Que Haja Luz Brasileira

Autor(a): L. P. Reis


Volume 1

Capítulo 9: De recuperação

— Mesmo tendo esses grandes poderes, ainda tem que frequentar a escola? — Ecoou na mente de Gael o questionamento bem-humorado de Luís, relembrando aquele momento em que retornava para casa mais tarde do que o habitual. O cenário ao redor era pintado pelas cores do entardecer, criando um ambiente cênico e sereno.

Naquele momento, a memória o transportou para o passado, quando o garoto faltou à aula no dia em que recebeu os poderes extraordinários. Tal descuido resultou em consequências, pois acabou ficando de recuperação em três matérias na escola. Seu avô, zeloso e severo, foi chamado pela instituição na escola e repreendeu-o com fervor.

Desde então, Gael se via em tardes solitárias, enquanto seus amigos, Daniella e Luís, seguiam o caminho de volta para casa sem ele, uma rotina que se repetiria durante todo o mês. A lembrança do reforço imposto por seu avô, que tomou seu notebook, celular e videogame até que seu comportamento melhorasse, trazia-lhe certo desalento, pois sabia que não estava em recuperação por seu próprio erro, mas sim devido às exigências dos guardiões.

A sensação de frustração o invadia, especialmente ao imaginar que não conseguiria concluir a saga emocionante de “One Piece — e descobrir o desfecho tão esperado, o qual aguardara ansiosamente para assistir. O temor de encontrar seu mestre Karumo em meio a suas jornadas e receber inadvertidamente um spoiler adicionava um toque cômico a seus pensamentos.

— E essa cara de frustração? Até parece que o reforço ainda não acabou — Uma voz melodiosa soou atrás de Gael, pertencendo a Stef Lykaios, uma colega de turma na recuperação, que partilhava o mesmo caminho de volta para casa todos os dias. Seu olhar encontrou o de Gael, revelando um leve sorriso amigável.

Stef possuía uma estatura delicada, um pouco acima de 1,50 de altura. Seus cabelos ondulados exibiam uma tonalidade castanho claro com mechas lilás nas pontas, que contrastavam de forma graciosa. A pele morena da garota resplandecia sob a luz do crepúsculo. Gael percebeu que era a primeira vez em dias que a garota dirigia-lhe a palavra, o que o deixou intrigado e curioso diante daquela cena harmoniosa entre os personagens de sua história cotidiana. O cenário, com seus tons suaves e a beleza singela da interação entre os dois, acrescentava um toque especial àquele momento de encontro e revelação.

Já haviam se passado dez dias desde que Gael havia adquirido seus poderes extraordinários, e, desde então, os guardiões não haviam feito contato com ele. O cenário que o cercava era banhado pelas cores da natureza, enquanto o tempo fluía em seu ritmo próprio.

— É só que estou meio frustrado por ter ficado de recuperação. Meu avô tirou meu celular, meu notebook e meu videogame por causa disso. Então, não terei nada para fazer hoje à tarde — Disse Gael, compartilhando seus sentimentos com a garota presente. O clima que envolvia o diálogo era calmo, como um suave vento acariciando a paisagem.

— Sei bem como é. Meus pais também fazem o mesmo comigo sempre que fico de recuperação, mas já me acostumei com isso — Afirmou a garota, buscando oferecer palavras de conforto e empatia para Gael. A luz do sol iluminava seus cabelos e refletia em seus olhos, tornando sua expressão ainda mais suave e acolhedora.

Porém, Gael estava claramente sendo evasivo sobre a verdadeira natureza de suas tardes. Na realidade, ele se dedicava a repetir os movimentos ensinados por Karumo durante o treinamento.

Respirando profundamente pelo nariz e pela boca, Gael podia sentir a energia das chamas fluindo por todo o seu corpo, como uma onda ardente que o envolvia completamente. O poder elemental irradiava de dentro para fora, preenchendo o ambiente com uma aura única e majestosa.

Karumo havia instruído Gael em exercícios que desafiavam seus limites, fazendo-o sentir como se seus pulmões pudessem arder como brasas. Agora, praticando aquilo diariamente, ele percebia que todo o seu corpo também experimentava sensações igualmente intensas, como se estivesse sendo transformado por aquela força ancestral.

Todas as vezes que ele sentia uma ardência por todo o seu corpo, quase insuportável, Gael dizia “Ignis” e então algo maravilhoso acontecia: o cenário ao seu redor se iluminava com a mais magnífica das chamas. O garoto possuía o dom de manipular o fogo sem mesmo chamar pelo nome verdadeiro de seu elemento. Entretanto, almejava aprimorar ainda mais seu controle e maestria, e para tal, persistia em seu treinamento árduo.

Desde o momento em que decidiu embarcar nessa jornada, sua motivação era a de presenciar novamente a majestosa aparição do leão de fogo, testemunhado ao lado de Karumo e Kira. Contudo, apesar de suas inúmeras tentativas de convocar o poderoso ser, este permanecia ausente, tal qual uma esquiva sombra de mistério.

Apesar das vezes em que, por um triz, quase incendiou seu próprio quarto, Gael conseguia, cada vez mais, dominar pequenas e médias esferas flamejantes com a palma de sua mão. No entanto, quando se tratava de um fogaréu imponente, sua habilidade se esvaía, deixando-o impotente diante da magnitude do elemento. Assim, vivenciou momentos em que quase destruiu o próprio cômodo em que dormia, trazendo frustrações que o inundavam.

De alguma forma, essa sensação de não estar plenamente em controle de seu poder ecoava também ao empunhar a misteriosa espada que adquirira. Ao exibir a reluzente arma para seus amigos Luis e Daniella, estes a encararam com admiração e temor, impressionados com sua aparição súbita. Mas o que realmente inquietava Gael era a sensação persistente de que algo essencial faltava.

O jovem não conseguia identificar com clareza o que era essa lacuna, não conseguia abraçar plenamente o sentimento necessário ao manejar aquela lâmina, pois, afinal, jamais tivera uma espada em mãos. As palavras sábias de Karumo ecoavam em sua mente, mencionando que o poder da espada evoluiria com as batalhas que enfrentaria. Porém, como poderia enfrentar tais desafios, se não conseguia sequer confiar na arma que lhe fora confiada? O dilema o consumia, envolvendo-o em um turbilhão de incertezas, como as labaredas dançantes que cercavam seu ser.

Era como se uma peça da sua próxima evolução estivesse faltando, mesmo treinando apenas 10 dias, para o garoto, ele havia chegado no seu limite de aprendizado, o grande problema é que ele não fazia ideia de como poderia entrar em contato com um dos guardiões, o que lhe restava era passar o resto da tarde em casa todos os dias treinando e aqueles pensamentos levou o garoto a se lembrar da conversa que teve com seus amigos.

— É como se você fosse o Ace… — Afirmou Luis para Gael ao ver o fogo em sua mão direita e sua espada na mão esquerda — Mas com essa espada fica meio destoante de você ser ele.

— Pior que estava pensando a mesma coisa, no meio de todos aqueles guardiões, eu fui um completo idiota ao me chamar de Ace — Silva coçou a cabeça se lembrando do momento cômico que havia tido quando despertou seus poderes.

Os raios dourados do sol poente, vindos da janela, envolviam o grupo, criando uma aura ao redor deles. A risada de Silva ressoou como um suave acorde, e o cenário parecia sorrir em resposta. A beleza do momento era tão cativante que os três amigos se deixaram levar pela atmosfera envolvente.

— Uau! — Se espantou Daniella ao ouvir aquilo que Gael havia passado nas últimas horas para ele e nos últimos segundos para eles — Então definitivamente sua vida mudou para sempre, quem diria?

Daniella ficou maravilhada com a narrativa de Gael, suas palavras fluindo como pétalas de cerejeira levadas pelo vento.

— Você ainda está aí? — As palavras de Stef trouxeram Gael de volta para realidade, o que fez Silva se sentir um completo idiota, a garota tentando fazer ele se sentir melhor e ele deixando ela no vácuo dos seus pensamentos, mas quando o garoto falaria algo para ela para tentar melhorar a situação no meio das ruas, um carro foi destruído na frente deles. Com os olhos arregalados, ele se voltou para Stef e, num impulso, gritou:

— Corra!

Com um olhar assustador, a garota olhou para ele como se Gael tivesse testemunhado algo terrível, mas, para sua surpresa, ela correu. A próxima ação do protagonista era óbvia; ele então clamou pelo nome verdadeiro do fogo.

— Ignis!

O fogo irrompeu por todo o corpo de Gael como uma lambida quente e ardente, envolvendo-o em uma aura incandescente que emitia um brilho ofuscante, como se milhares de estrelas estivessem dançando em torno dele. O calor pulsante parecia emanar do próprio âmago do jovem, elevando sua energia a um nível transcendente.

No ápice desse espetáculo de chamas, o fogo cedeu lugar a uma espada que surgiu em sua mão com um resplendor metálico. A lâmina reluzia como a própria luz do crepúsculo, refletindo as cores do céu poente e emitindo um zumbido suave e enigmático.

O ser colossal media mais de 4 metros de altura, e sua pele cinza contrastava com o verde exuberante do ambiente. Vestia uma sandália que parecia pertencer a tempos ancestrais, e uma surrada tanga de pano cobria suas partes íntimas, , quando o mesmo avistou o garoto apenas gritou:

– M E T R A G A M O G U A R D I Ã O D E S S E P L A N E T A!

O monstro gritou aquilo de uma forma bem lenta em direção a Gael que notou que aquele brutamonte veio para lutar contra ele, mas o mais assustador era que o ser carregava um porrete enorme de madeira em sua mão direita e algo parecido com um soco inglês na mão esquerda com um material metálico em uma tonalidade verde–água, porém era na cabeça daquele ser que estava a característica mais marcante.

O monstro emitiu um grito gutural, soltando aquelas palavras arrastadamente em direção a Gael. O brutamonte se aproximava, deixando claro que estava ali para um confronto. Entretanto, o que mais deixava Gael apreensivo era a arma que o ser carregava consigo.

Em sua mão direita, o monstro empunhava um porrete colossal, talhado em madeira maciça. O bastão era de proporções impressionantes, com entalhes que denotavam sua origem rudimentar, provavelmente extraído de uma árvore ancestral. A aparência bruta do porrete contrastava com a precisão que o monstro demonstrava ao segurá-lo, como se estivesse habituado a manuseá-lo em combate.

Contudo, o que chamava ainda mais a atenção era o objeto curioso em sua mão esquerda: um soco inglês modificado. Em vez de ser composto apenas por metal, a peça possuía um material metálico de coloração intrigante, uma tonalidade verde-água, que parecia reluzir sob a luz fraca do local onde se encontravam. O soco inglês modificado era uma engenhoca intimidadora, repleta de detalhes elaborados que lhe conferiam uma aura sinistra. No entanto, a característica mais marcante do ser estava em sua cabeça.

O garoto contemplou o ser com olhos arregalados, absorvendo cada detalhe impressionante que se apresentava diante dele. A careca reluzente do ser, com um único olho majestoso e penetrante, situado de forma imponente no centro de sua testa, evocava uma alusão inegável à figura lendária de um ciclope. A aura mística e imponente que emanava da criatura o envolvia em um fascínio avassalador.

Indagando para si mesmo, as perguntas se aglomeravam em sua mente:

— O que um ser desse porte está fazendo aqui na terra? Como uma criatura destas veio parar aqui no meu bairro? — As palavras de seu mentor, Karumo, ecoavam em sua memória, ecoando a lembrança da frase direta que lhe dissera durante os treinamentos:

— Não se preocupe, seres fortes não vão aparecer na terra.

No entanto, ao finalizar seus pensamentos, uma inquietude o atingiu profundamente, entendendo que se saísse vivo dali, mataria Karumo com toda certeza.

— Seres fracos, o que será que é um ser forte para ele? — Indagou Gael em seus pensamentos tentando entender o que Karumo queria dizer com aquela mensagem.

Mas o garoto também se lembrava dos ensinamentos adquiridos durante as aulas de história com o estimado professor Bernardo Pitta, quando Daniella sempre tinha a pergunta certa para fazer ao professor. Na sua frente, a matéria que a garota tanto amava, ganhava dimensões na sua frente

Ganharam uma nova dimensão diante do cenário que se desdobrava à sua frente. Até alguns dias atrás, o garoto e seus amigos encarava essas histórias como meros mitos, mas agora, com seus olhos, era testemunha de um ser que transcendera as páginas dos contos, materializando-se diante dele.

Concentrado e puxando a coragem dentro de si, Gael preparou sua espada com a determinação de tudo que andou aprendendo esses dias, sentindo o peso da responsabilidade enquanto o ciclope, uma força imponente das sombras, avançava em sua direção. O porrete colossal, carregado com a força de séculos, era empunhado com agressividade, visando aniquilar o adversário que estava prestes a enfrentar. Cada segundo parecia se estender, alimentando a tensão no ar enquanto ambos se preparavam para o embate iminente.

Fim do capítulo

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