A mesa tinha sido organizada e os materiais dela estavam dispostos ordenadamente. O piso tinha sido limpo. Em contraste com a última vez que ele tinha visitado aquela sala, era como se aquele fosse um lugar completamente diferente.
Aquela que tinha introduzido ordem ao caos— Henri estava usando seu uniforme de empregada, servindo xícaras de chá preto para Charlotte e Raishin. Ela tinha uma habilidade que Raishin jamais havia imaginado ser possível para uma antiga nobre.
Kimberley tomou um gole do chá que Henri havia servido para ela.
— Você não deveria esperar nada da Nectar. Tudo o que podemos fazer é observar.
— Então você pode fazer algo simples como observar, certo?
— Sim— O que é que você está planejando?
— Algo interessante. Se possível, eu gostaria de uma pequena garantia, no entanto.
— Estou te dizendo isso agora. A Nectar não será capaz de evitar que uma guerra exploda. A Associação governa apenas o lado ético dos magos, mas se isso se transformar em uma guerra entre magos, nós não passamos de uma mera arma no armamento de um país. Além disso, O Pai defende uma política de atuarmos apenas como observadores. Nós não participamos de conflitos violentos.
Ela tinha um tom cínico em sua voz enquanto francamente contava a eles a verdade. Era como se a própria Kimberley estivesse tendo problemas com a postura que a Associação defendia.
— No entanto, vocês desejam observar a verdade, certo? Como uma terceira parte interessada.
— Você não sabe nada sobre guerra. Nadinha.
Ela riu friamente.
— Digamos que eu grave a confusão que você está prestes a causar. Alguém que veja tudo isso irá apontar a sua inocência e a culpa da outra parte. Agora, o que você acha que essa outra parte vai pensar sobre essa gravação?
— ... Propaganda.
— Exatamente. Desde tempos imemoriais, a guerra tem sido sempre causada através da manipulação de rumores em função de uma causa justificada.
— Entretanto, a Academia deve estar inclinada a acreditar na Nectar, certo? Especialmente uma vez que— Às escondidas, aquela raposa velha vai ser obrigada a acreditar nisso, com certeza.
Ele estava se referindo ao Diretor, Edward Rutherford.
Um homem misterioso que sempre aparentava ser uma espécie de agente secreto.
— Isso é verdade... Se a Associação apresentar evidências confiáveis, então a Academia se veria forçada a fazer alguma coisa, uma vez que países de todo o mundo confiam suas melhores e mais brilhantes mentes a esta Academia, este lugar não poderia se dar ao luxo de ser associado a estes bandidos.
Sem mencionar o que eles poderiam fazer se Raishin pudesse produzir provas das atividades ilegais dos Kreuzritter.
— É isso mesmo, podemos acuá-los com a ameaça de expulsão!
Charl exclamou em surpresa. Raishin assentiu.
— Uma vez que fizermos isso, eles não serão mais capazes de controlar quem será o próximo Wiseman e também não vão ser capazes de roubar os segredos de outros países. Vamos esmagar os objetivos deles e eles vão deixar de ter qualquer razão para existir.
— Inacreditável! Você é um canalha! Você é um grande pervertido de coração negro! Aposto que até mesmo a parte inferior do seu corpo brilha com uma luz obscura!
— Não diga coisas estranhas como essa! Você deveria ser uma donzela de uma casa nobre, não é!?
— Eh? A salsicha do Raishin tem um brilho obscuro?
Henri exclamou enquanto abraçava sua bandeja.
Um silêncio instantâneo preencheu a sala.
As orelhas de Henri ficaram completamente vermelhas quando ela fugiu para o canto da sala.
Kimberley continuou falando, como se a última coisa jamais tivesse acontecido.
— Eu entendi. Vou morder sua isca. Vamos dizer que tudo o que você disse é verdade. Sendo assim, qual é o seu plano?
— Eu vou me esgueirar até a fortaleza do inimigo.
— —O que?
— Eles estão todos reunidos em algum lugar dentro dos terrenos da Academia. Eles estão ocupando uma área ilegalmente, a qual eles provavelmente modificaram para que se tornasse sua fortaleza. Eu vou me esgueirar até lá e recuperar a Yaya.
Com Raishin causando uma confusão, os Kreuzritter teriam que adiar sua participação na Festa Noturna, sendo forçados a defenderem sua base. Com a redução do número de adversários no campo de batalha, Frey teria uma maior chance de sobreviver a esta noite.
Foi assim que ele planejou salvar tanto Yaya quanto a Frey.
Mais importante, no entanto, é que com esse método— eles poderiam usar a força do Sigmund!
— Você percebe que qualquer forma de ataque unilateral irá resultar em você tornando-se inimigo de todos na Academia, certo?
— Eu vou apenas recuperar a Yaya. Se ela estiver lá, minha teoria terá sido comprovada.
— E se ela não estiver? Eles poderiam fingir ignorância e sua teoria não teria mais nenhuma base para se sustentar.
— Se isso acontecer, o meu nome será apagado dos registros da Academia e estará tudo acabado.
Kimberly encarou Raishin com os olhos semicerrados, antes de suspirar.
— Eu disse que odeio idiotas, não disse? Digamos que, de acordo com seu argumento, você encontre a Yaya e possa provar a veracidade de suas declarações— como você pretende lutar contra os nove deles? Você já pensou nisso, Penúltimo?
— Eu sempre fui péssimo em Matemática. Eu não tenho ideia do que os números signifiquem.
Pffft, foi o som produzido por Kimberley quando ela subitamente cuspiu o chá.
Ela segurou as laterais de seu corpo enquanto ria.
Raishin, Charl e Henri olharam para ela com espanto. Eles sentiam que era a primeira vez que viam Kimberley se divertir tanto assim.
— Ah, eu entendi. Eu entendo. Faça o seu melhor e force o impossível a acontecer. Eu serei sua retaguarda.
— Estou te devendo essa.
— Você já está me devendo tantas coisas que eu sinceramente não vejo como você será capaz de me pagar em apenas uma vida.
Kimberley sorriu. Raishin engoliu em seco.
Era verdade. Ele sempre estava em dívida com outras pessoas. A mais óbvia delas era Kimberley, mas ele também estava em débito com a Frey e com a Charl.
No entanto, ele tinha que recuperar a Yaya a todo custo. Se ele não o fizesse, ele jamais seria capaz de derrotar o Tenzen— e ele também tinha uma grande dívida de gratidão com a própria Yaya.
De repete, algo o acertou abruptamente.
Parecia que ele tinha se esquecido de uma coisa muito importante.
Raishin levantou-se, dirigindo-se para a porta.
Charl tinha uma expressão séria quando olhou para ele.
— ... Você está indo?
— Apenas para o banheiro.
— O-O que você— você é idiota!? Quer morrer!?
— Calada! É uma reação biológica! O que você espera que eu faça se ficar com vontade no meio do caminho para a batalha!?
— A-a-apenas apresse-se e vá! Espero que ele fique preso na sua braguilha mais tarde!
— O que!? Se isso acontecer, vai haver uma tragédia sangrenta!
Charl lamentou-se sobre isso com os punhos cerrados, expulsando-o da sala. Raishin caminhou pelo corredor silencioso.
Lavando o rosto na pia, ele limpou o suor frio e esfriou um pouco a cabeça.
Ficar sozinho em um lugar silencioso, ele logo percebeu seu descuido.
A imagem da garota de cabelo prateado, Alice Bernstein, surgiu em sua mente.
Ela era a pessoa que se disfarçou de Cedric Granville da última vez... certo? Shin estava com ela e mesmo depois da mudança drástica na aparência, seu discurso e suas emoções eram os mesmos dos quais ele se lembrava.
Ela provavelmente era a estrategista.
Sem sujar suas próprias mãos, ela conseguiu fazer com que Charl tentasse assassinar o Diretor. E agora estava manipulando a Yaya a se afastar do Raishin. O intelecto dela era superior ao de Raishin, sem dúvidas. Se fosse esse o caso...
Ela já teria previsto o que Raishin estava prestes a fazer?
Na verdade— ela poderia estar esperando por isso?
Havia uma possibilidade! Esse foi um grande descuido!
Ele simplesmente não podia continuar assim.
Ele tinha que estar preparado para qualquer armadilha que o inimigo pudesse ter preparado com antecedência.
Qual era o objetivo final da Alice? Ao forçar Raishin a atacar sua fortaleza, o que ela estava esperando conseguir?
(——Não me diga...)
Raishin ficou assustado. No momento, ele pensava apenas como uma pequena presa para eles. Uma que logo estaria em suas mãos e seria um valioso prêmio...
Mas sua ganância era inacreditável! Eles não apenas roubaram a Yaya, mas também estavam almejando algo completamente diferente!
Dito isso, porém, ele não poderia desistir de tentar recuperar a Yaya. Esta batalha também tinha o objetivo de ajudar a Frey. Ele não tinha outra escolha a não ser prosseguir com isso.
(Droga... Tem alguma coisa que eu possa fazer...?)
Enquanto pensava profundamente, um rosto familiar surgiu em sua mente.
No passado, quando ele estava em seu dojo, o seu instrutor de esgrima, um velhote que gostava de jogar shogi, tinha dito isso a ele. Você não pode se mover de acordo com a forma com que o inimigo pensa que você vai se mover. Se, no entanto, você se encontrar em uma situação em que é forçado a adentrar a armadilha do inimigo— “Se este momento chegar, você deve fazer um movimento completamente estúpido e confundir o inimigo” .
Raishin começou a pensar. O que poderia ser um movimento completamente estúpido?
— Ei... Eu não posso estar falando sério sobre isso, posso... Bom, é verdade que não há nenhum outro movimento restando que possa ser considerado mais estúpido que esse.
Ele começou a rir. Este plano era tão ruim que o deixaria sem nenhuma chance de vitória.
Mas era precisamente por ser tão estúpido que ele poderia ser capaz... de ser mais esperto que ela.
Raishin ficou em silêncio, analisando seu plano terrivelmente ruim.
— ... Tudo bem. Eu devo ser capaz de pegá-los de surpresa com isso.
— Na verdade, não. Eu temo que tudo isso vá ser em vão.
Ouvindo a voz que subitamente surgiu atrás dele, Raishin instintivamente se virou.
Silenciosamente escondendo sua presença, havia alguém do lado de fora da janela.
Houve um brilho fosforescente no céu. Flutuando, lá estava um homem com óculos escuros— Shin.
No instante seguinte, Shin chutou a janela, voando para dentro.
Com uma força absurda, seu pé atingiu o torso de Raishin. Logo em seguida, ele girou em um semicírculo no ar. O chute manteve sua inércia, atirando Raishin para o lado de fora da janela.