Volume 2

Capítulo 19: Amor e Negócios

Talvez fosse a paisagem ilustre de Eldravel, ou apenas a atmosfera do ambiente, mas Harkin caminhava pelos portões do palácio ao lado de Serafina com seu smoking formal — e, ainda assim, não era ele quem atraía olhares. Isso era impossível com a dama ao seu lado. Ele era considerado bonito, mas nunca o suficiente para ofuscar Serafina aos olhos de outros homens.

— Sinto que caminhar ao seu lado às vezes parece mais perigoso do que pular na garganta de um Ekinotei enraivecido.

— Para de ser dramático, garoto.

Serafina respondeu com ironia na voz.

— Dramático? Eu? Tá me confundindo com outro.

— Claro, vítima social extremamente elegante.

Ele riu levemente da provocação e continuou:

— Mas é sério… todos os homens por quem passamos até agora estavam com ódio e inveja. Sei que estou com a dama mais bonita do Império, mas ainda assim me incomoda ver a cobiça desses merdas.

Ela parou de frente a ele, bem onde muitos dos guardas e nobres que ele mencionava podiam vê-los — e o beijou. Um beijo digno de causar inveja no mais romântico dos homens. Puro e sentimental, mas carregado de paixão.

— Relaxa, bonitão. Eu tenho olhos só pra você. Nem notei esses olhares. Podemos?

Ela perguntou, apontando sutilmente para o caminho à frente. Meio estupefato com a situação, ele apenas a seguiu, um sorriso escapando no canto dos lábios.

“Essa mulher com certeza é mais do que mereço.”

Entrando em Eldravel, atravessaram vários corredores e guarda-salas até chegarem à ala da família imperial.

— Jantar? Isso aqui tá mais pra uma festa.

— Por isso estamos preparados — Sera respondeu, já prevendo a reação dele.

A chegada dos dois era impossível de ignorar. Pareciam personagens saídos de um conto de fadas. A atenção rapidamente se voltou para Serafina — e muitos homens casados precisaram se controlar para não levarem bronca das esposas.

— Harkin! Serafina! Que bom que chegaram.

Jeanne se aproximou como boa anfitriã.

— Vossa Alteza, pensei que seria só um jantar familiar…

— E ainda assim se vestiu formalmente, garoto. Quem você acha que engana?

O olhar de Harkin mudou. Saiu da expressão de enteado para o de alguém dentro de um tabuleiro político, tentando se livrar das amarras do mestre do jogo.

— Ela já está aqui?

— Sim. E junto com outros… “amigos da família” dos reinos, agora.

— Eu devo me preocupar, Jeanne?

A voz dele estava firme, questionadora, sem ser desrespeitosa. Ele sabia que Eiden o mataria se faltasse com respeito à sua dama — e além disso, nos últimos meses, ele e Jeanne haviam se aproximado. Serafina sabia: quando Harkin abandona os títulos e se refere a alguém pelo primeiro nome, isso só podia significar uma coisa:

Ou ele está puto, ou há algo sério o suficiente para deixá-lo preocupado com a presença da mãe dele.

— Não se preocupe, menino. Hoje é um dia de celebração. Qualquer tipo de problema será tratado no Conselho das Nações, amanhã.

Harkin não gostou da resposta. Mas sabia que insistir agora seria passar dos limites da etiqueta.

“Ela não vai falar… Porra!”

— Se me dão licença, preciso entreter os convidados. Vocês são de casa, aproveitem. E, Harkin, seu quarto ainda está à disposição. Que tal usá-lo hoje?

— Não seria apropriado, Vossa Alteza. Sou o príncipe de Nerio. O que os emissários de outras nações pensariam ao ver isso?

— Tsk… para de bancar o moleque. Vai morrer de confiar um pouco em mim e nele?

Harkin sorriu — um sorriso político, falso, carregado de sarcasmo.

— Confiança não foi o que me manteve vivo, Vossa Alteza.

Serafina ficou vermelha diante da audácia dele e lhe deu uma cotovelada nas costelas.

— Lembra com quem você tá falando, idiota! — Depois se virou para a imperatriz. — Desculpa por isso, Jeanne. Ele esquece os modos quando não consegue o que quer.

Harkin se curvou de dor, uma mão nas costelas, quase indo ao chão, enquanto Jeanne se afastava rindo levemente.

— Vamos, amor. Para de drama. Você aguenta bem mais que isso. Eu nem conseguiria te arranhar mesmo se quisesse.

Ele ainda estava com a cabeça cheia, calculando possibilidades, tentando prever o jogo — mas a cotovelada o trouxe de volta ao momento.

— Meu corpo pode ser resistente… mas seus golpes machucam minha alma!

Ele simulou um choro tão convincente que qualquer ator se sentiria humilhado.

— Bem, já que é assim, fica aí recuperando sua alma. Aposto que os convidados vão adorar me ver sozinha…

Revigorado, ele se ergueu com a energia de mil sóis e pegou o braço dela.

— Nem fudendo! Esses caras só vão ter uma chance… se passarem por cima do meu corpo frio e enterrado nas profundezas do inferno.

— Hihihi — Serafina riu. — Vamos. A Okini tá me esperando ali.

Ela apontou. Okini usava um vestido elegante, salto alto, e uma saia que a fazia parecer uma donzela indefesa. Ao seu lado, Pietro estava num smoking preto que parecia prestes a explodir por causa dos músculos. Camila, estonteante, usava uma veste azul-escura que realçava seus olhos.

— Eu não vou ficar lá — os três mosqueteiros tão me esperando. Mas te acompanho.

Ele a conduziu até os amigos e, em seguida, seguiu para onde seus irmãos o aguardavam.

— Cacete, ia rolar pelo salão inteiro antes de vir aqui? — Leona provocou.

— Tá com saudade, é? Para com essa porra. Que foi, o que vocês querem?

Solomon, com um fraque bem alinhado, olhou para a irmã — que usava um vestido militar com um copo de uischaim na mão.

— Qual o problema de vocês dois? Querem fazer uma cena no nosso lar?

— Você só tá esquecendo de uma coisa, irmão. — Gordon rebateu.

— O quê?

— Que oficialmente, Leona, eu sou príncipe de outro país. Então vê se para de dar chilique em público.

Harkin pegou uma taça de um garçom que passava servindo bebidas e tomou um gole para molhar a garganta. Enquanto isso, sua irmã olhou ao redor e pensou:

“Droga, ele tá certo. O que deu na cabeça da mamãe e do papai pra convidar tanta gente?

O salão imperial estava repleto de figuras influentes — do império e do mundo afora. Ainda não era o dia oficial do encontro da aliança, mas festas como essa eram comuns antes de conselhos, para acalmar ânimos e estreitar laços.

— Ah, vinho Aruzino. Pelo menos os velhos sabem servir bem os convidados.

— Pelo menos você tem bom gosto.

— O Gordon concordar contigo é novidade.

— Assim como você esquecer assuntos secretos da família em público.

— Ele tá certo, Solomon. Da cabeça de vento ali eu até entendo. Mas você ser descuidado não é o que espero do meu parceiro de negócios.

Harkin olhou para o irmão, tentando entender se foi um descuido sincero… ou um “erro” calculado.

— Tô preocupado com o fato da sua mãe ter vindo. Ela nunca veio aos conselhos antes… era sempre o Kian que representava ela.

— Queria saber o que tá rolando também. Minha esperança era vocês. Mas pelo jeito… também não sabem.

Os três negaram com a cabeça. Harkin suspirou e tomou outro gole.

— Sua namorada tá linda. Você tem sorte… e o Stein, azar.

— Nem me fala. Queria me sentir triste por ele, mas seria mentira.

Os três riram da sinceridade.

— Bom saber que o sofrimento do meu garoto alegra vocês.

A fala de Solomon veio sem veneno. Eles haviam, depois de muito tempo, conseguido atingir um pouco de fraternidade.

Harkin viu Gabriela com Adrien ao longe. Ela estava belíssima. Adrien, por outro lado, mesmo em seu uniforme militar, parecia um macaco treinado tentando acompanhar uma princesa.

— Me diz, Leona, como mulher… o que você vê de interessante no meu cunhado?

A pergunta pegou os três de surpresa, mas Leona respondeu:

— Eu não sou a melhor pessoa pra responder isso. Você já viu meu marido?

— De fato… a beleza o persegue — comentou Gordon.

— Mas ele é mais rápido — completou Solomon.

— Porra, vocês nem parecem que gostam dela…

— Eu não ligo, Harkin. Sei que o Vlad não é bonito pelos padrões sociais, mas eu o amo do mesmo jeito. De certa forma, entendo a Gabi. Conhecendo sua irmã como você conhece… sabe que beleza nunca entrou em questão.

— Não achei que você tinha casado por amor.

— Bom, eu e você somos exceções.

— Não esqueça do Markus — disse Solomon.

— Ah, qual é… vocês dois não amam suas mulheres? Por que casar com alguém se não ama? Eu não faria isso nem fudendo.

— Eu amo a Ophelia. Mas, quando me casei, foi porque nós dois íamos nos beneficiar mutuamente. Era lógico.

— Meu Deus, Solomon… por isso seus filhos são esquisitos.

— Olha quem fala — rebateu Gordon.

— Até tu, Gordon?

— Nós não tivemos os mesmos privilégios que você, Harkin.

— E por que casar, então, com quem não se ama?

— Mesmo motivo do Solomon. Eu precisava me estabilizar pra ser senador. Então casei. A opinião pública foi lá em cima.

— Vocês são estranhos. A Leona e o Markus conseguiram e estão no mesmo patamar.

— É só que a Leona se apaixonou por ninguém menos que o bisneto do General Kaius — comentou Solomon, apontando para o monstro que conversava com Eiden no salão.

— E — completou Gordon — o Markus casou com alguém da família Centuri, uma das casas mais influentes do Império.

— Então não vem dar uma de último romântico pra cima da gente. Casamento é um contrato, no fim das contas. Se você tá oficializando que ama alguém ou ganhando benefícios, tanto faz.

Solomon levantou a taça e brindou.

— Ah, foda-se. O que eu tava esperando de vocês?

Harkin virou o líquido de sua taça e pegou outra.

— Enfim, por mais que a prosa esteja boa, acredito que não era por isso que vocês me chamaram aqui.

O clima entre eles mudou de novo.

— Acho que, pela natureza do assunto, seria melhor eu iniciar. E talvez seja melhor nos sentarmos — sugeriu Solomon.

— Ok por mim — respondeu Harkin. Os outros assentiram.

Foram até uma mesa mais afastada, com vista para todo o salão. Agora sentados, em tom de negócios, esperavam Solomon começar:

— Bem, estamos fechando seis meses de parceria efetiva entre as minhas companhias, as dos Smiths e a Touriga Tech.

— E? — Harkin respondeu, entediado.

— E que, nas nossas cláusulas contratuais, deixamos em aberto a possibilidade de expansão, dependendo do desempenho dos negócios.

— Sim, eu lembro. Mas ainda é cedo pra isso, não? E o que Gordon e Leona têm a ver com isso?

— Bom, não que eu estivesse tentando esconder… mas eles são sócios em alguns dos ramos que queremos expandir. A opinião deles é indispensável.

— Não me levem a mal, mas vocês vivem se colocando em cheque. Por que fariam negócios juntos?

— Sim — respondeu Leona —, mas não nos odiamos. Nem somos idiotas. Se dá pra se beneficiar enquanto nos pressionamos, por que não?

— E esse papo de “se odiar” é entre eles. Eu não poderia ligar menos — completou Gordon.

— Se é assim, por que você assume tantas responsabilidades?

— Pelo mesmo motivo que você, fedelho: garantir um mínimo de liberdade individual.

Harkin apenas assentiu em silêncio. Entendia perfeitamente.

— Já que isso tá acertado, vamos ao que interessa — retomou Solomon.

— Ainda é muito cedo. Vocês precisam de paciência. Mal começamos a distribuir os produtos. A maioria da população ainda está conhecendo os magiphones agora. Até então era coisa de nobre.

— E você tornou isso acessível com o que desenvolveu na Touriga. Mas está esquecendo da escala do Império.

— Como assim?

— Você pode estar acostumado com o mercado de Nerio, mas aqui é diferente.

Harkin entendeu na hora. Seu rosto mudou para o de um homem de negócios.

— A população de vocês é milhares de vezes maior que a nossa, sem falar na economia. Se não fosse a obsessão do povo em serem magos, vocês teriam avançado muito mais.

— Bom pra você que somos obcecados. Isso abriu espaço para que suas bugigangas fossem apreciadas.

— De fato. As bugigangas são bem convenientes, como a Leona disse. Por isso queremos expandir para além dos aparatos do dia a dia.

— Gordon, seja mais específico. As áreas de atuação da Touriga são amplas. Eu fiz questão disso. Mas já disse ao Solomon que há coisas fora de questão — como está explícito no contrato.

— Sim, sim. Tudo que for de fornecimento militar pra Nerio tá fora de jogo.

— Por isso — interveio Solomon — queremos algo novo. A família da minha esposa até hoje não entendeu o que você fez naquela espada e lança.

— “Surreais” foram as palavras — completou Leona, com um olhar predatório.

— Então vocês querem que eu assine um contrato de produção pro Império… ou melhor, pras empresas de vocês.

— Exatamente — os três responderam.

— Vocês pensaram no impacto disso na economia local? Ou pior… na internacional?

Harkin falou enquanto, de rabo de olho, via Stein se aproximar de Serafina e os outros.

— Por isso essa reunião. Queremos planejar.

— Isso é assunto pra vocês e pro governo se virarem. Eu não sou daqui. Mas saibam que não vou prejudicar famílias e trabalhadores honestos só pra vocês lucrarem.

— Calma, irmão — disse Gordon —. Vamos negociar até ser sustentável. Também não queremos desestabilizar nada.

Antes que dissessem mais alguma coisa, Harkin os interrompeu.

— Ok, eu topo. Agora… Solomon, eu vou acabar arrebentando seu moleque de novo.

— Quê?! — Solomon arregalou os olhos.

— De graça, pirralho — murmurou Leona.

— É justificado — respondeu Gordon, apontando discretamente para Stein, que havia se juntado a Camila e claramente dizia algo que não devia para Serafina. A expressão de Okini deixava claro: ela só não explodiu por respeito ao local.

— Esse garoto não aprende. Só porque treinou um pouco com Markus, já acha que é o fodão.

— E então, qual vai ser? — perguntou Harkin. — Tu resolve ou eu?

— Pode ir, moleque. Eu não vou interferir. Mas lembra: estamos no meio de convidados da família de tudo que é lugar. Independentemente do que fizer, não cause uma cena.

— Podexá.

Harkin assentiu, mãos nos bolsos, e foi caminhando lentamente em direção ao seu sobrinho. Não precisava ser um gênio pra saber que

uma vírgula errada podia mandar tudo pros ares.

— Vamos apostar pra ver quem perde a paciência primeiro? — perguntou Leona, já prevendo o caos.

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora