Volume 2

Prólogo: O assassino em branco

— Raishin, você é tão incrível. Yaya está... Yaya já... Aaaahhhhh <3

Com uma voz feliz, todo o corpo da garota estava tremendo.

Esse corpo não o de um ser humano, mas sim, de um autômato de alta classe. Com a suave luz do sol que passava pelas árvores, ela estava de bom humor enquanto caminhava.

Esta era a Inglaterra e eles estavam na Academia Real de Maquinagem, Walpurgis. A Festa Noturna começaria no dia seguinte e todo o corpo discente havia sido tomado pelo clima gerado por ela. Inesperadamente, parte desse entusiasmo pode ter contagiado a garota.

Deixando isso de lado, havia um tom de irritação na voz de Raishin quando ele falou.

— Pare de fazer essa voz estranha, Yaya. As pessoas vão ter a ideia errada de novo. Especialmente sobre mim.

— Mas você é imbatível na Educação Física. Eu podia ver os olhares de inveja de todos durante a aula!

Yaya não tinha ouvido nada do que ele dissera. Havia um olhar extasiado em seus olhos enquanto ela girava pelo lugar.

— Yaya está tão feliz. Parece que todos estão, finalmente, reconhecendo o Raishin. Eles estão reconhecendo quão forte ele é, quão legal ele parece e como ele só é gentil com a Yaya.

— Suas fantasias estão escapando da realidade e, deixando de lado suas desilusões, eu acho que você está cometendo um erro aqui. Esta é uma escola para magos, então não há nada “legal” em ser bom em atividades físicas de qualquer natureza... De fato, eu posso ser, na verdade, o cara mais bárbaro e primitivo nesse campus. Eu estou tão cansado de assistir as aulas de composição dia após dia.

Ele esfregou as sobrancelhas com os polegares.

— Mesmo que seja um Sábado, eu tenho duas aulas de composição no período da tarde. Vamos apenas voltar rapidamente ao dormitório, para que eu possa pegar meus livros. Iremos almoçar no refeitório da escola e, então, seguiremos direto para o prédio escolar.

— OK <3

Yaya sorriu para ele em resposta. Entretanto, assim que eles entraram no quarto, seu sorriso desapareceu.

No meio do quarto, havia um misterioso objeto balançando.

Era uma rede. Parecia algo que se usaria para pescar, só que ela estava pendurada no teto.

Algo estava preso dentro dela. Algo branco e suave.

Depois de perceber que era a pele de alguém — coxas, para ser mais preciso — que podia ser vista ali, Raishin percebeu que estava olhando para uma “peça de roupa proibida”, por uns bons cinco segundos.

Havia uma solitária garota, vestida com o uniforme escolar, com as duas pernas erguidas em uma, perigosamente, pose erótica, suspensa dentro da rede. Seu cabelo estava preso do lado direito e era de uma cor pérola intensa. Um curioso cachecol longo, uma cinta-liga e um laço fofo davam a ela uma aparência que seria melhor descrita como bonitinha.

Esmagado debaixo de sua bunda, estava um animal que parecia o resultado do cruzamento entre um lobo e um cão com pelo negro, também preso na rede. Seus ombros tinham armaduras ligadas a ele, dando-lhe uma aparência de autômato.

Então... O que era isso?

Uma sinistra aura negra estava começando a se formar em torno de Yaya, muito parecida com um buraco negro.

— Que tipo de brincadeira é essa, Raishin? Trazendo uma garota para o seu quarto... e então suspendendo ela assim...!

— Não pule para conclusões estranhas! Eu estive com você o dia todo!

— Eu tirei meus olhos de você quando você estava no vestiário por 0.3 segundos!

— 0.3 segundos não é tempo suficiente para passar da linha! Espere, espiar vestiários é um crime grave!

A garota na rede pateticamente contorcia seu corpo, tentando apelar a eles para que a ajudassem.

Vendo tal coisa lamentável, Raishin soltou a rede, derrubando-a em cima da cama.

Assim que seus pés tocaram a cama, a garota moveu-se para sair da rede, mas, em vez disso, encontrou a si mesma ainda mais presa. Seus membros estavam presos, então ela saltava como um peixe fora d’água.

Seus movimentos lentos surpreenderam Raishin, então ele usou sua faca para cortar a rede, abrindo-a.

— Uu... Obrigada.

Tremendo como um rato, a garota ofereceu seu agradecimento.

Ela era bonita. Seus olhos vermelhos eram como rubis. Em contraste com o rosto fraco, eles passavam um sentimento intenso.

As protuberâncias gêmeas em seu peito pareciam desafiar a gravidade. Raishin encontrou-se corado, de forma não intencional.

— O que você estava fazendo no meu quarto? Dependendo da sua resposta, eu posso ter que chamar a segurança — woah!?

Talvez sentindo a hostilidade em sua voz, o cão-lobo de repente saltou sobre Raishin.

— Woof!

— Woah, que cão enorme! Você é um autômato? Por que você está no meu quarto?

— Woof! Woof!

— Pare de latir. Você parece com um cão, mas não significa que também tenha que agir como um.

A garota abraçou o cão, nervosamente o puxando para longe.

— Rabbi não pode falar... mas ele é... minha família.

— ... Eu retiro o que disse antes. Prazer em conhecê-lo, Rabbi. Eu sou Akabane Raishin.

Encontrando o olhar do cão-lobo, ele estendeu a mão direita.

O cão olhou para Raishin com olhos redondos—

Chomp!

— Aaaaaaiiiiii!

— Está sangrando, Raishin! Temos que parar o sangramento depressa!

— Não lamba isso, Yaya! O que você é, um cão?!

Durante a confusão, a garota havia, de algum modo, escapado.

O desaparecimento dela era inesperado. Para alguém que havia sido tão lenta antes, ela tinha pernas rápidas quando se tratava de fugir.

— ... O que diabos foi isso?

Raishin murmurou enquanto olhava ao redor do quarto.

Espalhados pelos lados estavam algumas molas, polias e elásticos.

— Parece que ela estava fazendo uma armadilha, mas então acabou caindo nela.

— Não pode ser... uma armadilha de mel!?

O rosto de Yaya empalideceu. No momento seguinte, o estrondo de um misterioso tremor pode ser sentido.

— ... Não, não importa como você olhe, não há nenhum mel espalhado por aqui.

— Aquela garota estava, obviamente, usando o truque “mostre a ele a sua calcinha”, para atrair o Raishin! Se você realmente gosta tanto assim de calcinhas, então, por favor, olhe apenas para a da Yaya e para a da Yaya apenas!

— Não levante o seu quimono! Tenha um pouco de vergonha!

Isso estava se transformando em uma situação um tanto quanto problemática. O olhar no rosto de Yaya também era bastante perigoso. Seria ótimo se eu nunca a visse de novo, Raishin pensou consigo mesmo.

Apenas um fato, ele se encontrou com ela novamente, e muito mais cedo do que ele imaginava.

Ele mal havia pisado fora do dormitório, e uma abertamente vigilante Yaya já estava olhando para uma área sombreada por árvores.

De dentro das sombras, um bonito cabelo cor de pérola e a cauda de um cão podiam ser vistos.

Raishin suspirou e chamou por eles.

— O que vocês querem?

A garota saiu, timidamente, de trás da árvore e, nervosamente, estendeu uma cesta.

— O que é isso?

— Eu queria me desculpar pelo incidente mais cedo, então... eu fiz um bentô.

O som de papel sendo amassado podia ser ouvido a medida em que Yaya apertava com força os livros em sua mão.

— Então, o relacionamento de vocês já chegou a esse nível... como eu pensava...!

— Isso, obviamente, é uma armadilha! Como alguém poderia ter preparado um pedido de desculpas antecipadamente!?

— Bem, eu sou... muito boa cozinhando, então...

— Sua habilidade na cozinha não tem nada a ver com isso. A menos que você esteja dizendo que pode atravessar o tempo e o espaço?

A garota abriu a cesta com os dedos trêmulos. Parece que ela não estava mentindo quando disse que era uma boa cozinheira. Sanduíches, que pareciam deliciosos, estavam ordenadamente embalados dentro dela.

— Não... Eu aprecio a sua oferta, mas nós já estávamos indo comer na cafeteria.

A garota começou a chorar. Não vendo outro meio para contornar a situação, Raishin pegou um sanduíche.

Levando-o até o nariz, ele o cheirou. Não parecia haver nenhum odor estranho.

Sentindo o olhar assassino de Yaya em suas costas, Raishin deu uma mordida.

— Geh! Bleah! O que diabos tem nisso!?

— Uu... supostamente era para ser sonífero, mas uma vez que eu não tinha nenhum, eu apenas coloquei um monte de sal.

— ...Sal?

— Ao desequilibrar o balanço entre as concentrações de sódio e potássio no corpo, isso pode causar a destruição das células do organismo...

— Colocar alguém em sono eterno é uma boa ideia, mas você não acha que, ao colocar sal, alguém vai notar antes de empurrar o sanduíche garganta a baixo?

Embora, se alguém comesse toda a cesta, provavelmente morreria.

— Sério, o que há dentro da cabeça de vocês... Não, esqueça isso. Eu não quero ser arrastado para mais fundo nisso. Vamos, Yaya.

Virando as costas para ela, ele começou a andar. Antes que desse outro passo, porém, seus sentidos o alertaram de que havia algo errado.

Bem na frente dele havia um pedaço de terra que, obviamente, tinha uma cor diferente do resto.

A garota atrás dele estava olhando para ele, na expectativa.

Raishin suspirou devido ao quão óbvio isso era e deu um passo na diagonal, para evitar o chão descolorido.

O som de tristeza ecoava atrás dele. A garota estava até mesmo fungando. Era extremamente insuportável. Raishin, deliberadamente, retirou o pé e pisou no solo descolorido.

A terra se abriu. Um jornal, que funcionava como a tampa da armadilha, caía lentamente, até atingir suavemente o fundo do pequeno buraco. Tinha cerca de trinta centímetros de profundidade.

— ... E o que, exatamente, é isso?

— Uma armadilha...

— Resposta errada. Eu não acho que você conseguiria pegar nem mesmo uma criança com isso.

— Mas se eu cavasse mais fundo, então eu não conseguiria sair depois...

— ... Bem, eu acho que um buraco dessa profundidade pode causar uma fratura. No fim, é uma armadilha bastante maliciosa.

As bochechas da garota tornaram-se carmesim, embora o que Raishin tenha dito não fosse, exatamente, um elogio.

— Um, nesse caso... que tal nós tomarmos um banho juntos?

O som de coisas sendo rasgadas ecoou em suas costas, enquanto Yaya os rasgava os livros em suas mãos.

Os olhos de Raishin estavam semicerrados.

— ... Um banho?

— Você caiu no buraco... então você deve estar sujo.

Animadamente abrindo um caminho pelo bosque, a garota fez sinal para que Raishin entrasse.

Dentro do bosque, havia uma banheira, que parecia completamente fora de lugar.

— Por que... essa coisa está aqui...

A garota tinha um pouco de orgulho na voz ao responder.

— Assim, você pode mergulhar na floresta...

— Não, essa piada não é nada engraçada, sabe?

Seu comportamento abertamente suspeito só fez com que Raishin ficasse ainda mais curioso. Sem se dar conta, Raishin foi chegando perto, até que estava perto o suficiente para se chocar com ela... Raishin se conteve e deu um passo para trás.

Ignorando a garota, que subitamente havia se afastado, ele espiou dentro da banheira.

— ... E o que é isso?

— Um banho de insetos...

A garota havia caído sentada e respondeu Raishin com uma voz que lembrava o zumbido de um mosquito.

— Se alguém cair em um banho de insetos, mesmo se for você, o espírito da pessoa será drenado pelos insetos nojentos...

— Sim, bem, eu posso ver minhocas e centopeias contorcendo-se lá dentro, mas tem só cinco no total?

— Depois de capturar cinco, eu senti que meu espírito já havia sido drenado...

Ela confessou um tanto quanto embaraçada. Parece que ela estava ciente da sua incapacidade de lidar com insetos.

— Um, nesse caso, que tal...

— Você ainda tem alguma coisa na manga?

— Uu... Agora eu estou séria. Por favor, venha até o meu quarto esta noite... Ok?

Esse era um convite estranho. Mas isso era uma verdadeira armadilha de mel em ação!

Yaya estava murmurando algo incompreensível com uma voz baixa, enquanto os livros desfiados em sua mão começaram a voar como confete.

Qualquer provocação a mais poderia ser perigosa. Raishin suspirou.

— Ei, já chega. O que você está tentando fazer? Eu já suportei suas brincadeiras por tempo o suficiente. Para sua informação, eu não tenho tempo para brincar com você o dia todo.

Essa era uma fala legal, mas uma vez que a razão pela sua falta de tempo livre eram as aulas de composição que ele tinha que assistir, a coisa toda acabou saindo um pouco chata.

Olhando fixamente para Raishin, enquanto seu corpo tremia, a garota declarou firmemente e com uma voz alta.

— Eu vou... assassinar você.



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