Volume 3
Capítulo 149: O Soldado e a Sacerdotisa
As tropas da Aliança Internacional haviam chegado ao estremo sul da grande falha. Seus veículos grandes e barulhentos chamava a atenção das pessoas daquele mundo que nunca tinham visto um carro com motor à combustão.
Os veículos pararam a uma distância razoável, mantendo algumas centenas de metros de distância do grupo de Long-Hua e das Pessoas Livres do Leste. Mas os preparativos foram rápidos.
Claramente era uma formação treinada exaustivamente, para que conseguissem montar tudo no intervalo de minutos. Nem Long-Hua, nem as Pessoas Livres tiveram tempo de agir. E desse modo, a terceira frente da guerra estava instalada.
Em cima de uma formação rochosa eles haviam instalado o que parecia ser uma arma de longo alcance. Hugo havia avisado da possibilidade de haver algo muito perigoso, que poderia ter sido desenvolvido unicamente para lidar com o poder dos heróis. Talvez fosse aquilo.
Eles se perguntavam o motivo de não terem utilizado ainda. Estariam esperando uma oportunidade? Tinham medo de falhar? Ou será que a quantidade de usos era limitada? Talvez fosse apenas um blefe.
De qualquer forma, eles estavam mantendo distância e se organizando. Atacar o acampamento da Aliança sem um planejamento adequado era suicídio.
Sem contar que, com a chegada de Long-Hua, as coisas ficaram muito imprevisíveis. O Rei do Sul era um homem excêntrico e instável, movido apenas pelos seus ideais. Seja lá quais fossem…
As tropas do Leste estavam muito preocupadas em proteger as fronteiras e cidades do reino, não sem razão. Anos antes, o Reino do Leste havia sofrido muito com as guerras que ocorreram.
Os irmãos adotivos de André haviam tomado a decisão de não intervir diretamente sem que o Reino deles fosse atacado ou seus cidadãos ameaçados. André não tinha discordado da decisão, ele também achava que aquela situação não era da responsabilidade do seu povo.
Com o poder dos guerreiros do Leste, as tropas aliadas dos heróis ficariam bem mais poderosas e com, no mínimo, o dobro dos números atuais. Mas era querer demais, já era muito os Filhos do Leste estarem cooperando com alimentos.
A tensão da chegada repentina da fila de carros militares da AI foi se aliviando conforme a movimentação no acampamento foi se reduzindo. Mas uma nova comoção estava prestes a se formar.
Uma pessoa vinha caminhando sozinha entre os dois acampamentos.
Os batedores das Pessoas Livres foram interceptá-lo e em poucos minutos voltaram, deixando ele esperando, parado, no meio de uma planície. Eles informaram que era um homem chamando Lee-Sen-Park, e que ele queria falar com Zita.
— Comigo? — Zita estreitou os olhos — O que ele quer falar?
— Ele não disse do que se trata, apenas que precisa falar com você.
— Isso pode ser algum tipo de armadilha. — Sônia comentou.
— Ou ele pode ser um idiota. — André adicionou.
— Cadê o Jonas? — Zita perguntou — Seria bom colocar uma barreira ao redor do nosso acampamento, só por precaução.
— Jonas foi atrás do Eduardo e do Wagner. — Lucas explicou.
— E o Gledson foi com ele. — Leonardo adicionou.
— E levaram um carro. — Lucas disse.
— Onde eles conseguiram um carro? — Leonardo perguntou a Lucas.
— Ah é… O carro… — André fez uma cara de que estava lembrando de algo.
— Tínhamos um carro o tempo todo? — Josiley reclamou.
— Eu também tinha esquecido do carro, acredita? — Sônia comentou — Acho que esse mundo de características medievais e pitorescas está me afetando…
— A Amanda não tirou os vidros do carro? — Zita perguntou.
— Como ela está com o artefato dela, pedi que recolocasse os vidros nas janelas e para-brisas. — André explicou — Nunca se sabe quando vamos precisar de um carro.
— A gente precisa de um carro há mais de doze anos, aí você traz um e deixa o Gledson tomando de conta? — Lucas reclamou.
— Acho que estou ficando esquecido. Deve ser idade… — André desviou o olhar.
— Eu vou! — Zita disse.
— Pra onde? — Lucas perguntou.
— Falar com o coreano ali. — Ela respondeu.
— Por favor, não faça nada perigoso… — André disse.
— Calma meu amor, eu tenho um plano.
— É disso que eu tenho medo…
— Normalmente são os SEUS planos que dão errado.
— Experiência não é conseguida apenas com acertos…
— Te conheço há muito tempo, passamos muita coisa juntos. E vi muitos dos seus planos darem errado, mais vezes do que deram certo.
— Eu te amo. — André disse olhando nos olhos de Zita.
— E eu te amo, seu esquentadinho. Mesmo você tentando mudar de assunto.
— A quente aqui é você!
— Acho que quando isso tudo acabar eu vou aceitar aquele seu pedido de casamento.
— É bom mesmo, você está me enrolando por sete anos.
— Já disse que sou uma mulher difícil… — Zita disse, se direcionando aonde Lee-Sen-Park estava.
— Que o sol continue e brilhar! — André gritou.
— E seu brilho jamais seja ofuscado. — Ela respondeu.
Zita caminhou lentamente até aonde Lee-Sen-Park estava, sob olhares de ambos os acampamentos. Até alguns membros do grupo de Long-Hua parecia interessados no ocorrido.
O coreano com olhar arrogante e cabelo esquisitamente penteado para baixo a esperava com um sorriso no rosto e mãos nos bolsos. Sua postura era arrogante, demonstrando autoconfiança. Talvez por saber que Zita não tinha mais poder algum.
A garota parou de frente para ele, imitando sua postura e expressão.
— O que deseja? — Ela perguntou.
— Conversar.
— Seja breve, então. Meus aliados não estão muito confortáveis com a presença dos seus, e não falta muito para escurecer.
— Apenas queria testar o meu poder. — Lee-Sen-Park respondeu.
— Você quer dizer “o poder que foi roubado de mim”.
— Mas agora ele é meu.
— Que seja, você não foi escolhido, então nunca será capaz de usar a totalidade do poder.
— Por isso eu queria testar até onde posso chegar.
— E por que precisa de mim?
— Você possuiu esse poder por tanto tempo, quero saber se estou evoluindo rápido no meu treinamento.
— Então na verdade você quer exibir o controle que tem sobre o poder que me foi roubado?
— Quê? Não… Eu só…
— Vai! Mostra aí o que é capaz de fazer.
O soldado dobrou as mangas do uniforme, deixando os braços expostos. Na sequência esticou ambos os membros para a frente, com as mãos abertas. Da palma de cada mão surgiu uma chama que serpenteou por entre os dedos, envolvendo os braços até os cotovelos.
— Em poucos meses você foi capaz de dominar o que levei dois anos, muito bom.
Lee-Sen-Park deu um sorriso vitorioso.
— Ou seja, com vinte e pouco você tem o mesmo poder que eu tinha com… quatorze. Até chegar onde eu cheguei, o poder terá corrompido seu corpo e você será apenas uma estátua de carvão.
Lee-Sen-Park pareceu não gostar do comentário. Ele ergueu a mão direita com a palma para cima, e uma bola de fogo surgiu imediatamente. A magia começou então a aumentar de tamanho como se fosse alimentada por um combustível poderoso.
— Legal! — Zita disse, inexpressiva — Eu uso essa mesma temperatura para fazer churrasco, e digamos de passagem, sou uma ótima churrasqueira!
Lee-Sen-Park triplicou o tamanho da bola de fogo.
— Agora sim está parecendo um ataque mágico. — Ela comentou, e dando as costas, começou a voltar para onde os outros estavam —Mais uns anos de treino e eu até poderia enfrentar você…
— Você nem tem poderes..! — Ele disse, parecendo estar fazendo um esforço exagerado.
— Ainda sou à prova de fogo! — Ela retrucou, chateada com o comentário.
Lee-Sen-Park deixou-se levar pela provocação da garota e arremessou a bola de fogo diretamente em cima dela. Mas Zita girou e segurou o ataque como se fosse nada. Isso até tirou alguns aplausos de quem assistia, exceto André, ele permaneceu sério.
Mas o que deixou a cena mais bonita foi que Zita parou o ataque com as mãos nuas.
— É sério que tentou usar meu fogo contra mim? — Ela pareceu estar mais séria.
— Como…? — Lee-Sen-Park não conseguia fechar a boca.
— Que parte de “herdeira do deus do fogo” você não entendeu?
Chamas azuis recobriram os braços de Zita, como se consumissem as chamas de Lee-Sen-Park, fazendo ele se afastar com uma expressão de medo e confusão.