Volume 2
Capítulo 60: Invasão ao Outro Mundo
Era um dia como qualquer outro naquele bosque, o vento quente e úmido soprava intenso por sobre a copa das árvores, os animais se moviam em busca de alimentos, os pássaros cantavam e voavam por entre as copas das árvores, e no riacho que partia a pequena mata ao meio, os peixes nadavam tranquilamente. Um ambiente natural se a presença de humanos desde sua declaração como região demarcada para a proteção da vida selvagem.
Mesmo estando localizado em um vale cercado por montanhas, denominado de vale dos monstros, naquele lugar não havia uma criatura monstruosa. Muito pelo contrário, os monstros a que o seu nome se referia era na verdade grandes reis do passado que se enfrentaram em uma batalha sangrenta naquele mesmo local.
Nas montanhas em torno haviam algumas poucas cavernas, onde moradores de vilas na proximidades vinham tentar a sorte coletando pedras e metais, na tentativa de encontrar algo de grande valor e mudarem de vida. Mas eram poucos os que atualmente se arriscavam, cada vez menos mineral de importância estava sendo encontrado, e a maioria das pessoas das áreas rurais estavam sendo estimuladas a produzirem alimentos.
Depois da crise de alimentos dos reinos do Oeste, algumas cidades tinham sofrido demais com a perda de habitantes para a fome. Todos os reinos tinham investido demais na guerra e esqueceram de produzir comida, assim, Flek usou a crise a seu favor, pressionando os reinos vizinhos a se submeterem ao reino de Prata em troca de auxilio econômico.
Durante o período de crise, as pessoas das pequenas vilas ficaram se abastecimento, e buscaram alternativas para adquirirem alimentos, e uma foi caçar no vale dos monstros, quase extinguindo a vida selvagem ali. Mas agora, mais de um ano depois da situação ser controlada, a natureza voltava a seguir seu rumo.
Como o ser humano não segue o curso da natureza, enquanto o que é natural busca o equilíbrio, o ser humano busca o caos e a guerra. Naquele dia, que estava tão calmo, um som estrondoso ecoou por entre as árvores, assustando os animais e fazendo o chão tremer.
No centro do bosque podia ser visto um brilho azul girando em espiral a uma velocidade constante, algo muito diferente do que normalmente se via em um lugar daquele. Do brilho saiu uma perna metálica que pisou com força sobre a grama, em seguida, revestido do mesmo metal, apareceu um corpo e uma cabeça.
Em poucos segundos surgiu do meio do brilho, uma pessoa de armadura prateada com capa azul, usava uma espada longa ao lado, e andava em torno do brilho como se analisasse os arredores.
— Tudo limpo, podem passar! — Uma voz abafada veio da pessoa de armadura.
Na sequência, dez soldados com uniformes militares similarmente camuflados em diversos tons de verde e marrom passaram pela pessoa de armadura, e adentraram o bosque, se escondendo atrás das árvores e em questão de segundos se tornaram imperceptíveis no ambiente. Após os soldados, saíram duas mulheres jovens com roupas totalmente casuais, que pareciam não se preocupar com o ambiente em volta.
A primeira era Raniely, a heroína arqueira, usando seu macacão marrom preso à apenas um ombro, e por baixo uma blusa verde. Logo atrás saiu Jaiane, a heroína fantasma, que odiava seu título de guerra, usando um vestido solto de cor clara, e por baixo uma calça folgada, além de sapatilhas. Depois das duas heroínas, vieram mais algumas dezenas de soldados carregando bagagens com provisões e uma infinidade de equipamentos.
Enquanto os militares organizavam o material e abriam uma clareira no bosque, o portal azul foi aos poucos fechando até ser totalmente extinto. Jaiane e Raniely ficaram lado a lado com o cavaleiro de prata, observando o trabalho daquela multidão de homens e mulheres uniformizados. Em menos de uma hora haviam terminado de abrir um espaço circular de mais de 100 metros de diâmetro, então partiram para a construção de tendas e montagens de equipamentos eletrônicos.
— Onde vocês acham que estamos? — Perguntou o cavaleiro de prata após muito tempo em silêncio — E não digam: “No outro mundo”.
— Ah… acho que é possível ter uma ideia do reino ao menos. — Raniely falou, triste por não poder fazer a piada.
— Essas árvores aqui e volta são figueiras amargas, comuns apenas no lado Oeste do continente, então não estamos no Leste! — Jaiane apontou para as árvores em volta.
— Também não parece ser o Reino do Sul, lá faz muito frio nessa época do ano e aqui está quente… — Completou Raniely.
—E se nos basearmos pela posição do sol, e a hora do dia, eu diria que estamos no quarto oeste do continente, que tem fuso horário de duas horas a menos em relação à capital do reino de prata… — Jaiane olhava para as sombras e para um pequeno relógio digital em sua mão — Aqui marca onze e vinte, mas o sol está à nove e vinte.
— Extremo Oeste… Ao Norte… — Raniely abriu um sorriso — Sabe o que isso significa?
— Reino de Aço! — Exclamou a garota fantasma — Estamos em casa!
— Reino de Aço? — O Cavaleiro murmurou.
As duas heroínas deram pulinhos de felicidade, enquanto o Cavaleiro de Prata as observava em silêncio. Ao mesmo tempo chegou um militar de alta patente e fez um gesto de continência para o Cavaleiro de Prata, era o General Nogueira, líder da missão.
— Senhor cavaleiro! Nossa instalação foi concluída com sucesso. — E olhando para Jaiane — Agora necessitamos de apoio aéreo para avaliar a área e mapear o máximo possível.
Jaiane era, mesmo entre os 33 heróis, uma dos poucos que podiam voar, então sabia que naquele momento era a única pessoa com capacidade de fornecer apoio aéreo.
— Pelo menos pedissem por favor… — Resmungou a garota enquanto seu corpo e roupa ficavam transparentes.
Quando sua aparência ficou totalmente translúcida, quase invisível para os olhos humanos, seu corpo começou a flutuar e em segundos ela desapareceu nos céus. Após poucos minutos a garota retornou com seu sorriso costumeiro, vindo de uma direção diferente da que tinha saído, o que mostrava que ela tinha percorrido uma grande distância.
— Avistou alguém nas redondezas? — Perguntou o general com tom ríspido.
— Apenas alguns mineradores nas montanhas ao noroeste, são pessoas aparentemente pobres que vivem de coletar minerais, não apresentam perigo à nossa missão.
— Nossa missão é confidencial, caso algum desses mineradores nos aviste, iremos eliminá-los.
— Se você matar alguma pessoa inocente dentro do Reino de aço, eu matarei você! — Se virando para os guardas, Jaiane completou — Isso serve para qualquer um desse pelotão!
— Não me desafie garota! — o general quase gritou — Eu ainda sou o líder desse pelotão e responsável pela missão! Como você não é militar, deixarei que essa sua insubordinação passe , mas saiba que na próxima terei que tomar medidas duras!
— Vai me castigar? Me prender? Digo, amarrar a uma árvore, já que não temos prisão aqui nessa clareira que vocês chamam de base.
— Jai, fique calma… — Raniely reclamou a amiga.
— Considerarei esse seu deboche como o segundo ato de insubordinação! — O general rapidamente sacou uma arma de cano curto e encostou no ombro de Jaiane — O que acontece aqui fica aqui, as leis do nosso mundo não tem valor algum nesse!
Ao final da fala do general houve um disparo, mas a bala não tocou o corpo de Jaiane, mesmo atravessando seu ombro. Simultaneamente ao tiro à queima-roupa, ela se desmaterializou e atravessou o corpo do general, levando a arma da mão dele no processo.
— O que..? Você? Como? — O general estava surpreso, ainda mantendo seus dedos no ar como se segurasse uma arma.
— É… Acho que o André tinha razão, mesmo a gente tendo explicado, vocês não entendem nada dos nossos poderes. — Jaiane disse se virando para o general, com um sorriso infantil porém assustador.
— O que está acontecendo com você? — Perguntou Raniely — Somos amigas há muito tempo, mas nunca vi você sorrir assim.
— Um truque que aprendi com um velho inimigo. — Respondeu a garota fantasma — Ainda tenho que aperfeiçoar um pouco.
As duas se afastaram um pouco do general e do Cavaleiro de Prata, na verdade Raniely arrastou sua amiga dali a força. Elas tinham algumas coisas a discutir.
— Sua idiota! Por que fez isso? — A arqueira reclamou em tom baixo, porém mal-humorado.
— Eu não gosto desse general, ele quer machucar pessoas do Reino de Aço!
— Mas isso não é motivo para ameaçar o cara que lidera uma missão desse nível!
— Eu só topei vir nessa missão porque você me pediu, não deixaria a minha melhor amiga voltar à esse mundo sozinha com essas pessoas estranhas!
— Ok! Já que fez isso por mim e somos melhores amigas, ficarei do seu lado. — Raniely abraçou sua amiga e sussurrou ao ouvido — Se vamos proteger o Reino de Aço mais uma vez, faremos isso juntas.
Soltando o corpo da sua amiga do abraço apertado, Raniely caminhou até o centro da clareira chamando a atenção de todos e pedindo que se aproximassem. Quando todos, incluindo o general e o Cavaleiro de Prata, já haviam chegado, ela não disse nada, apenas apontou para a árvore mais grossa na borda à frente.
Enquanto todos viraram para olhar para a árvore, Raniely afastou as duas pernas, dobrando levemente os joelhos, aproximou as duas mão fechadas e depois as afastou como se segurasse um arco invisível. Aos poucos um brilho dourado surgiu de dentro de suas mãos e um arco e uma flecha de energia pura foram revelados. Ela disparou.
A flecha voou em direção à árvore em uma trajetória retilínea, sem som ou interferência do vento forte. Quando estava prestes a tocar a casca da árvore, mudou de direção bruscamente, entrando na floresta. Todos os olhares se voltaram para Raniely, como se estivessem buscando o motivo dela errar, mas o sorriso triunfal fez os olhares voltarem à floresta em busca da flecha de energia.
Por entre as árvores um brilho dourado percorria em ziguezague, desviando rapidamente de cada tronco, galho, moita ou cipó. Raniely deu um passo à frente e estendeu a mão esquerda fechada para a frente, no mesmo instante o brilho veio em sua direção, desviando no último momento e indo em direção aos soldados, repetindo a ação de desviar de cada um deles. Por fim a flecha de luz subiu em direção ao céu e descrevendo uma trajetória parabólica, sumiu de vista.
— Você mostrou que poderia matar todos nós com um único tiro! — O general sorriu, disfarçando o medo, mas o suor em sua testa dizia o contrário — Ou por acaso estou errado?
— Não está errado! Nós permaneceremos com vocês, como conhecemos esse reino e somos conhecidas por algumas pessoas importantes aqui, nos propomos a levar os líderes da missão à capital a fim de criar uma aliança entre a nossa tropa e o Reino de Aço! — Raniely falou bem alto — Mas isso não significa que servimos a vocês, nos considerem apenas guias!
— Guias que podem matar todos vocês se fizerem algo que nos desagradem… — Completou Jaiane.
— Não me importo! — O Cavaleiro de Prata finalmente se manifestou — Desde que vocês duas não atrapalhem a “minha” missão!
Acordo feito, as duas heroínas e o Cavaleiro de Prata se retiraram, deixando apenas os soldados da Aliança Internacional, que saíram logo em seguida para trocar as roupas de baixo. Em pouco mais de uma hora nesse mundo, eles já tinham visto a morte de perto.
Assim foi iniciada a invasão ao Outro Mundo.