Volume 4
Capítulo 162: Trigésima Segunda Página do Diário – Parte 2
Fomos recepcionados por Kawã e Wagner. Brogo avançou com seu chicote sobre o herói que tinha habilidades animais. Por mais que eu estivesse preocupado, não tinha tempo de ficar olhando.
Jairo cuidou de ocupar Wagner. Ambos usavam duas espadas, com certeza ali teria uma batalha inesquecível, mas também não tinha tempo para assistir, precisava achar Zita logo.
Passei pelos guardas em velocidade, não estava interessado em lutar contra eles. Ou melhor, eu adoraria dar uma surra naqueles caras, mas não era o momento. Enquanto eles me perseguiam, corri pelo acampamento torcendo para encontrar Zita antes de encontrar outros heróis.
Nunca me considerei um cara sortudo mesmo...
Na primeira tenda que entrei fui recebido por um raio. Era Leonardo, o loirinho sorridente, que dessa vez parecia cansado e desgastado. Ele até mesmo tinha olheiras bem destacadas e fedia um pouco.
Levar um raio no meio do peito poderia ser mortal, então concluí que Leonardo se segurou um pouco para não me matar. Talvez ele não fosse tão ruim quanto Jonas, ou fosse do tipo que gosta de brincar com a presa.
De qualquer forma eu não ia deixar que ele me acertasse uma segunda vez. Ou melhor, eu achei que não deixaria, mas um raio é muito rápido para um ser humano ser capaz de desviar.
O segundo me acertou na perna, fiquei tremendo por alguns segundos enquanto tentava fugir. Se fosse acertado uma terceira vez, com toda certeza entraria em coma. Resolvi usar a armadura, igual quando enfrentei Anne.
O terceiro raio me jogou para trás, mas a armadura me protegeu. Percebi que Leonardo ficou muito desgastado com os três ataques, não sei o que tinha deixado ele com as olheiras, mas me ajudou a não morrer.
Lucas tomou seu lugar. Eu nem sabia que ele estava ali.
— André! O que está fazendo? — Lucas perguntou.
Tanto tempo sendo chamado de “Deco” quase me fez esquecer meu nome original.
— Eu que pergunto! — Respondi sem tirar a armadura — Vocês vêm até Parva, matam pessoas inocentes, Zita perde o controle e ainda me perguntam o que eu estou fazendo? Vocês são todos idiotas? Pensei que eram mais inteligentes.
— O que está dizendo? — Leonardo se intrometeu no papo — Você causou um problemão na reunião dos heróis ao roubar a Semente da Mãe Terra, depois saiu atacando cidades e roubando escravos...
— Opa! Roubando uma ova! — Interrompi — Eu estava resgatando pessoas escravizadas!
— E como sabe que Zita perdeu o controle? — Lucas perguntou.
— Conheço um cara que conhece um cara... — Respondi.
Até parece que eu ia contar para eles sobre a minha rede de espiões. Mas precisava obter algumas informações, e por mais que amasse uma porradaria sem motivo, eu precisava conversar.
Odeio conversar.
— O que aconteceu com a Zita? — Perguntei como se não estivessem tentando me atacar minutos antes.
— Ela perdeu o controle, não conseguimos fazer nada para ajudar. — Leonardo sentou-se no chão, demonstrando cansaço — Eu sou o único que consegue manter ela sob controle, mas estou no meu limite...
Então era isso? Ele atava cansado por causa do descontrole dela?
— Cada vez que ela “acorda”, o Léo precisa lutar contra ela para fazê-la dormir de novo. — Lucas disse.
Eu não estava satisfeito com a situação, e era justamente por isso que estava ali. Mesmo não sabendo o que poderia fazer, eu tinha que fazer algo. Mas ao mesmo tempo eu tinha uma sensação de que estava deixando passar um detalhe importante.
Ah sim. Eu lembrei que odiava os heróis.
— Onde ela está? — Perguntei — Gostaria de vê-la.
— Você não pode. — Lucas gesticulou negativamente.
— Então acabou a brincadeirinha, — falei, — ou acham que eu não sei que estão apenas ganhando tempo? Esse papinho furado foi apenas para dar tempo dos seus soldados nos cercarem, mas eu também descobri algumas coisas.
Era muito perceber o fato de estarmos cercados pelos soldados do Reino de Prata, talvez por isso eles não perceberam que a segunda parte era apenas um blefe meu. Aproveitei minha vantagem conquistada na base da mentira e continuei:
— Eu só queria descobrir em qual das tendas a Zita está, e por causa da formação dos seus soldados ficou muito óbvio.
Óbvio nada. Eu não fazia ideia de onde ela estava, mas esperava que a reação deles me desse alguma pista ou teria que descobrir sozinho enquanto enfrentava uma dezena de soldados mais treinados do que eu.
Mas eles foram burros e olharam para a mesma direção. A não ser que tivessem combinado com antecedência, aquela era a tenda que eu procurava.
— Com sua licença... — Aproveitando o momento de distração de ambos, passei entre eles o mais rápido que consegui.
Imaginei que não seria fácil cruzar os vinte e poucos metros que me separavam de Zita, contudo, não esperava estar tão certo. Fui atingido por uma gigantesca bola de carne coberta de escamas, chifres, asas, tentáculos, garras... tinham garras nos tentáculos até.
— Foi mal aê! — Era a voz de Brogo — Eu tentei segurar ele...
Aquela coisa esquisita era algum tipo de transformação bizarra de Kawã. Foi fácil entender que ele usava seus poderes para se transformar em animais, ou pelo menos transformar partes do corpo.
O problema era que agora eu estava totalmente cercado por uma dúzia de soldados e três heróis furiosos. Brogo estava praticamente isolada, era incapaz de me ajudar, o que me fez pensar em usar o sinal de ajuda.
Não mesmo.
Eu não estava ali para lutar com eles, meu motivo era apenas um e eu precisava me prender a ele. Já não existia mais um plano, era hora de improvisar.
Corri na direção contrária à da tenda que Zita estava, como se fosse atacar Leonardo, mas criei um escudo entre nós. Pisei no escudo e me joguei para cima, criando um segundo escudo em seguida.
Repeti o processo por cinco vezes, foi quando meu tornozelo ferrado começou a doer e caí. Não apenas caí, me estabaquei. Caí igual a um saco de esterco. Bem em cima da tenda de Zita.
Deve ter sido uma cena incrível para quem assistiu, só que para mim foi horrível. Eu tinha acabado de machucar meu tornozelo, caído de uma altura considerável, estava cercado por pessoas que não estavam felizes comigo...
Não poderia piorar.
Caros leitores deste maravilhoso diário, jamais desafiem as leis do universo. Quando você achar que está no fundo do poço, na verdade estará apenas chegando na primeira camada de lama. E o universo vai fazer questão de esfregar isso na sua cara.
O tecido da tenda abaixo de mim se incendiou, as pessoas ao meu redor recuaram com medo, gritos de desespero foram ouvidos por todo o local, e uma figura acinzentada e com olhos brilhantes apareceu com seu corpo coberto de chamas bem ao meu lado.
Fui cumprimentado por Zita com um chute nas costelas, forte o suficiente para me jogar a alguns metros de distância. Minha visão ficou turva, tive dificuldade em me levantar. Quando me pus de pé vi um cenário bem diferente de segundos antes.
Todas as tendas estavam em chamas, a maioria dos soldados estavam caídos no chão, Leonardo aparentemente ferido segurava o ombro direito ensanguentado, Lucas estava sendo socorrido por Kawã e Brogo dava cobertura para Leonardo.
O que diabos tinha acontecido enquanto eu estive caído? Passei tanto tempo para me recuperar? Ou será que simplesmente foi rápido demais?
Zita estava no meio de tudo aquilo, seus movimentos eram de uma pessoa descoordenada, como se estivesse bêbada. Mas ao mesmo tempo era incrível como parecia prever cada movimento que tentavam contra ela.
Resolvi testar as capacidades daquele poder fora de controle.
Como sabia que ela não estava brincando, criei um enorme martelo de Rancor e lancei em sua direção. Claro que eu temia feri-la, mas sabia que ela seria capaz de se proteger. Só não esperava que ela simplesmente queimasse o martelo antes de ser atingida.
— Taquiupariu... — Murmurei.
— Você não fez isso. — Leonardo me encarou — Foi um prazer te conhecer...
Meio segundo após Leonardo acabar de falar, Zita apareceu na minha frente. Seus olhos brilhando igual duas brasas pareciam ver a minha alma, seu corpo exalava tanto calor que a umidade do ar formava vapor ao seu redor.
Senti uma gota de suor gelado escorrer pelo meu rosto. E me arrependi de não ter ido ao banheiro antes de atacar o acampamento.
Tentei me mover, mas não fui rápido o suficiente. Sua mão me alcançou antes mesmo que pudesse dar o primeiro passo para trás, seus movimentos eram rápidos demais para meus olhos.
Eu fui capturado pela pessoa que tentava salvar.
Seus dedos seguravam a minha garganta com força, e junto com o calor emitido por seu corpo, senti o dano se agravando. O pouco ar que ainda entrava em meus pulmões parecia ser fogo puro.
Respirar se tornou impossível. Meus olhos lacrimejavam de tanta dor. Meu corpo estava chegando ao limite muito rápido. Como sempre, apelei para o improviso movido a desespero.
Segurei sua cabeça com ambas as mãos e puxei em minha direção, uma péssima ideia. Senti o fogo que emanava de Zita queimar ambas as minhas mãos, mas não desisti.
Quando nossos rostos se aproximaram o suficiente, eu a beijei.
Se ia morrer, que fosse a beijando. Outra péssima ideia. Com nossos corpos muito próximos, as chamas cobriram meu corpo e o calor infernal me levou além do limite que um ser humano era capaz de suportar.
A última coisa que lembro de antes de perder a consciência são seus lábios cedendo aos meus e uma língua tão quente quanto ferro em brasa. Meu corpo foi então tomado por uma sensação de relaxamento e minha mente ficou turva.
Mesmo inconsciente eu parecia ainda estar vivo.
— Finalmente você chegou. — Disse uma voz grave dentro da minha mente — Eu estava te esperando.
Apoie a Novel Mania
Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.
Novas traduções
Novels originais
Experiência sem anúncios