Volume 1
Capítulo 4: Amigos
— Como parte da tradição, vamos apresentar aos estudantes a história de nossa instituição! — Viktor dizia com uma voz forte. Seus olhos percorriam a sala, registrando cada rosto, como se estivesse catalogando o potencial de cada um.
— Viemos como um enorme projeto internacional, nascidos de uma ideia de vários países juntos e chegamos aqui em 2019. O objetivo? Ir além do que qualquer outra faculdade e curso, dar oportunidades reais para os estudantes. Graças ao nosso sistema de rank, vocês ganharão mais respeito e reconhecimento e, quando concluírem o ensino médio, já terão um emprego digno das suas capacidades.
A AGF não era apenas um campus qualquer. Eles tentaram reunir o máximo de cursos possíveis, até alguns que são apenas hobbies. Ao invés de tentar fazer essas matérias depois de terminar o ensino médio para ter uma graduação ou nível técnico, agora os alunos poderiam fazer essas aulas junto do seu ensino médio e, quanto melhor eles fossem em cada matéria, maior seria o seu rank, indo do Rank E até o S.
Graças ao rank, no final do ensino médio, qualquer aluno recebia propostas de empregos de empresas que têm interesse em jovens promessas. Quanto maior o seu rank, maior a oferta por você. Assim, eles diminuiriam o nível de desemprego e fariam cada aluno ter um trabalho mais adequado a suas capacidades.
— E é por isso que os ranks existem. Agora vocês sabem: tudo o que vocês fazem, tanto aqui quanto do lado de fora, concede pontos. E com maior reconhecimento, maior será o emprego e o salário. Acredito que ninguém aqui esteja feliz se contentando com a mediocridade, né? É uma oportunidade única: vocês não precisam brigar por vagas ou caçar empregos desesperados, ele virá até vocês, claro, se vocês forem dignos desse emprego!
O salão deveria ter explodido em alvoroço, mas o silêncio era a única resposta. Nenhum aluno vibrou, nenhuma mão se levantou. O ar estava pesado, e a cada respiração, o ambiente parecia mais denso. Cada pessoa ali estava rígida no assento, receosa de fazer qualquer movimento errado. A tensão era clara, como se uma tonelada estivesse sobre os ombros de todos.
— Neste ano, temos diversas jovens promessas. Vocês são a turma de primeiro ano com o potencial que eu jamais tinha visto antes. Estou impressionado, mas, além disso, estou depositando todas as minhas esperanças em vocês, jovens que guiarão o mundo para um futuro brilhante.
Por alguns segundos, os olhos de Viktor pareceram ter encarado diretamente Anuk. Sua atenção, no entanto, estava presa à joia que estava no pescoço do garoto.
— Bem, é uma grande mudança na vida de vocês. A partir desse ano, a vida de cada um de vocês estará prestes a virar de cabeça para baixo! Estejam preparados. — Ele finalizou sua palestra com um sorriso de canto de boca, impossível de decifrar.
Depois de alguns minutos, todos já estavam fora da sala de apresentação. Aquele peso no ambiente simplesmente evaporou, e a vida voltou aos rostos adolescentes. Alguns franziam a testa em preocupação, outros mantinham expressões neutras, e havia aqueles que já cerravam os punhos, ansiosos pelo desafio.
“Nossa vida vai virar de cabeça para baixo?”
Anuk estava apoiado na parede, o olhar fixo na palma da própria mão, perdido em reflexão.
— Anuk. Ei, Anuk! — Max estalou os dedos bem perto do nariz do garoto, chamando-o para a realidade.
— Ah, oi! Desculpa, eu estava perdido em pensamentos.
— Francamente, você anda perdido em pensamentos, hein — Max soltou o ar com impaciência. — Enfim, o diretor aparentemente não falou sobre os dormitórios, mas acho que isso não estava no cronograma.
— Dormitórios?
— Sim, pela quantidade de cursos, nós temos que ficar praticamente em período integral na academia e, por isso, nós podemos pegar dormitórios ou uma casa.
— Ah, uma casa… ESPERA, UMA CASA?
— Por que esse espanto? — Max questiona, inclinando a cabeça, confusa.
— Como assim a gente pode pegar uma casa?
— A academia tem um dormitório que pode comportar até uma turma inteira. Nós chamamos esses lugares de casa, já que tem cozinha, banheiros e alguns cômodos que podemos personalizar.
— Uau, acho que eu nunca vi isso.
— Não é muito incomum universidades terem dormitórios ou até mesmo um prédio com vários quartos, mas acho que casas mesmo é algo bem impressionante.
— E nós podemos ficar juntos nessa casa? Achei que teria algum tipo de regulamento que impediria garotos e garotas de dormirem no mesmo lugar.
— Nah, não se preocupa com isso. — Max diz, dando meia-volta e começando a caminhar. — Porém, nós não iremos ficar no mesmo dormitório.
— Não? — Anuk questiona.
— Não, eu já tinha combinado de ficar junto de uma amiga, e seria estranho você estar comigo e com ela. Se fosse só nós dois eu não me importaria, mas com ela envolvida a situação muda de figura.
Anuk estreitou os olhos para a amiga, um sorriso de escárnio se formando no rosto, pronto para a zombaria.
— O-o que foi?
— Você queria ficar sozinha comigo, é? — Ele disse em um tom provocativo.
— C-claro que não, seu idiota — O rosto de Max acendeu em um vermelho vivo, e ela não hesitou: o punho voou e atingiu o rosto de Anuk.
O garoto despencou no chão, em gargalhada.
— P-por que você está rindo? — Max pergunta, os braços cruzados, a vergonha ainda aparente.
— Eu estava precisando disso para voltar à realidade, e você estava muito tensa também. Acho que nós dois precisávamos descontrair… obrigado! — Ele diz com um grande sorriso no rosto.
Max encarou as próprias mãos, surpresa pela reação do amigo.
“Eu estava tremendo e nem percebi?” Ela refletia. Uma sensação de leveza subiu pelo seu corpo. Até então, ela estava totalmente com o espírito armado, com a tensão e o medo dominando o corpo. Ela estava preparada para qualquer tipo de situação, exceto para a que havia acabado de acontecer.
“Ele é mesmo um idiota…” Ela pensa com um sorriso de alívio no rosto, enquanto encarava Anuk se levantando.
— Caaaara… precisava bater tão forte?
— Você mereceu por essa sua brincadeira, hum! — Ela diz, virando o corpo e jogando os cabelos para trás em um gesto de superioridade, enquanto soltava pequenas risadas.
Anuk apenas a encarava, satisfeito.
— Ok, mas o que eu preciso fazer para pegar um dormitório?
— Hm? Ah, sim! Você precisa ir na secretária. É subindo a rampa. Vou levar você até lá. Eles subiram até a área da secretaria. Dentro da sala havia um banco para sentar e esperar em um curto corredor com uma porta à direita e um bebedouro no final do corredor.
— Ok, pode esperar aqui, logo eles te chamam, tá? Tenho que encontrar a minha amiga agora. — Max explica enquanto sai da sala.
Anuk se senta no grande banco de madeira. As paredes eram brancas e o piso de madeira marrom escura. O lugar era silencioso e estático, prometendo tédio. Antes que ficasse entediado, a porta se abriu. Era Aki, o conhecido de Max que havia arrumado briga.
“Que surpresa, não achei que fosse ver ele tão cedo.”
Aki então se senta ao lado de Anuk. O olhar baixo, fixo no chão, ele tentava se encolher, mantendo a máxima distância possível do adolescente ao lado.
— Ah… você está legal? — Anuk perguntou com um tom de preocupação.
O garoto apenas respondeu balançando a cabeça para cima e para baixo.
— Olha, normalmente pessoas que estão bem não agem assim… eu acho.
— Eu… não quero conversar, está bom? — Aki respondeu com a voz tão baixa que quase sumiu.
— Sabe, é bom falar um pouco, desabafar. Isso pode ajudar.
— E por que isso te interessa? Você e eu somos completos estranhos.
— Nossa! Que rude da sua parte falar assim com o cara que te salvou mais cedo. Pelo menos podia ter dito um obrigado antes.
O garoto se vira para Anuk e o encara.
— Obrigado… — Ele diz, e imediatamente volta a encarar o chão.
Anuk ficou sem reação diante da apatia de Aki. Em segundos, uma veia saltou em sua testa. Ele olhou para a esquerda e direita, conferindo se não havia ninguém por perto.
— Show… — Anuk sussurrou, abrindo um sorriso que era metade satisfação, metade irritação pura. Com um único movimento rápido e inesperado, ele socou o rosto de Aki.
O menino apenas caiu no chão, surpreso, os olhos arregalados, sem processar o que havia acontecido.
— O-O QUE FOI ISSO?
— Você estava me tirando da paz — Anuk responde com um sorriso irritado. — M-mas eu não fiz nada! — Aki retruca, levando a mão à bochecha atingida.
— Essa sua atitude, sério irmão, qual é da sua? Eu estou aqui tentando ser legal e te ajudar e você está sendo o maior babaca!
— Eu só não quero conversar e você fica me perturbando!
— Perturbando? Tu quer que eu te soque novamente? — Anuk o ameaça, arregaçando a manga até o cotovelo.
— Não. Não!
— Então por que não conversamos igual a duas pessoas civilizadas? E, desde o começo, Olá, eu sou Anuk Rose, muito prazer em te conhecer! — Anuk diz estendendo a mão para ajudar o garoto a levantar, enquanto o sorriso irritado persistia.
— E-eu… sou o Aki… Akimino Hiroshi…
— E eu pensava que meu nome era diferente para um brasileiro. O seu parece de japonês!
— É porque é…
Anuk então ajuda o garoto a se levantar do chão.
— Beleza, Aki, agora que nos apresentamos igual gente, porque você não me fala qual é o seu problema?
— Sério, porque você se importa?
— Porque eu quero te ajudar, simples!
— E como você tem tanta certeza que pode me ajudar? — Aki questiona.
— Eu não tenho! Mas isso não me impede de tentar.
— Você é um cara bem estranho, hein…
— Estou acostumado a ouvir isso. Agora, o que foi aquilo na entrada da academia?
— … — Aki apertou os lábios, hesitando.
— Olha, se você não falar, é pior. Ficar guardando sentimentos negativos dentro de si e remoer eles não ajuda. Vai por mim, eu sei bem disso!
— O Denis… ele é um imbecil… — O garoto disse, a voz começando a tremer enquanto apertava o punho com muita força.
— Já é um começo, continue. — Ele… ele era o único amigo que eu tinha neste lugar e ele me abandonou… me trocou completamente por causa de uma garota.
— Não entendi, não é só você fazer mais amigos?
— Não é simples assim! Eu não sou bom fazendo amizades. Por que você acha que o Denis era meu único amigo? Eu não consigo fazer amigos! E ele simplesmente me traiu, não é algo simples de se resolver ou até mesmo entender!
— Bem… eu acho que ele era o seu único amigo porque você nunca tentou encontrar novos amigos. Você e aquele cara não combinam em nada.
Aki permaneceu em silêncio, o maxilar travado em irritação, mas Anuk não estava errado. Depois que Denis se juntou com Aki, ele nunca viu necessidade de fazer mais amizades. Ele já tinha o Denis e era tudo que ele precisava, pois Aki acreditava que se ficasse junto dele, eventualmente ele acabaria ganhando mais amigos.
— E ele te traiu, e daí? Você pode simplesmente fazer igual a ele, fingir que ele não existe e continuar sua vida. — Anuk explica com um rosto confuso, como se realmente não entendesse a dimensão do problema.
— Mas é claro que você não entenderia. Olha para você, é um cara grande, forte e bonito, parece até um atleta. Não tem como você entender como eu me sinto, você é igualzinho a eles! — Aki responde a Anuk e o empurra irritado, o lábio inferior tremendo na luta para segurar as lágrimas.
Anuk ficou apenas em silêncio, observando o corpo de Aki encolher à sua frente, a frustração evidente em cada músculo.
— Você não sabe como é não ter ninguém! Você não sabe como é ser o excluído, o esquisito, aquele que queria apenas ter mais amigos, só queria conseguir me enturmar e me divertir no colégio, mas nem isso eu posso! Aqui não passa de um inferno, e a única pessoa que eu tinha, ou achava que tinha, para me ajudar a suportar esse inferno que é este lugar, simplesmente me traiu!
Anuk tentou falar algo, mas o garoto não permitiu, as palavras jorrando em um misto de soluços e lágrimas.
— Eu acreditava que eu e o Denis éramos uma dupla, que ele era diferente e não estava me usando apenas para conseguir passar de ano, que ele realmente era meu amigo e por anos nos divertimos juntos, para chegar no ensino médio e ele só fingir que nada aconteceu, fingir que eu não existo, me tratar igual merda… e por quê? Para impressionar a maldita da Hana? Caralho, Denis, você é tão patético… mas eu sou mais…
Aki afundou a cabeça, escondendo o rosto, esmagado pelas lágrimas, frustrações e dores. Ele apertou o punho com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos, irritado com Denis, entretanto, ainda mais irritado consigo mesmo.
— Bem… então por que não sermos amigos? — Anuk diz, o sorriso reaparecendo, genuíno dessa vez.
— O q-quê? — Aki levantou o rosto, a confusão substituindo a dor.
— Você disse que não sei o que você está passando, mas vai por mim, eu entendo bem… A diferença é que eu não deixo isso me abalar, pelo menos não mais! Não vou te julgar, mesmo achando um pouco de frescura. Cada pessoa tem sua forma de lidar com a dor. Porém, se o seu maior problema é não ter amigos, então eu serei seu amigo!
— P-por que?
— Nossa, mas você questiona tudo, hein! Porque sim, caramba! Você não me parece uma pessoa ruim, e, na real, quem perdeu foi esse tal de Denis. Tenho certeza que a sua amizade vale mais do que qualquer garota. Ele que perdeu um amigo incrível como você e o problema é unicamente dele, mas você tem que seguir em frente. Então, o que me diz? Amigos?
— Você nem me conhece… por que fazer isso? — Aki diz, enxugando o rosto molhado com a manga.
— Eu já disse, não preciso de motivos para fazer o que eu faço, principalmente por pessoas que eu gosto. Se eu puder ajudar alguém de alguma forma, seja ela qual for, eu farei sem nem ao menos pensar muito. Se anima, Aki, você pode ser um esquisitão, mas eu tenho certeza que você deve ser um dos caras mais legais dessa escola! — Anuk explica, o olhar fixo e o sorriso radiante.
“Esse cara é completamente maluco. Como você quer ser amigo de alguém que você nunca viu e, pior, diz que essa pessoa é uma pessoa incrível? Como ele pode ter tanta certeza disso… mas por que isso me animou tanto?” Aki raciocinava, enquanto Anuk o encarava, o sorriso começando a vacilar.
— Ei! Está aí? — Anuk questiona.
— F-foi mal… Eu estava pensando.
— Você pensa demais! Mas e a minha proposta, aceita ou não? Não é muito difícil, né? Ou quer que eu te bata mais?
— COMO ME BATER MAIS VAI ME AJUDAR?
— Ué… sei lá, vai que você precisa de alguma motivação a mais. Quando você está irritado, aparentemente você costuma agir melhor, então, né, vai que ajuda.
— Você é completamente estranho.
— É, eu sei! — Anuk diz, dando uma risada alegre.
“Por que ele parece brilhar e não se importar com nada? Sério, quem é esse cara? Parece que para ele o impossível não existe. Ele mantém esse sorriso bobo não importa a situação? Mas por que eu estou me questionando tanto? Essa talvez seja uma chance para eu conseguir mudar…”
— Ok! — Aki responde, um pequeno sorriso hesitante surgindo no rosto.
— Então está resolvido, amigo. Agora nós vamos arranjar mais amigos para você!
— Nós? — Aki pergunta, surpreso.
— Sim, agora que você é meu amigo, tenho mais motivos para te ajudar. E, sério, esse teu jeito não vai te ajudar, mas não se preocupe, eu vou estar lá para apoiar.
— Olha, Anuk, eu quero dar um passo de cada vez, mas, de verdade, eu sinto que não consigo ainda fazer amizades assim. Eu e você viramos amigos mais por sua causa e sua insistência idiota.
— Está vendo, é essa sua negatividade que não te ajuda. Você desiste antes mesmo de tentar!
— Eu diria realismo, não negatividade…
— Claro que diria, Aki. Olha, aos poucos nós vamos resolver isso, está bom! — Anuk diz, passando o braço pelo pescoço do novo amigo e apertando, rindo alto.
— Eu acho que vou me arrepender disso…
Apoie a Novel Mania
Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.
Novas traduções
Novels originais
Experiência sem anúncios