Volume 1 – Arco 1

Capítulo 1: Despertar

Ao som de pássaros chilreando, abro meus olhos; me encontro deitado. 

Ergo a minha mão direita para bloquear a luz do sol vinda do meio de uma grande fenda acima. 

Passados alguns segundos — após verificar o ambiente ao redor — concluo que me encontro no fundo de um penhasco. No entanto, ao mesmo tempo que um odor começa a pairar, percebo uma significante poça de líquido avermelhado ao redor do meu corpo.

— Isso é... sangue? — murmuro.

Agora de pé, verifico meu corpo e noto uma irregularidade.

— É muito pequeno.

Meu corpo não era o "refinado" com o qual estava acostumado, muito pelo contrário. O meu eu atual era uma criança. Além disso, o peito da minha camisa está completamente vermelho. 

"Esse cheiro…"

Um odor de metálico junto do mais puro vermelho: Era sangue. 

Mesmo tirando a minha camisa, não encontro uma única ferida. Confuso, balanço a cabeça algumas vezes antes de sentar em uma rocha próxima.

Um tempo depois, lembranças nebulosas começaram a clarear. Ainda estou longe do meu 100%, mas parece que o meu cérebro está funcionando bem o suficiente para começar a analisar a situação. 

Posso ao menos discernir que este corpo não é o meu, mas sim de alguma criança. E, com base na grande quantidade de sangue no seu corpo e na voz robótica feminina que havia dito algo sobre um ritual de reencarnação, cheguei à seguinte conclusão: 

Eu, Sagami Shirabe, fui reencarnado.

Digo "reencarnado'', levando em conta que eu tenha morrido antes — porém, não é como se eu lembrasse. — Enfim, com esta quantidade de sangue despejada, era provável que o dono anterior deste corpo já estivesse morto, e o fato de eu ter sido reencarnado justamente nele só serve para confirmar isso. 

Nesse caso, não tenho escolha a não ser seguir minha vida enquanto finjo ser essa criança.

Haa, vai ser complicado explicar o sangue...

As roupas da criança são velhas, mas o material de que são feitas é bastante decente e, a julgar pela sua aparência, ele provavelmente é de uma família de classe média. Todavia, estou mais horrorizado com esta aparência; tenho que fazer algo a respeito deste sangue.

Levantando-me da rocha, sigo descendo a trilha do penhasco e, sem tardar, me deparo com um rio.

Nice, isso deve servir.

Tirei minha camisa e lavei-a na água. Pensei em fazer o mesmo com minhas calças, mas logo me dei conta que a única coisa que ficaria ao redor de minha cintura seria um pedaço de pano — isso não é muito diferente de estar completamente nu. — Apesar de ser apenas uma criança atualmente, não é como se gostasse desse tipo de exibição.

As manchas de sangue quase desapareceram. Há algumas persistentes aqui e ali, mas não pareceria estranho vindo de uma criança que poderia consegui-las através de brincadeiras ou de frutas vermelhas.

Mesmo assim, meus problemas ainda não foram todos resolvidos: Tenho que descobrir a identidade do dono deste corpo.

A partir da sua figura, e do que posso ver refletido na superfície da água, ele parece ser um garoto loiro de sete ou oito anos de idade...

Eu realmente precisava ir a um vilarejo próximo e coletar algumas informações.

Depois de torcer a camisa, penduro-a em um galho de árvore. Em seguida, enquanto espero ela secar, começo a ponderar sobre o que sei até aqui: 

Primeiro, pelo que parece, realmente fui reencarnado em outro mundo chamado Ulterior. Então, isso deve significar que aqueles "Bônus" de antes devem estar em vigor também.

— É isso? — perguntei em voz alta.

No canto superior esquerdo da minha visão, as palavras Projeto de Magia se formam. Com a intenção de tocá-la, levanto a minha pequena mão e sinto algo semelhante a uma tela touchscreen.

Segundos depois, a tela começa a se alterar e algumas informações são visíveis.

「BônusPoderes Sobrenaturais que se Acumulam com Outras Habilidades.

「Projeto de Magia: Permite Criar Vários Grimórios a partir de Certos Materiais.

Não entendo muito bem o que isso quer dizer, mas pelo que parece posso criar livros mágicos usando certos materiais. Espera, se eu puder obter um, significa que também poderei obter magia? 

Bem, mais tarde me aprofundo nesse assunto. 

Já em relação aos outros três...

「Examinar o Ambiente: Analise Tudo em uma Distância de 3 Quilômetros.

「Inventário: Armazenagem Infinita. O Tempo Para em seu Interior.

「Teletransporte: Ao Visitar um Lugar, ele será Registrado, assim, poderá se Teleportar de Volta Independentemente da Distância.

Com isso, penso em usar o Examinar o Ambiente; um simples mapa do meu entorno surgiu. 

Nele havia alguns pontinhos vermelhos marcados — provavelmente seres vivos. — Toquei no mais próximo da minha localização atual e, em seguida, uma outra tela surgiu reproduzindo uma gravação de forma não muito diferente da mostrada por uma câmera de vídeo.

Nela, fluidos transparentes azuis esquisitos saltitavam sem rumo.

Oh, Slimes...

Vendo-as mais de perto, as geleias pareciam bastantes expressivas...

Não demorou muito para que eu voltasse para o mapa de antes. E assim concluir que, como o bônus de análise, parece que só posso usar o recurso de câmera de vídeo dentro de um raio de 3 quilômetros também.

Felizmente, localizei um vilarejo um pouco ao norte do penhasco em que acordei: Daqui a pouco vou ver se consigo reunir informações lá.

A seguir, a próxima habilidade...

—  Inventário!

Em resposta ao meu grito, de repente, um espaço em branco se forma diante dos meus olhos. Como teste, pego uma pedra e ordeno: — Armazenar. 

「Pequena Pedra: Pedra Vinda do Leito do Rio.

Ao mesmo instante que a pedra brilhou e desvaneceu da minha mão, tal tela foi exibida. 

Aquele bônus realmente me lembra o recurso usado nos jogos. Bem, pelo menos será extremamente útil daqui para frente.

Ao terminar de testar minhas habilidades, o que me restava agora era descansar um pouco e esperar até que minhas roupas secassem.

◇◆◇◆◇

O sol tinha começado a se pôr, eu havia cochilado por praticamente duas horas. 

Se não fosse a noite chegando, gostaria de me preparar para explorar a floresta o máximo possível. No entanto, posso deixar isso para a próxima.

Levantei-me, peguei minha camisa seca e a vesti.

Quando invoquei o mapa com Examinar o Ambiente, um vilarejo logo foi visto. 

Com o Teletransporte eu poderia chegar à vila em apenas um passo — entretanto, tal bônus podia ser algo raro nesse mundo, portanto, ser visto por alguém não era uma opção — e, se chegasse a isso, eu poderia não ser capaz de coletar informações.

Enfim, por agora vou apenas me teletransportar para cima do penhasco e andar o resto do caminho até o vilarejo.

Quando toquei num local do mapa, um ponto vermelho foi marcado e, ao pensar em me mover para lá, um círculo mágico surgiu no chão com uma miríade de padrões geométricos vermelhos cintilando para dentro e para fora. 

Logo, o seu brilho começou a revestir meu corpo — o meu campo de visão deformou-se. — Me vi de pé em cima do penhasco.

Heh. Isso é bem útil.

Ao verificar o mapa novamente, vejo que vários pontos vermelhos se aproximavam. E, clicando em um deles, vi o que parecia ser moradores segurando tochas — eles gritavam, parecendo estar procurando por algo. — Suas roupas visualmente eram  mais escuras e simples do que as minhas, o que deve significar que o dono deste corpo veio de uma família bastante rica.

Em todo caso, neste momento sou apenas uma criança de sete ou oito anos de idade. E, do mesmo jeito que posso parecer indefeso, também não pareço alguém capaz de empunhar uma arma, portanto, talvez seja prudente procurar alguém.

Comecei a caminhar em direção aos aldeões.

◇◆◇◆◇

— Lá está ele! 

Um homem barbudo que, provavelmente, tinha a mesma idade que o meu eu da vida passada, gritou enquanto levantava sua tocha bem alto.

Imediatamente, fui cercado por diversas figuras.

Vendo que não estavam apontando as suas armas para mim, a minha aposta provavelmente valeu a pena.

Uma jovem garota abriu caminho através da multidão — seu cabelo longo cabelo loiro tremulava ao vento. — Ela me abraçou e soltou um suspiro aliviado.

— Graças a Deus, Grey!

Ao fundo, um par de vozes chorosas eram ouvidas. 

Neste tipo de situações, só havia uma coisa que uma criança poderia dizer.

— Desculpa. — Soltei cuidadosamente a palavra que há muito tempo deixei para trás.



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