A Deusa do Banheiro Japonesa

Tradução: Brinn

Revisão: Ryokusan000


Volume 1

Capítulo 3

Izumi estava exultante.

A pedra que ela havia obtido por meio daquele estranho incidente era muito mais útil do que o esperado.

Ela encheu a banheira com água e então jogou dentro dela a pedra que havia recebido daquele Teo Keh barrigudo. Assim que fez isso, após apenas algumas dezenas de segundos, ele havia se transformado em um banho da temperatura perfeita. Ainda melhor, ele não esfriava. Não importava quanto tempo passasse, a temperatura da água permanecia constante. Isso era tão bom quanto dizer que não havia mais conta de gás, então, para uma amante de banhos como Izumi, isso era incomparavelmente valioso comparado àqueles brincos que ela não podia nem mesmo tirar do banheiro.

Eu realmente ganhei na loteria.”¹

Era natural que ela pensasse dessa forma.

Izumi também estava aproveitando seu banho hoje.

Em sua mão direita havia uma garrafa de saquê gelado e em sua mão esquerda havia um copo de saquê. Ela não tinha nenhum plano para o dia seguinte, então isso era uma recompensa para si mesma.

Izumi de repente olhou para a pedra submersa aos seus pés. Já que havia uma pedra de fogo que aquecia a água, poderia ser que também existia uma pedra que era usada para esfriar a água? Se houvesse tal coisa, então ela poderia trazê-la para o banheiro e aproveitar licor frio a qualquer hora; seria como viver em um sonho.

Enquanto se entregava a tais desilusões convenientes, Izumi levou o copo aos seus lábios.

Kuahh~ Tão bom!

O Saquê frio fluiu para dentro de seu corpo quente e curou seu corpo e alma cansados. Era verdade o que os japoneses frequentemente diziam, que o álcool era o ‘melhor remédio’.

Soltando o ar em prazer, seu esôfago frio se aqueceu no instante seguinte como se uma pequena chama tivesse sido engolida. Foi nesse momento que ela realmente sentiu que era verdade que no dia seguinte ela estaria livre.

E durante esse momento de prazer supremo, um som de rangido o arruinou completamente.

Um vento ainda mais frio do que o copo em sua mão de repente soprou para dentro do banheiro.

— … Só pode ser brincadeira.

Izumi virou sua cabeça na direção da janela e caiu em silêncio.

Um Yeti estava encarando a chocada Izumi.

— O que é você? Uma mística?

O Yeti falou fluentemente.

Uh, não. Eu é quem deveria estar te perguntado o que é você. Um Yeti? Um pé grande? Um Sasquat? Ou talvez um Yukiotoko?

— O que isso deveria significar?

O Yeti gemeu. Tentando criar uma defesa mínima, Izumi ergueu a garrafa de saquê em sua mão. Enquanto olhava para a fraca resistência de Izumi, o Yeti colocou as mãos sobre a cabeça antes de deslizar seu pelo para longe.

Izumi ficou de olhos arregalados.

O que ela tinha certeza que era uma forma natural, na verdade, era um chapéu. Por causa do pelo que cobria tudo menos os olhos, nariz e boca, assim como a barba que tinha a mesma cor que o pelo, ela tinha certeza de que aquilo era um Yeti ou uma criatura similar, mas assim que o visitante removeu o chapéu, ele havia se transformado em um homem humano normal.

— Meu nome é Setsugen. Qual é o seu, Mística-dono?

Uh, não, como eu disse, eu não sou uma mística. — Murmurou Izumi enquanto olhava para o homem chamado Setsugen. Sua barba o fazia parecer velho, mas sua voz e comportamento casual transbordavam juventude.

Setsugen olhou em volta do banheiro com grande interesse. Após observar a lâmpada com atenção, seu olhar retornou para Izumi antes de franzir o cenho.

— Então você está no meio de uma cerimônia de purificação…

Parecia que seria preciso uma grande quantidade de esforço para explicar as circunstâncias para Setsugen. Izumi rapidamente desistiu.

— Eu sou Izumi. E então, você também… É… tem algum tipo de problema, talvez? Tipo, por exemplo, você foi abandonado, ou talvez esteja no meio de uma busca por alguém?

Nos últimos dias, Izumi esteve pensando sobre os misteriosos incidentes em seu banheiro sempre que estava livre. O resultado ao qual ela chegou após ponderar foi de que talvez ela tivesse sido encarregada com papel de resgatar aquele homem abandonado e então introduzi-lo a Teo Keh.

Izumi era uma ateísta. Ela não acreditava nem em Deus, nem em Buda, mas ela ainda ia orar nos templos Xintoístas durante o Ano Novo, ouvia as orações dos monges budistas durante os funerais e vagamente imaginava que um dia iria se casar em uma igreja. Nem Deus, nem Buda existiam, então a religião era um assunto da pessoa consigo mesma. Até agora ela ainda acreditava nisso. Mas apesar disso, ela sentia que havia sido encarregada com um papel; ela mesma sentia que isso era contraditório. Embora se sentisse assim, se aqueles dois se encontrassem em segurança, então seu papel também teria acabado e seria um adeus para esse mundo misterioso, ou assim ela pensou. Afinal, a janela não estava mais conectada àquele mundo misterioso, ou assim ela pensou…

Mas isso aconteceu.

Setsugen inclinou a cabeça confuso.

— Bem, eu não fui abandonado e também não estou procurando por ninguém.

“Oh. Eu estava errada.

Izumi também inclinou a cabeça. Nesse momento, ela percebeu que neve branca estava flutuando para dentro por trás de Setsugen.

Olhando mais cuidadosamente, Setsugen estava em uma cabana numa montanha que era ridiculamente precária para sua localização. O vento soprava ruidosamente contra as aparentemente finas paredes. Embora estivesse tão frio que você precisaria usar pelos ali dentro, a coisa no meio do aposento que parecia ser uma lareira de chão não estava acesa.

— Poderia ser que você precisa de lenha… ou algo do tipo?

Setsugen mais uma vez inclinou a cabeça.

— Não, na verdade eu estava me preparando para ir embora.

Então isso estava errado também. O homem não parecia estar com nenhum problema em particular.

Embora a janela tivesse se conectado a um mundo misterioso novamente, talvez não houvesse uma razão específica.

— Para onde você está indo?

Por  estar aparentemente errada, Izumi ficou decepcionada e perguntou a ele por curiosidade. Após ficar em silêncio por um tempo, o homem respondeu em voz baixa: — Zaharya.

— Entendi!

Izumi reflexivamente se levantou da banheira.

A superfície da água balançou, espirrando água e empurrando a bandeja com o copo de saquê contra a parede.

— Você quer se encontrar com Teo Keh, certo?

A face do homem ficou rígida diante de seus olhos.

— Você é uma pessoa de Yohk’Zai?

Eh-… Eh? Não. Não, eu não sou.

A cautela e hostilidade abertamente exibidas pelo homem deixaram Izumi em pânico.

Ela tinha tanta certeza de que ele desejava se encontrar com Teo Keh. Apesar de ter certeza de que ele também estava procurando pelo homem dos brincos azuis…

— Eu apenas encontrei com aquele tio Teo Keh por acaso e conversei um pouco com ele. Nós não somos nem conhecidos, para não falar nada de eu não ter nada a ver com Yohk’Zai.

— Vocês se encontraram por acaso?

Setsugen ergueu uma sobrancelha.

— Isso, isso. Eu encontrei com aquele homem abandonado num deserto e dei a ele um pouco de água e depois disso, no dia seguinte, Teo Keh apareceu, e quando eu falei pra ele sobre o homem abandonado ele ficou incrivelmente feliz… Parece que ele estava procurando por ele. Eu tenho certeza de que ele era alguém muito importante para o Teo Keh, você não acha?

— Um homem por quem Teo Keh estava procurando? …Procurando… Procurando por…

O homem repetiu isso vez após vez como se pensasse cuidadosamente considerando suas palavras.

Hummm

Izumi timidamente chamou o homem:

— Há algum problema?

— Aquele homem encontrou o Teo Keh?

Izumi balançou a cabeça para o carrancudo Setsugen.

— Eu não sei. Porque depois disso eu nunca mais encontrei com o homem abandonado, nem com Teo Keh.

—Mas, — Izumi continuou.

— Ele disse algo sobre uma cidade oásis ao leste, então se ele estiver vivo, eu acho que eles se encontraram.

As palavras de Izumi foram metade devido a sua esperança. O homem era alguém que ela havia conhecido por uma reviravolta no destino e para quem ela havia dado água. Como esperado, ela realmente torcia para que ele tivesse sido salvo.

O homem olhou para o céu e fechou os olhos.

Sua mandíbula cerrada tremeu levemente.

Izumi não conseguiu aguentar isso.

Aparentemente, Yohk’Zai não era uma nação amada por Setsugen. Ela não tinha ideia da relação entre os dois, mas era de partir o coração vê-lo suportar seus sentimentos de arrependimento.

O homem que havia mantido seus olhos fechados por um longo tempo deixou um suspiro escapar e olhou de volta para baixo.

— Eu entendo. Então Teo Keh o achou, huh.

— Eu não sei o que realmente está acontecendo, mas me desculpe.

Izumi abaixou sua cabeça fazendo uma reverência.

—Por que você está se desculpando?

— Porque não foi bom para você Teo Keh achar o homem que eu salvei, certo?

O homem sorriu. Um sorriso amargo que parecia ser de alguém que havia desistido de alguma coisa.

— Isso não é nada com o que você tenha que se preocupar, Mística-dono. Tudo o que você fez foi ajudar alguém.

Izumi ficou sem palavras. Ela podia ter feito algo desnecessário. Mas alguém que precisava de ajuda apareceu diante de seus olhos e quando ela tinha uma forma de salvá-lo, era difícil olhar para o lado.

— Então agora, eu já não tenho mais negócios em Zaharya. Eu vou voltar para o meu país.

Setsugen se levantou e colocou o pelo sobre si novamente.

— A propósito 

Enquanto amarrava suas bolsas de volta em suas costas, Setsugen desviou os olhos de Izumi e murmurou desajeitadamente:

— Já faz algum tempo que isso está completamente visível.

— … GYAHH!

Izumi vigorosamente se abaixou para dentro da banheira. Quando outra pessoa disse isso para ela de forma constrangida, ela também ficou envergonhada.

A água transbordando carregou a bandeja para fora da banheira.

Ouvir os sons de algo se quebrando fez Izumi entrar ainda mais em pânico.

O copo que eu acabei de comprar quebrou?

Uah!? Tsch-!

Esticando sua mão na direção do som, dessa vez ela foi chocada pelo seu pé tocando em algo quente e pulou para fora da banheira.

Afobada, ela ligou o chuveiro.

— O que há de errado? Você está bem?

Setsugen perguntou com pena enquanto Izumi jogava água fria sobre sua perna, até mesmo se esquecendo de esconder seu corpo.

— Ahh, sim. Eu estou bem. Parece que eu me esqueci da pedra de fogo e acidentalmente pisei nela.

Izumi respondeu miseravelmente.

— Pedra de fogo?

Setsugen olhou para dentro da banheira com curiosidade.

— Essa pedra vermelha?

— Sim. Se você encher a banheira com água e jogar ela dentro, a água fica quente bem rápido. Aahh, isso é algo que eu ganhei quando disse para o Teo Keh me trazer uma pedra de qualquer lugar, entende.

— … Uma pedra qualquer no chão pode transformar a água normal em água quente!?

Setsugen pareceu ficar chocado.

Mas bem, sim. É assim que você normalmente ficaria. Eu também fiquei chocada.

Izumi assentiu falando — Yup, yup.

— Pedra de fogo. Uma coisa tão maravilhosa assim pode ser encontrada em Zaharya.

Com os olhos incendiados, Setsugen encarou a pedra de fogo.

Tendo uma sensação ruim, Izumi disse — Be-, Bem então, acho que é hora de sair do banho, eu acho. Eu já estou ficando tonta com o calor — Quando ela tentou colocar a tampa de volta sobre a banheira. A tampa foi parada pela mão enorme de Setsugen.

— Espere por favor, Mística-dono. Isso! Você pode me dar isso, por favor!?

Ahh, eu sabia.

Izumi abaixou a cabeça.

— Certo… Pelo que você quer trocá-la?

— Trocar? Ah, você está certa. Não seria bom receber uma coisa tão maravilhosa de graça. Mas, eu não tenho nada decente aqui comigo agora.

Setsugen tirou a bolsa de suas costas e espiou dentro dela, antes de suspirar.

Era irritante vê-lo olhando gananciosamente para a pedra de fogo.

— Ei, você está em um lugar frio, certo? Não haverá pedras de fogo, mas e que tal pedras de gelo ou algo do tipo?

— Pedras de gelo?

— Isso, isso. Seria muito bom se eu pudesse esfriar esse licor.

— Você gosta de beber, Mística-dono?

Após se afundar em seus pensamentos por um tempo, Setsugen bateu as mãos.

— Por favor, espere aqui.

Após dizer isso e deixar sua bolsa ainda aberta, ele rapidamente correu para fora da cabana.

No momento em que a porta foi aberta, o vento uivante e a neve vigorosamente sopraram para dentro do aposento.

Incapaz de aguentar isso, Izumi se afundou de volta dentro da banheira.

Setsugen voltou imediatamente. Em sua mão havia algumas folhas de grama verde que brilhavam suavemente.

Vendo que elas ainda tinham raízes, ele aparentemente havia ido colhê-las agora.

— Isso é grama de geada. De acordo com as lendas, quando o Deus do Poder e do Vinho, Zauna, teve seu amado vinho escondido por sua esposa, em meio aos seus prantos e lamúrias, suas lágrimas caíram na terra e desse lugar apareceu a primeira grama de geada. Ela pode ser encontrada crescendo nos picos das montanhas nevadas, mas…

Chorou apenas porque seu vinho foi escondido? E pensar que realmente existe um Deus do Poder tão patético.

Ouvindo essa história tão vergonhosa que parecia desvalorizá-lo, Izumi perdeu a tensão.

Setsugen cortou fora a haste de uma das folhas.

— Tente colocar essa folha dentro da sua garrafa de vinho. Não importa que tipo de vinho barato ele seja, deixar essa folha durante uma noite dentro dele irá transformá-lo em vinho da melhor qualidade, sabia?

Ele está falando a verdade?

Ela não pôde evitar duvidar das palavras dele. Percebendo isso sobre si mesma, Izumi suspirou. A pedra de fogo também era algo que ela havia originalmente obtido em troca de água. Mesmo se Setsugen estivesse contando uma mentira para consegui-la, não estaria tudo bem com isso?

— Bem, então está bom.

Ouvindo Izumi concordar, Setsugen quase dançou de alegria.

— Nossa troca está completa. Eu estou em débito com você! Com isso, Triht ainda pode ser salva.

Izumi ficou atônita. Aparentemente ela havia mais uma vez se envolvido em algo grande. Envolvendo a pedra de fogo em uma toalha antes de entregá-la, Izumi rapidamente colocou sua mão na janela.

— Bem, então, eu estou indo. Tome cuidado na sua viagem de volta, certo?

— Sim. Você também tome cuidado para não pegar um resfriado, Mística-dono.

Balançando uma mão na direção do homem sorrindo que havia mais uma vez se transformado num Yeti, Izumi fechou a janela. E quando fez isso, ela espirrou.


Nota(s):

1 – Aqui há a seguinte expressão idiomática: “make a killing”, que significa fazer muito dinheiro em pouco tempo. Eu decidi usar uma expressão com um sentido similar em português para fins de compreensão. 



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