Volume 3
Capítulo 3: O Coração Traiçoeiro
Isso foi durante a primeira vez.
Ela passou muito tempo se preocupando em se arrumar e ambas acabaram perdendo o trem.
“Ack.”
Elas observaram enquanto a ponta do trem partia. Seus ombros afundaram, sabendo que era sua culpa elas terem perdido o trem, embora tivessem comprado as passagens.
“M-me desculpe…”
“Ah, tudo bem. Não se preocupe com isso.”
Enquanto elas observavam o rastro de Luz Etérea desvanecendo dos trilhos, a outra garota deu de ombros, deixando alegremente sua falha passar. Akari baixou a cabeça em resposta.
Não havia mais trens indo para seu destino até a manhã seguinte. Portanto, neste dia em que elas foram convocadas, elas arranjaram um quarto de hotel na capital do Reino de Grisarika.
Atormentada pela culpa, Akari seguiu a outra garota, que continuava tentando conversar com ela e animá-la, mas Akari só conseguia murmurar vagamente e usar um sorriso forçado.
Este foi o primeiro passo da primeira jornada delas juntas.
Na época, Akari não tinha como saber que o atraso de um dia lhes permitia evitar um grande incidente.
Ela apenas esperava poder compensá-la no futuro.
Enquanto se esparramava na cama e olhava discretamente para a garota ao lado dela… ela desejava poder agradecê-la devidamente por cuidar dela.
Esse era o tipo de pessoa que ela queria ser.
*
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Regressão: Memórias, Alma, Espírito]
Era a manhã do segundo dia delas no oásis.
Enquanto a luz do sol entrava no quarto delas na pousada, Akari balançou a cabeça para quebrar seu torpor.
Menou não estava lá. Ela e Sahara haviam saído cedo pela manhã, dizendo que tinham deveres de sacerdotisa para cumprir. Ela insistiu que era muito perigoso, conseguindo convencer Akari a ficar para trás.
Agora, deixada sozinha no quarto alugado, Akari bocejou de uma maneira muito deselegante.
“Algo está definitivamente errado…” Ela murmurou.
Akari Tokitou era uma viajante do tempo.
Como portadora do Puro Conceito de Tempo, ela tinha a habilidade de Regredir o tempo para o mundo inteiro. Utilizando essa habilidade que ela adquiriu quando foi evocada para este mundo, Akari já havia repetido sua jornada com Menou várias vezes.
Para que Menou pudesse matá-la.
Akari estava voltando no tempo para procurar uma maneira de Menou poder sobreviver, mas sempre falhava.
Geralmente, Akari mantinha suas memórias trancadas para não levantar suspeitas, mas havia certas condições que a permitiam destravá-las, o que a deixava checar a situação atual e, ocasionalmente, guiar as ações de Menou.
Era precisamente porque ela tinha a vantagem de saber o futuro que Akari poderia dizer exatamente o que parecia errado com essa situação agora.
“Nada parecido com isso aconteceu antes…”
Os eventos aqui no deserto, a Fronteira Selvagem no centro do continente, eram completamente diferentes de como Akari se lembrava.
Akari nunca havia sido sequestrada por criminosos aqui antes. Normalmente, suas viagens pelo deserto transcorriam sem problemas. Desta vez, as coisas saíram do controle tão rapidamente que Menou e Akari agora estavam separadas.
Acima de tudo, Akari não tinha nenhuma lembrança de uma garota chamada Sahara. Elas nunca haviam se encontrado antes.
“Eu não detesto a Sahara, mas…”
Um encontro ao acaso com uma garota desconhecida a fez pensar no monstruoso encontro que elas também tiveram em Libelle… com Manon Libelle.
Uma garota, cuja mãe era uma Ádvena, que começou a tomar ações violentas, alimentada por seu sentimento de deslocamento neste mundo. Ela causou uma enorme tragédia que envolveu inúmeros inocentes sem hesitação alguma.
Aquele que a tentou a pecar não foi outro senão o aterrorizante Puro Conceito de Maldade—um espectro macabro que usava o disfarce de uma garotinha e o tirava à vontade, vestindo sua própria pele rejeitada para esconder o monstro dentro dela.
“Me pergunto se ela tem algo a ver com isso…”
A fonte de todos os Conceitos de Pecado Original, um dos Quatro Principais Erros Humanos.
Akari estremeceu ao imaginar a garotinha angelical. Ela incorporava o fim repulsivo, porém lamentável, que aguardava um Ádvena.
Algo que a menina disse ecoou no fundo da mente de Akari.
“Existe. Um caminho para casa.”
Enquanto Akari continuava voltando no tempo e se agarrando a este mundo, a menina deu-lhe um sorriso inocente e disse que ela poderia, de fato, voltar para casa. Akari afastou a memória que tentava alojar-se em sua mente.
“Eu nunca vou voltar.”
Não importava se ela esgotasse todas as suas memórias e se esquecesse completamente do Japão.
Quando ela viu o vaso de flores colocado em uma carteira que ninguém mais sentava, ela se lembrou de pensar, Que piada de mau gosto. Aquilo a fez ficar excessivamente zangada.
Um dia, aquela aluna de repente parou de vir às aulas. Quem era que costumava sentar ali?
Akari já havia esquecido. Poderia até ter sido uma amiga dela. Na verdade, isso era quase certo. Do contrário, não havia razão para ela ter ficado tão irritada quando viu o vaso.
Mas que tipo de pessoa era sua amiga que se sentava ali?
Isso já havia sido consumido pelo Tempo.
“Eu sou horrível, não sou?” ela murmurou para si mesma enquanto refletia sobre a memória perdida.
O fato dela não se importar em se esquecer daquela pessoa parecia cruel até para ela.
“Mas eu tenho a Menou.”
E ela não precisava de mais nada.
Agora que ela havia confirmado isso, Akari voltou seus pensamentos para a situação atual.
Independente se Pandæmônio estava diretamente envolvida nisso ou não, o fato de que ela escapou do nevoeiro significava que o fluxo temporal havia mudado fundamentalmente de qualquer linha do tempo existente.
As fraturas formadas neste mundo pelo uso frequente da Regressão de Akari distorceu o nevoeiro o suficiente para libertar Pandæmônio. Em outras palavras, seus próprios esforços para salvar Menou estavam desfazendo o futuro que Akari conhecia.
Seja como for, ela apenas lidou com essas situações à medida que elas surgiram. O único objetivo de Akari era ser morta por Menou; contanto que isso acontecesse, os meios não importavam.
“Se elas estão indo para aquela base de ontem, posso alcançá-las se eu quiser.”
Akari podia teleportar. Havia algumas restrições, mas na maioria dos casos, ela podia transferir instantaneamente pessoas ou objetos. Se Menou estivesse em perigo, Akari poderia arranjar uma desculpa para vir correndo para o lado dela. Ela poderia até fingir ter sido sequestrada novamente se fosse preciso.
Naquele momento, houve uma batida na porta.
“Siiim?”
Akari abriu a porta sem realmente verificar, assumindo que era um funcionário que veio arrumar a cama. Eram hábitos como esse que faziam Menou repreendê-la por ser imprudente, mas Akari não se achava assim. Ambos os lados dela eram a verdadeira Akari, seja ela mesma habitual ou aquela que tinha memórias de todos os loops temporais anteriores. Sua personalidade básica era a mesma. Quando suas memórias eram destravadas, sua mente era capaz de se integrar suavemente.
Ela abriu a porta para encontrar uma garota.
“Olá. Estou certa em assumir que você é a Srta. Akari Tokitou?”
“Er…”
Uma mocinha definitivamente adorável assentiu em saudação a Akari, que estava perplexa na porta, com seu cabelo desarrumado espetando para cima desenfreadamente sem a sua tiara. A garota japonesa teve que direcionar seu olhar ligeiramente para baixo para fazer contato visual com ela. A própria Akari não era particularmente alta, mas sua visita era ainda menor.
“Hm, sim, eu sou Akari…”
“Prazer em conhecê-la, Srta. Akari. Fui encarregada de protegê-la enquanto minha querida está ausente.”
Uma protetora. Os olhos de Akari brilharam. Ela nunca esperou que essa garota aparecesse de repente diante dela.
Isso também nunca aconteceu antes.
“Sou subordinada de Menou, a sacerdotisa que tem guiado você todo esse tempo.”
“Subordinada de Menou…”
Akari sabia disso, é claro.
Observando melhor, a roupa de sua visita era da mesma variedade da que Menou sempre usava. A bainha da saia era ousadamente curta e modificada com babados adoráveis, mas ainda era uma túnica de sacerdotisa.
“Isso é um traje branco de sacerdotisa?”
Akari ficou tão surpresa com este novo desenvolvimento que se viu fazendo uma pergunta inútil.
“Sim. Ao contrário da minha querida, ainda estou em treinamento. Sou uma mera sacerdotisa novata que serve como uma assistente.”
A garota no traje parecia perfeitamente serena; ela colocou uma mão com luva branca em seu peito e juntou as pernas cobertas com meia-calça ordenadamente.
“Meu nome é Momo. Espero nos darmos bem.”
Suas tranças rosas balançavam enquanto Momo sorria alegremente.
*
“Quando se está formando múltiplos relacionamentos, acho importante considerar os relacionamentos entre essas outras pessoas também.”
O sol da manhã ainda não havia começado a brilhar com força total. Enquanto elas caminhavam rapidamente pela areia fina do deserto, Sahara começou a explicar uma teoria inexplicável para Menou.
“Você não pode dar tratamento especial a nenhuma pessoa. Não, acho que não é bem isso. Você tem que fazer todas acharem que são especiais. É importante continuar dando isca para um peixe que você já fisgou. Basicamente, você tem que ser atenciosa.”
“Do que está falando?”
“Só compartilhando uma dica útil.”
O comentário frio de Menou parecia deslocado contra o ar quente e seco, mas Sahara olhou para ela como se fosse óbvio.
“Bem, nada disso é útil para mim, pelo menos. Se importaria de mudar de assunto?”
“Tem certeza disso…? Quando se tem um monstro furioso e violento como Momo ao seu lado, acho importante saber essas coisas. Ela definitivamente vai começar a tomar medidas sozinha se deixá-la por conta própria por muito tempo.”
“Escute. Ela certamente pode ser um pouco emotiva às vezes, mas Momo é uma excelente ajudante e uma garota muito amável.”
“Acho que ninguém mais diria isso sobre ela.”
Menou e Sahara caminharam pelo deserto durante toda a manhã.
Elas deixaram o oásis ao amanhecer e agora já passava do meio-dia. Menou usava um manto com capuz sobre sua roupa de sacerdotisa para bloquear o sol e um pano em volta do pescoço e da boca para se proteger da areia. Sahara estava vestida com uma combinação semelhante, embora usasse uma roupa de freira em vez de sacerdotisa.
Ashuna e seus cavaleiros estavam viajando separadamente. Eles atacariam pela frente, enquanto Menou e Sahara se infiltrariam na base pela retaguarda. O plano era chegar perto da base da Corrente de Ferro antes do pôr do sol e atacar assim que a noite caísse. Por conta de Akari ter sido sequestrada, elas sabiam a localização da base inimiga. Como Menou já havia se infiltrado uma vez, ela também tinha uma boa noção do ambiente interno.
“Sahara, está tudo bem com esse seu braço direito? Você disse que o Receptáculo se atrelou a ele…”
“Estou ótima. Não está corroendo meu espírito de forma alguma e também posso usá-lo livremente.”
Elas estavam conversando para matar o tempo durante sua jornada. Enquanto se atualizavam sobre a vida uma da outra, Menou sentiu uma leve reação de Força Etérea.
Havia algo escondido na areia. A julgar pelo resíduo, não era uma coisa viva. Um soldado conjurado, talvez. E também era do tipo usado para espionagem. Curiosamente, tinha uma conjuração de comunicação imbuída, dando-lhe a capacidade de enviar informações por longas distâncias. Soldados conjurados eram denominados objetos tabu e também não podiam ser produzidos com a tecnologia de conjuração atual. Isso deve ser mais contrabando enviado por Genom Cthulha da Fronteira Selvagem do leste.
“O que foi?” Sahara deu a Menou um olhar confuso quando de repente ela ficou em silêncio.
“Nada. Só entrou um pouco de areia no meu olho. Vou tirar.”
“Entendo… Tem certeza? Talvez seja melhor não mexer.”
Pegando o sentido oculto, Sahara respondeu de acordo.
O soldado conjurado obviamente alertaria seu dono se fosse encontrado, mas também transmitiria sua localização caso destruído. A melhor abordagem seria ficar totalmente escondido dele, mas se ele as encontrassem, elas perderiam o elemento surpresa. Enquanto fosse menos desastroso se Ashuna e seus cavaleiros fossem descobertos, já que eles estavam atacando de frente, era crucial que as ações de Menou e Sahara permanecessem em segredo.
“Não se preocupe. Podemos fazer algo a respeito.”
“Beleza.” Sahara saltou para frente. A luz fosforescente de Aprimoramento Etéreo a rodeou. Ela se moveu rapidamente em direção ao inimigo sem ser atrasada pela areia. Seu braço direito artificial brilhava intensamente com Luz Etérea.
Força Etérea: Fundir Materiais—Braço Protético, Conjuração de Selo Interno—Ativar [Habilidade: Canhão Etéreo]
A Luz Etérea disparou de seu braço, espalhando areia por toda parte.
Um soldado conjurado em forma de cobra apareceu. Tinha cerca do mesmo comprimento de um braço humano, contorcendo-se na areia.
Menou estava mais focada na habilidade de Sahara do que no soldado que havia sido exposto por ela. Era muito estranho—não apenas uma simples conjuração de brasão. Seu braço protético era definitivamente o meio de invocação, mas mesmo Menou não conseguia descobrir quais componentes ele usava. Pelo que ela podia ver, o braço não parecia ter perdido nenhum material.
Menou se moveu mesmo enquanto analisava a conjuração de Sahara.
Agarrando o soldado conjurado no ar, ela o preencheu com Força Etérea antes que pudesse contactar a base.
Força Etérea: Conectar—Pedra Verde Primário, Cobra Informante—Infiltrar Exterior—Alterar Conjuração—
A Força Etérea dentro da cobra ergueu-se para resistir. Tudo que Menou estava fazendo era alterar o conteúdo da transmissão que a cobra estava tentando enviar. Isso exigia um toque delicado, não força bruta.
Comando [Nada a relatar.]
A ordem foi passada.
“Pronto. Agora não será um problema.”
“Nossa. Você ainda tem a manha.”
Menou atirou o soldado conjurado. Ele se entocou de volta na areia e retomou sua firme vigilância.
Ela teve êxito em reescrever o relatório. Agora a localização delas não seria descoberta. Menou e Sahara continuaram sua jornada.
*
Momo caminhava pelo Oásis de Balar com Akari a seguindo.
Elas checaram as barracas na, relativamente segura, rua principal que circundava a área e fizeram uma excursão pelas ruínas que restavam. Como elas eram jovens moças viajando sozinhas, estavam se esforçando ao máximo para parecerem turistas comuns.
Mas o par estava andando um pouco mais distante do que o necessário.
“Me foi dito que a senhorita adora passeios. Este não foi do seu agrado?” Momo perguntou educadamente.
“Eu gosto de passear, mas…” Akari pausou.
Pelas aparências, Momo estava sorrindo alegremente para a resposta hesitante de Akari, mas por dentro, ela estava irritada ao máximo.
Ela fez contato direto com Akari por conta própria—sem receber a permissão de Menou—com um propósito muito específico. Mas mesmo após várias horas juntas, ela não conseguiu se aproximar de Akari.
Pela maneira que ela interagia com Menou, Momo havia assumido que Akari fosse rápida em baixar a guarda com outras pessoas, mas ela era inesperadamente distante.
“Só estou me perguntando por que você está aqui, Momo…? Achava que Menou deveria me proteger.”
“Em circunstâncias normais. Mas é difícil, até mesmo para ela, supervisionar a senhorita o tempo todo, entende? Haverá ocasiões onde ela terá que sair do seu lado, então pensamos que seria melhor eu assumir temporariamente.”
“Menou não me disse nada sobre isso…”
“Bem, aconteceu muito repentinamente.”
Fazia sentido que Akari desconfiasse de Momo, uma vez que ela surgiu do nada. Mas não havia tempo para essa bobagem. Menou estaria na base do deserto, longe de Akari, por menos de um dia. Momo queria ganhar o máximo da confiança de Akari possível nesse período, mas seus esforços seriam em vão se Menou descobrisse que Momo havia feito contato com Akari.
“…Ah, me desculpe. Peço sua licença por um momento.” Momo pediu licença para abrir sua escritura. Ela não estava invocando uma conjuração, mas colocou Força Etérea no livro de qualquer forma, fazendo-o brilhar. Ela estava fingindo uma notificação de transmissão. “Srta. Akari. Acabei de receber uma mensagem da minha querida. É uma emergência.”
“Uma mensagem?”
“Sim. Nós conseguimos nos comunicar com nossas escrituras durante emergências. Ah… N-não pode ser…!” A tensão em sua voz soava forçada. “Ela foi atacada pelo inimigo. Ela irá se esconder sozinha por um tempo, então nos ordenou ir na frente para a próxima cidade.”
“Hã?” Akari parecia confusa.
“Parece que a missão dela também colocou um alvo nas suas costas, Srta. Akari. A localização da pousada foi descoberta. A querida quer que nós deixemos a cidade imediatamente.”
“Mas…”
O rosto de Akari estava coberto de hesitação. Compreensivelmente. Apesar de Momo ter se apresentado como subordinada de Menou, este ainda era o primeiro encontro das duas. Era natural que ela ficasse relutante em se separar de Menou.
Mas Momo não a deixou dizer nada disso.
“Vamos voltar para a pousada e recolher nossas coisas. Depois, podemos esperar até o último minuto possível, e se eu determinar que a situação se tornou muito perigosa, escaparemos juntas. Tudo bem assim?”
Ela fez uma proposta rápida para tirar vantagem da confusão de Akari. Parecia um acordo à primeira vista, mas não seguia as vontades de Akari de forma alguma. Tudo que Momo havia acabado de dizer era uma invenção. Na verdade, ela nem tinha permissão de Menou para entrar em contato com Akari.
Isso tudo fazia parte do seu plano para afastar Akari de Menou. Desde o incidente em Libelle, Momo estava esperando por uma chance para separá-las.
Por mais que ela odiasse admitir, Menou já estava interagindo com Akari quase que totalmente como seu eu verdadeiro. Sinceramente, havia pouquíssima diferença entre a Menou que Momo conhecia e a Menou que Akari via. Sua atuação estava rapidamente deixando de ser uma atuação.
E agora, por conta do incidente de sequestro, Menou havia finalmente tirado seus olhos de Akari por um estendido período de tempo.
Esta era a chance de Momo.
Se Momo pudesse levar Akari para além do deserto da Fronteira Selvagem central, não faltaria muito até a Espada de Sal. Elas poderiam pegar um trem para a terra santa, obter permissão lá e viajar para a terra salgada no extremo oeste do continente. Momo não tinha intenção de perder essa oportunidade para potencialmente poupar Menou de um desnecessário conflito interior.
A expressão de Akari abrigava apreensão, relutância e até mesmo rejeição. Sem dúvida ela não queria deixar esta cidade—ou mais especificamente, o lado de Menou. Ao mesmo tempo, ela teoricamente entendia que era pelo melhor.
“M-Momo… Se Menou está em apuros, temos que ir salvá-la!”
“Não devemos. A querida disse que precisa se esconder. Isso será mais fácil se ela estiver sozinha. Do contrário, se tentarmos entrar em contato com ela, podemos acabar causando-lhe problemas.”
Akari engoliu em seco e ficou em silêncio.
Estava funcionando. Momo podia ver pela reação de Akari. Ela iria conseguir, mesmo se tivesse que enganá-la um pouco. Momo abriu a boca para continuar convencendo-a, mas Akari falou primeiro.
“Tudo bem…”
“Então a senhorita entende?”
“…Uhum.” Akari pressionou seu dedo indicador na testa de Momo.
Enquanto Momo arfou, surpresa, o dedo de Akari brilhou com Luz Etérea.
“Entendo que você está sendo uma completa peste.”
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Suspensão]
A Luz Etérea brilhou.
*
“Isso está correndo bem até agora.”
“Uhum. Neste ritmo, devemos chegar à base na hora certa.”
Menou e Sahara estavam fazendo seu caminho pelo deserto totalmente de acordo com o plano, tendo incapacitado mais alguns soldados conjurados durante o percurso.
“Tem certeza de que deixar Akari no oásis foi uma boa ideia?”
“É claro. Ela tem uma excelente protetora, então estará segura.”
Mesmo que um grupo da Corrente de Ferro permanecesse no oásis e tentasse atacar Akari enquanto Menou estivesse ausente, não havia nada com o que se preocupar. Momo protegeria Akari pelas sombras.
Sahara fez uma careta para a resposta de Menou. Ela parecia uma criança que havia acabado de ser presenteada com um prato cheio de vegetais amargos.
“…Por ‘protetora’, você se refere a Momo, certo?”
“Quem mais?”
“Bom, se você quer confiar isso à Momo, acho que por mim tudo bem.”
Pela sua expressão, claramente não estava tudo bem por ela. Sahara, que estava alegremente provocando Menou sem parar desde que se reuniram, virou-se com um humph infantil.
“Não sei como você consegue ficar tão calma após deixar Momo responsável por proteger alguém. Por acaso ela é capaz de algo que não envolva destruição?”
“Vai ficar tudo bem. Ela é muito habilidosa, você sabe. Eu posso contar com minha querida assistente para qualquer coisa.”
“Nossa. Estou impressionada que consiga dizer isso com uma cara séria.”
Claramente, Sahara tinha uma aversão muito forte a Momo. Embora tentasse manter uma expressão neutra, ela não conseguia esconder completamente sua irritação. Enquanto Menou olhava para o rosto de Sahara de perfil, ela lembrou-se de algo.
“Sahara, eu sei que você sempre tentava mexer com a Momo e era espancada por causa disso, então posso entender por que a detesta, mas… você tem consciência de que aquilo foi consequência de seus próprios atos, não tem?”
“…Foi tudo culpa dela por ser um monstro violento com a menor quantidade de fé da história.”
Isso parecia uma memória amarga até para Sahara, que normalmente era plácida.
“Bem, é verdade que a fé de Momo no Senhor é virtualmente inexistente, mas… isso também significa que suas outras notas foram excepcionais o suficiente para ser capaz de se tornar uma sacerdotisa assistente ainda bem jovem.”
“Como se eu desse a mínima. Aliás, é um desperdício não ter interesse em uma existência tão intrigante quanto o Senhor da igreja.”
Claramente relutante em reconhecer as habilidades de Momo, Sahara mudou de assunto para outro bastante blasfemo.
“Intrigante…? Você deveria falar com mais respeito.”
“Hã, quem liga?” Sahara deu de ombros e mergulhou em sua própria teoria. “As escrituras—pelo menos, aquelas que as sacerdotisas da Faust carregam—descrevem muito claramente o Senhor como algo diferente do que você chamaria de Deus. Não um salvador que resgatou a humanidade do juízo final, nem algum ser onipotente e onisciente. O Senhor mais parece alguma espécie de Conceito que tem poder e sabedoria.”
Ela inclinou a cabeça para Menou, ignorando sua advertência. “O que você acha que o Senhor realmente é, afinal?”
“A mais alta gestão da terra santa. O órgão decisório da Faust… pelo menos, é o que eu acho.”
“Então, basicamente, as Anciãs?”
“Exatamente.”
As Anciãs era uma organização misteriosa apenas sussurrada em rumores, sem nenhum registro oficial de sua existência.
Igrejas e paróquias existiam em toda nação sob a mesma estrutura geral. A líder de uma igreja era uma pastora, a líder de uma paróquia era uma bispa, e a líder da nação era a arcebispa. Não havia posição oficial acima de arcebispa.
Realisticamente, no entanto, era altamente improvável que não houvesse um órgão decisório na terra santa que gerenciasse todas essas nações. Havia apenas uma arcebispa por nação e não existia posto acima delas. Rumores de um corpo administrativo haveriam de surgir.
“Bom, eu acho que o Senhor e as Anciãs são duas coisas diferentes.”
“Oh?” Menou perguntou.
“E acho que somos mais inúteis contra ele do que imaginamos.”
Suas palavras fizeram Menou lembrar de algo que sua Mestra disse uma vez.
“Enfim. Só acho que você deveria ter um pouco mais de ciência do quão perigosa Momo pode ser.” Sahara manteve sua voz curta, mas afiada. “Sabendo o quão selvagem ela é, ela pode até atacar Akari.”
Difamação infundada. Agora ela só está sendo rude, Menou pensou, dando de ombros com desdém.
*
A luz do dedo de Akari cruzou o céu.
“O q—?”
Uma voz confusa chegou aos ouvidos de Momo. Akari estava franzindo em desapontamento enquanto observava Momo continuar se movendo em seu próprio tempo.
“Errei.”
“…O que estava tentando fazer?”
A voz de Momo estava afiada e seu rosto rígido. Isso foi um desenvolvimento inesperado. Akari atacá-la definitivamente não fazia parte do plano.
Akari sorriu. Era uma expressão muito diferente do rosto inocente e distraído que ela geralmente usava.
“Sou eu quem deveria perguntar isso. Não acha, Momo? Você veio tentar me separar da Menou, não é? E sem nem receber a permissão dela também.”
“…E daí se for o caso?”
Não fazia mais sentido tentar mentir agora. Akari claramente via Momo como uma inimiga.
Com os olhos fixos em Momo, o sorriso de Akari alargou. “Imaginei. O que significa que…”
Ela mirou em Momo com seu dedo indicador; seu polegar estava erguido, seus outros dedos fechados, criando o formato de uma arma.
“Se me livrar de você agora, Menou não terá nenhuma razão para suspeitar de mim.”
Sua voz era fria o suficiente para causar calafrios na espinha de qualquer um; arrepios percorreram a pele de Momo. O fato de alguém que ela nunca conheceu antes estar falando com ela com uma atitude tão familiar era profundamente perturbador.
Akari sorriu para ela quase que maleficamente, mas Momo sorriu ferozmente em resposta.
“Entendo…”
Havia apenas uma teoria que poderia explicar a súbita mudança na atitude de Akari.
“Então você tem memórias de antes de usar a Regressão.”
Regressão. Menou havia dito a Momo sobre sua teoria de que Akari poderia estar criando um loop temporal.
“Estou impressionada que tenha conseguido nos enganar por tanto tempo, dona peituda.”
“Se importaria de não me dar um apelido tão rude? Não há nada pior do que tirar sarro das pessoas por seus traços físicos, na minha opinião.”
“Oh? Tem lembranças ruins associadas a isso? Ah, claro, sinto muuuito. Quando se usa uma sórdida entidade tabu, você perde suas memórias, não ééé? Não é de se estranhar que tenha uma personalidade tão acéfala, hmm?”
A pronúncia sarcástica de Momo apenas intensificava o brilho maléfico nos olhos de Akari. As duas garotas se encararam, com seus olhos disparando adagas.
“Mas você também não estava fingindo esse tempo todo, estava? Duvido que você fosse capaz de enganar minha querida tão minuciosamente se fosse o caso. Sua atitude mudou tão de repente… Você sela suas memórias com a Regressão e as mantém escondidas?”
Akari Tokitou estava viajando de volta no tempo. Essa foi a conclusão que Menou e Momo haviam chegado quando combinaram suas informações. Elas haviam assumido que as memórias de Akari eram revertidas para o momento que ela era evocada quando voltava no tempo, mas evidentemente, elas estavam erradas nessa parte.
Quando estava com Menou, ela normalmente mantinha suas memórias Regredidas até um ponto onde ela não tinha conhecimento do futuro—mas por que ela faria algo assim?
Era fácil adivinhar.
Se houvesse uma usuária de Puro Conceito que soubesse o futuro e pudesse voltar no tempo, Menou certamente não viajaria com ela. Trabalhar junto com alguém que sabe o futuro significa que esta pessoa saberia o que aconteceria a seguir, o que não seria um problema se fosse alguém de confiança. Mas uma estranha com tal habilidade não era. Menou ficaria desconfiada.
Portanto, Akari apagava suas próprias memórias para impedir que Menou suspeitasse de qualquer coisa.
“E qual é o seu objetivo ao se agarrar a minha querida, raposa?”
“É por isso que odeio quando as pessoas descobrem que tenho minhas memórias… Vocês acreditam nessa parte, mas nunca consigo lhes fazer confiar em mim sobre mais nada.”
“Se importa de explicar isso de um modo que faça sentido?”
Enquanto Momo lhe dava um olhar penetrante, Akari fez careta e deu a língua.
“Nem pensar! Você não acreditaria em mim mesmo, então não!”
Foi uma recusa total em tentar chegar a um entendimento. Toda a expressão esvaiu do rosto de Momo, e ela olhou para Akari terminantemente.
Ela nunca gostou de Akari, para começar. Nada era mais importante para Momo do que Menou, e ela priorizava a segurança de Menou acima de tudo, mesmo que isso significasse a morte de algum estranho ou até a destruição de metade do mundo. Ela tinha uma consciência e senso comum, é claro, mas ambos nunca seriam mais importantes do que Menou.
Naturalmente, Akari viver ou morrer também não contava para nada nessa escala.
“Bem, agora estou mais certa do que nunca.” Momo puxou sua serra da bainha de babados de suas vestes de sacerdotisa e a brandiu. A serra com forma de arame estalou bruscamente ao vento.
“Você não é do tipo que quebra só por causa de um manuseio um pouco brusco, é? Vou te amarrar, arrastá-la até a Espada de Sal e matá-la com ela.”
“Por que não vai em frente e tenta? Se acha que consegue.”
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Suspensão]
Não houve aviso—uma conjuração de Tempo foi disparada da ponta do dedo de Akari.
O feixe de luz continha um truque milagroso que podia parar o fluxo temporal em um nível conceitual. Isso encerraria a luta imediatamente se atingisse, mas Momo conseguiu desviar por um fio. A construção de Akari era assustadoramente rápida. Não era tanto habilidosa quanto puramente natural; em vez de construí-la, era como se ela lançasse uma construção que já existia em sua alma. Seus ataques pareciam pular o passo de invocação completamente.
Tentar se esquivar dessas conjurações instantâneas só iria dificultar mais as coisas.
Então, em vez disso, Momo ficou na ofensiva, tentando forçar sua oponente a entrar em modo de defesa sem dar brecha para um contra-ataque.
Uma serra em forma de chicote silvou pelo ar. Akari não conseguiria sair do seu alcance a tempo. Ela apontou seu dedo indicador na serra e lançou outra conjuração.
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Deterioração]
Com um alto swoosh, a serra quebrou e caiu em pedaços.
Seu ataque era incrivelmente poderoso. Momo prontamente soltou o pó que restou de sua serra e analisou os ataques de Akari. A garota não tinha estratégia de combate e tinha apenas um pouquinho mais de experiência do que uma total novata. Isso não seria suficiente para enfrentar um aventureiro mediano, muito menos alguém do calibre de Menou ou Momo.
Tudo que ela tinha era seus poderes.
“…Os quais são absurdamente perigosos.” Momo resmungou.
Ela não sabia quantas vezes a Ádvena havia usado a Regressão, mas dado que ela estava viajando com Menou como sua protetora, Momo duvidava que Akari tivesse tido muitas oportunidades de lutar por conta própria. Mesmo se ela tivesse, Akari podia pegar seus oponentes desprevenidos com suas habilidades e terminar a batalha antes mesmo dela começar, então era seguro assumir que ela não havia aprendido nenhuma técnica de combate.
Razão pela qual Momo conseguia lutar contra ela.
Se Menou tivesse habilidades como as de Akari, Momo provavelmente não seria capaz de se manter por mais do que dez segundos. A razão principal para Momo se equiparar a Akari era a falta de conhecimento de combate da garota japonesa.
Isso, e outro ponto importante: Akari não estava realmente tentando matar Momo.
“Eu sempre te odiei, Momo.”
“É mesmo? Pessoalmente, eu ficaria perfeitamente feliz se você morresse.”
“Você não sabe nada sobre Menou, mas anda por aí agindo como se a entendesse melhor do que ninguém. É tão irritante.”
“Com licença?” Momo franziu a testa. “E o que você sabe sobre a minha querida sendo que acabou de conhecê-la, hmm?”
“O futuro dela.” Akari respondeu simplesmente. “Ao contrário de você, eu sei sobre o futuro dela.”
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Aceleração]
Akari acelerou drasticamente.
Seus movimentos eram completamente amadores, mas sua velocidade estava longe de ser comum. Não havia artes marciais, músculos ou magia envolvidos. Embora ela não estivesse jogando seu peso corporal ao redor ou chutando o chão para ganhar impulso, havia uma velocidade insana por trás de seus passos normais, tornando o momento do seu ataque difícil de calcular.
Mais importante, Momo tinha que evitar a conjuração de Suspensão a todo custo, já que a deixaria imóvel se a atingisse. Nessa velocidade, no entanto, seria extremamente difícil reagir a tempo.
“Tsk!” Momo firmou sua postura defensiva e tentou provocar Akari.
Embora a outra garota fosse hostil para com Momo, ela não parecia querer matá-la. Ou talvez o problema fosse ainda mais fundamental.
Momo sorriu.
Ela adivinhou que Akari nunca havia matado ninguém. A garota também não tinha coragem para matar. Ela poderia ser capaz de machucar alguém, mas certamente não conseguiria matá-las. Isso era óbvio pelo fato dela continuar tentando usar a Suspensão em Momo, mesmo tendo destruído sua arma com Deterioração.
No fundo, Akari Tokitou era simplesmente uma pessoa muito boa.
“Que tipo de psicopata iria fingir não se lembrar de nada e se aconchegar na minha querida enquanto secretamente trama algo? Poderia só morrer antes de causar mais problemas à ela, por favor? Você não tem direito de falar sobre o suposto futuro da minha querida se não sabe sobre o passado dela, sua metidinha a sabichona.”
“…Cale-se.” Akari parou abruptamente.
Claramente, uma parte daquilo atingiu um ponto sensível; seus ombros estavam tremendo de fúria. Havia algo muito sinistro sobre ela nesse momento.
“Momo estúpida! Você não consegue nem proteger Menou! Não faz diferença você estar aqui ou não—então é melhor me livrar de você!”
Algo dentro de Akari estalou.
*
A princípio, ela pensou que fosse um milagre.
O edifício de pedra. O intimidador nível de luxo. Ela olhou inexpressivamente para o cenário familiar por um momento antes de perceber… que era a sala de evocação no Reino de Grisarika.
Ela havia voltado ao tempo em que foi evocada pela primeira vez.
No momento em que percebeu isso, Akari realmente acreditou que fosse um milagre. Mas rapidamente se deu conta do porquê ela havia voltado com suas memórias ainda intactas.
Seu Puro Conceito estava dando a ela uma chance para refazer tudo.
Assim, Akari esperou ansiosamente pela visita em sua janela. Ela observou a garota com o leve traje de empregada aparecer junto com a luz prateada da lua que emergiu logo após o pôr do sol. E Akari recebeu seu aparecimento de braços abertos.
“Menou!”
Quando se reuniram, ela chamou avidamente o nome da garota e a recebeu alegremente.
Foi nesse ponto que ela errou.
“Como… você sabe o meu nome?”
Desde aquele primeiro encontro, Menou ficou claramente desconfiada dela.
Menou não confiava em Akari. Ela acreditava que Akari havia vindo do futuro, mas duvidava de seus motivos para fazer contato com ela. Menou levou Akari até Orwell—e ela morreu prontamente ali.
Sua segunda chance na vida terminou após o mais breve dos períodos, quando ela encontrou um fim terrível.
Em sua terceira tentativa, ela tentou fugir sozinha.
Ela pensou que o primeiro encontro delas era onde as coisas desandavam. Se conhecer Akari era o que levava à morte de Menou, então era melhor se elas nunca interagissem.
Porém, cerca de um mês após sua fuga…
“Ah, você está sozinha.”
Akari cruzou com a sacerdotisa de cabelo vermelho.
Era a mesma mulher que havia colocado um fim à jornada delas a primeira vez, na terra de sal. Ela sabia que não podia enfrentá-la ou fugir. Se fosse assim que iria acabar, tudo bem—desde que Menou vivesse. Ou assim Akari pensou.
“Aquela minha aprendiz também morreu. Acho que faz sentido você estar sozinha.”
Akari arregalou os olhos quando se deu conta de quem a sacerdotisa devia estar falando. “Não pode ser…”
“Hmm? Foi, a velhota Orwell a matou. Minha aprendiz seria recebida com o portador do Puro Conceito de Nulo e foi morta em vez disso. Orwell é uma conjuradora poderosa, sabe? Se ela mirar em você, será difícil sair viva.”
Assim que ela ouviu que Menou estava morta, Força Etérea foi extraída de sua alma e rebobinou o mundo. Foi no fim daquela terceira vez que Akari soube—se elas não estivessem juntas, Menou morreria.
Ah… entendo.
Foi quando lhe ocorreu.
Quando elas se encontrassem, Menou ficaria menos desconfiada se Akari não a conhecesse. Se ela a conhecesse, isso deixaria Menou em alerta novamente. Em outras palavras, suas memórias estavam atrapalhando.
Menou foi criada para desconfiar de outras pessoas.
Se ela desconfiasse de Akari quando se conhecessem, ela pediria ajuda a Orwell. Afinal, ela confiava mais na arcebispa do que em uma Ádvena, basicamente uma estranha.
E então, Menou morreria. Então por que Menou não desconfiou de Akari na primeira vez? Como ela conseguiu viajar por quase três meses, sendo que ela morreria em menos de uma semana se Akari não estivesse com ela?
Era simples. Foi porque Akari era tão alheia e facilmente enganada que não havia razão para tomar cuidado com ela. Foi porque ela estava viajando com essa garota alheia que Menou ficou mais consciente dos seus arredores do que o normal.
Era a Akari ignorante que permitia Menou viver. Então tudo que ela precisava fazer era viajar com Menou sem saber de nada e ir à terra de sal, onde havia um método que poderia matá-la.
Akari fez a forma de uma pistola com a mão e pressionou o dedo contra sua cabeça.
As memórias de suas viagens juntas…
Se elas vão ferir Menou, então não preciso delas.
Força Etérea: Conectar—Vínculo Indevido, Puro Conceito [Tempo]—Invocar [Regressão: Memórias, Alma, Espírito]
Akari apagou suas próprias memórias.
Assim, a jornada pôde continuar—mas elas ainda não conseguiam escapar das garras da sacerdotisa com cabelos vermelho-escuros.
*
“Nem uma vez. Você não foi capaz de proteger Menou nem uma vez.”
Memórias passaram por sua mente. Os cantos de seus olhos esquentaram com o pensamento de todos esses passados perdidos. Akari descontou sua raiva em Momo, que sempre estava com Menou, porém nunca era capaz de salvar sua vida.
“Você não consegue fazer nada, então meça suas palavras, Momo!”
“Se há um futuro onde minha querida morre por causa desta missão…” Em contraste com o grito emocional de Akari, o tom de Momo era friamente calmo. “...então essa culpa seria sua.”
Akari tremeu… porque sabia que era verdade.
A quarta vez, a quinta vez.
Um por um, ela aprendeu os fatores que causavam a morte de Menou e os evitou, esticando a duração de sua jornada a cada vez—mas havia um obstáculo que ela ainda não conseguia superar.
Quanto mais a jornada delas durava, mais Menou abria seu coração para Akari. Especialmente aquela primeira vez. A razão pela qual Menou foi morta pela sacerdotisa de cabelo vermelho foi porque Menou traiu a Faust e tentou salvar Akari.
Sacerdotisas que se tornavam traidoras eram tabu.
Se ela não viajasse com Akari, Menou morreria—porém, quanto mais tempo ela viajava com Akari, maior era a probabilidade de ela trair a Faust.
Por isso Akari decidiu contar indiretamente a Menou que ela estava em um loop temporal. Se ela envolvesse apenas um pouco da verdade sobre si mesma, Menou nunca entregaria seu coração a Akari completamente. Era isso que ela dizia a si mesma.
Mas também era o desejo egoísta de Akari continuar viajando com Menou.
Momo não perdeu o momento quando Akari fraquejou. Ela a agarrou pela gola e ergueu a outra mão. Akari fechou fortemente seus olhos com medo.
E então, Momo impiedosamente desceu a mão.
Um satisfatório plaft ressoou pelo ar.
“Hm, ai!?”
Momo deu um tapa na bochecha de Akari. Se ela realmente quisesse, poderia ter mandado a cabeça da garota pelos ares na hora, mas isso não a mataria de qual forma. Em vez disso, ela deu outro tapa em sua outra bochecha por via das dúvidas.
“Aiê!! O que deu em você!?”
“Estou apenas esbofeteando algum juízo em você, sua peituda imbecil.” Com esse apelido insultante, Momo soltou a gola de Akari. “Você não é inimiga da minha querida. Isso está claro para mim agora.”
Akari olhou confusa, provocando uma bufada irritada de Momo.
“Vou te ajudar. Então me conte tudo que sabe.”
“Mas por quê…?”
“Escute—só para deixar perfeitamente claro aqui, não consigo enfatizar isso o suficiente: eu te odeio.” Ela disse com total sinceridade, não apenas para esconder sua vergonha. “Não gosto de vê-la tão perto da minha querida, e nada me agradaria mais do que uma parasita como você se embrulhasse e morresse em vez de se aconchegar nela. Portanto, só estou oferecendo ajuda para me certificar de que isso aconteça o mais cedo possível.”
Os olhos de Akari continuaram se estreitando enquanto Momo lançava insultos verbais contra ela.
“…Sabe, eu realmente te odeio, Momo.”
“E como acabei de dizer, eu também te odeio.”
Reafirmando sua antipatia mútua uma pela outra, as duas garotas bufaram e olharam para lados opostos.
“Mas se é pelo bem da minha querida, irei ajudá-la. Isso é para salvar a vida dela, não é? Então conte-me tudo, até o último detalhe. Quero ouvir tudo sobre esse futuro que você supostamente sabe. Eu, obviamente, também quero salvar a minha querida. Sempre quis—e sempre vou querer.”
“…Está bem.”
Às vezes, o ódio mútuo pode facilitar o diálogo.
E após deixar tudo isso claro, Momo acrescentou: “Você é… tão idiotamente estúpida! Morre de uma vez!”
“Não me chame de estúpida ou me diga para morrer! Apenas Menou tem permissão para fazer isso!”
“Ah, me poupe. Você não faz ideia do quão estúpida você é!”
Em meio a avalanche de insultos que se seguiram, Momo fez uma proposta. Era uma opção que Menou e Akari jamais conseguiriam ter sozinhas. Akari hesitou, mas decidiu aceitar.
E assim, as duas formaram uma aliança para fazer o que tinha que ser feito.
*
Enquanto Menou olhava adiante, o sol se pôs completamente.
As últimas listras de vermelho que queimavam do horizonte se apagaram uma por uma. O céu mudou do azul para o anil e finalmente para o preto do anoitecer, e a noite enfim caiu. O sol, o governante do dia, havia sumido, e um céu estrelado e a lua emergiram em seu lugar.
Menou, que estava de prontidão nos fundos da base, media o tempo pela posição das estrelas.
“A qualquer minuto.”
“Mm.”
As duas observaram a Luz Etérea visível na base de longe e esperaram pelo sinal para infiltrar. Ashuna atacaria pela frente, enquanto Menou e Sahara invadiriam pela retaguarda da base durante a confusão subsequente.
“O que devemos fazer se não recebermos o sinal? Só ir embora?”
“Suponho que sim, mas… Tenho certeza de que vai dar certo. Não consigo nem imaginar a Princesa Ashuna falhando.”
“Então Momo pode ser a ameaça maior. Estou preocupada com Akari.”
“Volto a repetir, Momo é confiável.”
Menou estava calando Sahara quando houve um clarão repentino.
“Arrá.” Menou sussurrou.
Uma espada flamejante apareceu, cortando a escuridão.
Certamente não parecia natural, porém, era ridiculamente difícil acreditar que tal fenômeno pudesse ser realizado por uma pessoa. Esta era a segunda vez que Menou a via. Como era a primeira vez de Sahara, seus olhos se arregalaram.
A Princesa Cavaleira Ashuna Grisarika exibiu sua espada como o sinal para iniciar a batalha.
Um estrondo que ameaçava demolir as dunas de areia rugiu pelo deserto.