Filho das Cinzas Brasileira

Autor(a): Hiore


Volume 1

Capítulo 8: Demônio

 

No ar, Caio flutuava, sua cabeça estava caída como se ele estivesse realmente desmaiado. Seus olhos, apesar de abertos, não mostravam mais nenhuma vida. Seus braços estavam suspensos no ar e suas penas completamente moles. Era quase como um boneco de teatro sendo controlado por algo.

Em desespero e sem outras opções, Caio deixou que sua deusa assumisse seu corpo; ou, pelo menos, era assim que ele via aquilo. De uma forma ou de outra, seu corpo tinha sido tomado por uma estranha sombra, que fazia ele se mover de forma antinatural.

Sem se preocupar com a dor, ou com os limites físicos daquele corpo, a sombra avançou com golpes impossivelmente rápidos. Quebrando ainda mais as penas de Caio, ela às usou quase como um chicote, desferindo golpes tão rápido que Leo só podia recuar.

Para piorar, o garoto não podia revidar muito, pois não queria matar Caio, ainda precisava o interrogar. Naquela situação, a única coisa que restava era tentar se defender, mas mesmo assim parecia uma má ideia, pois a cada segundo Caio estava morrendo aos poucos.

“Apenas quime!”

No momento de incerteza, um rugido veio das profundezas do inferno, ecoando de forma desgradável dentro da cabeça de Leo. O eco foi tão insuportável, que ele se distraiu por um momento e teve o peito atingido por um poderoso chute do oponente.

Como uma bala, o corpo do Leo voou na direção da parede, sendo cravado contra ela com enorme força. O ar não adentrava os pulmões comprimidos e uma dor excruciante se espalhou. Sua mente tremia, enquanto sentia o desagradável gosto da morte em sua boca.

Enquanto tentava forçar o ar para dentro, a dor o consumia por completo, mas precisava resistir. Forçando os músculos ao limite, tentou levantar seu corpo enfraquecido, tinha dificuldades de se manter em pé.

“Você está tão fraco agora, que peninha!”

A voz não estava disposta a deixá-lo em paz tão cedo e o cheiro desgradável das cinzas começava a tomar seu entorno. Leo sentiu sua cabeça queimar, seu olho pulsava e ele mal conseguia se conter mais.

Um único golpe o deixará em um estado tão deplorável. E se fosse acertado de novo? Com certeza não sobreviveria. Não havia margem para erros, para piorar, seu corpo estava mais lento e debilitado após aquilo.

Com um predador sentindo o cheiro do sangue, Caio abriu um sorriso bizarro e avançou de forma extremamente rápida, usando novamente suas pernas como chicotes.

Com a visão turva, Leo desviou por milímetros daqueles golpes disformes. Tudo girava enquanto sua cabeça doía de forma insuportável. Mais e mais, os ecos do inferno não permitiam que ele se concentrasse.

Como podia, ele deu passos para trás para escapar da chuva de golpes. Em seguida, usou Plac como um chicote tentando afastar pelo menos um pouco o inimigo.

Por fim, tentou usar seus poderes como uma teia, para conter aquele ser, mas não teve qualquer sucesso, pois Caio conseguia se desprender com facilidade.

Não tinha nenhuma forma de ganhar aquela luta se contendo. Na verdade, mesmo que fosse com tudo, havia uma grande chance de que ainda morreria.

Parece que não tenho outra opção. Respirou fundo e retomou a concentração. Já estava claro que não havia outra forma, por isso Leo aceitou que seria impossível manter Caio vivo e partiu para um ataque mais feroz.

Plac envolveu seu corpo, então endureceu um pouco, formando algo como uma armadura e uma pequena adaga. Não chegava a ser uma proteção confiável, mas era extremamente leve e melhor do que nada.

Rapidamente, ele avançou em direção ao seu inimigo. A sombra respondeu com mais um dos seus chutes extremamente velozes, porém não chegou nem perto de acertar seu alvo dessa vez. Por mais rápido que o golpe fosse, ele era previsível e Leo já  estava acostumado.

Conseguindo se aproximar, o garoto cortou a perna direita de seu inimigo fora. De qualquer forma, como Caio se mantinha em pé flutuando, apenas recuou com facilidade apesar dos danos. Tentando impedir que a distância fosse diminuída, Leo investiu rapidamente perseguindo sua presa.

Então quando ele estava prestes a cortar fora a cabeça do seu inimigo, mãos feitas de escuridão partiram em sua direção.

Sem opção, ele foi obrigado a dar alguns passos para trás. Ao mesmo tempo, sentiu uma pontada de dor na perna esquerda; mesmo sem notar, tinha sido atingido pelo inimigo e um grande corte se formou ali.

Por todo o corpo, feridas podiam ser vistas, seus músculos fatigados já não reagiam tão bem e sua mente cansada não era capaz de processar tudo com a mesma velocidade. 

Leo estava cada vez mais contra a parede e no seu limite.

Preciso matar logo esse cara.. Tentando se concentrar novamente, Leo buscou uma forma de acabar com tudo rápido.

"Apenas queime tudo."

Sem permitir que de novo a voz ecoando em sua cabeça tirasse seu foco, Leo avançou de forma agressiva, pressionando seu oponente, mas...

A pedra vermelha brilhou; centenas de mãos feitas de sombras avançaram.

Numa reação quase instintiva, Leo recuou antes que o pior acontecesse, escapando da avalanche que ia em sua direção.

Mesmo assim o inevitável acontecer.

— Hahaha!! — De forma bizarra seu oponente gargalhava, enquanto Leo sentia seu poder sumir aos poucos.

Medo tomou a fisionomia do garoto, que respirava mais forte. Suas pernas cansadas fizeram o possível para dar alguns passos à esquerda, mas os músculos fatigados não tinham a velocidade necessária.

Ao mesmo tempo, Caio, ou o que sobrava dele, avançou com uma ferocidade tremenda. 

Fazendo com que garras pretas saíssem de sua mão, a sombra acelerou com a certeza de que daria o golpe final.

E logo ela estava a poucos centímetros do seu alvo, esticando suas garras na tentativa de perfurar aquele frágil pescoço.

Era um xeque-mate.

— Venha… — de forma quase inaudível essas palavras foram pronunciadas.

Todo o medo desapareceu, se provando apenas um ato. Leo sorriu.

As garras sombrias nunca alcançaram o pescoço de Leo que deu o último passo para trás a tempo, mas ainda foram capazes de rasgar parte do seu peito com um corte não muito profundo.

Porém, antes que Caio pudesse fazer qualquer coisa, pedras caíram sobre ele, parando seu movimento e soterrando o seu corpo.

Leo sabia que era inevitável que, em algum momento, seu inimigo acabasse selando seu poder, por isso aquele era seu ás na manga.

Desde o início, o que estava mantendo aquelas estruturas de pé depois da destruição que Caio fez, eram as partes de Plac que Leo espalhou pelo teto e paredes. Naturalmente, quando ele perdeu os poderes tudo desabou.

Posicionando-se em um lugar seguro, o garoto observava tudo com certa calma. Ao seu redor, poeira e destroços se espalhavam para todos os lados, mas não parecia que o solo cederia, então estava tudo bem.

Em instantes, boa parte da sala estava soterrada por destroços, claro, o corpo de caio não era exceção, ele estava sendo esmagado por uma grande pedaço do teto que, por coincidência, tinha caído exatamente sobre a sua cabeça, quebrando seu crânio.

O sangue do garoto se espalhou pelo chão e, conforme a poeira descia lentamente, Leo chegou a acreditar por instantes que tudo estava acabado, que tinha matado de uma vez por todas Caio e poderia apenas relaxar, porém… 

— Arrhhh!!!! — O grito ecoou tão alto que as paredes até tremeram e a paz de Leo foi destruída em um instante.

O plano era muito bom, mesmo que Leo estivesse sem poderes e no seu limite, aquele soterramento definitivamente tinha matado Caio.

Mas ele já estava morto.

Desde o início, quando ele deixou seu corpo ser possuído, sua alma já tinha sido perdida.

Se matar o corpo humano de caio não era suficiente, obviamente apenas um sorterramento não seria o suficiente.

Então a pequena joia verde que brilhava no anel de Caio se apagou e apresentou uma pequena e quase insignificante rachadura.

Mais uma vez, o rugido ressoou num volume bizarro.

O corpo cansado de Leo que finalmente tinha relaxado, voltou ao alerta máximo. Porém, depois de perder tanto sangue e se desgastar tanto, ele não tinha mais forças para lutar de fato.

As pedras que antes soterravam o corpo de caio voaram para todos os lados e o próprio corpo do garoto foi destruído. Como se libertado de um selo, um grande tornado de sombras apareceu de tudo aquil

A escuridão de forma estranha se acumulava, girando até se concentrar em um único ponto, uma pequena esfera tão escura quanto a mais fria das noites.

A esfera brilhou e carne, ossos e pele começaram a se formar a partir daquilo. Era um enorme lagarto. Ele tinha escamas verde-escuras, um corpo longo, com uma calda fina que parecia um chicote com uma lâmina na ponta. Seu corpo era magro, com longas garras e uma boca repleta de dentes que, ao invés de brancos, eram pretos.

Da cabeça do bicho estranho, saíam dois grandes chifres, também pretos. Já a esfera negra, ficava bem no centro de sua testa, entre os dois ameaçadores chifres. 

— Arrrr! — Rugindo de forma ensurdecedora, o monstro avançou na direção de Leo.

“O que vai fazer agora, haha?”

Enquanto a maldita voz ressoava em sua cabeça, o garoto era forçado a pensar em uma forma de escapar da situação sem ter mais o Plac.

A resposta era óbvia, ele só tinha uma opção, sua última cartada…

“Apenas queime.”

O olho do garoto começou a brilhar, então ele criou, com o estalar dos seus dedos, um tornado de fogo que consumiu quase tudo naquela sala, forçando o monstro a recuar.

Ainda que o calor fosse insuportável lá dentro, a única coisa que verdadeiramente incomodava Leo, era o cheiro de cinzas e destruição, conforme queimava mais e mais.

Tentando acabar com a luta antes que fosse tarde demais, concentrou as chamas na palma de sua mão formando uma bola de fogo, então arremessou ela no seu inimigo, causando uma enorme explosão.

“Sabe que esse foguinho fraco não é o suficiente, né?”

A voz cada vez mais alta, atrapalhava a concentração, enquanto Leo tinha que desviar de um raio negro lançado pelo seu oponente.

Não havia outra forma. Sentindo sua cabeça latejar, Leo sabia muito bem que não iria aguentar por muito mais tempo.

Num último esforço, olhou ao redor para garantir que não tinha ninguém por perto, então disse:

— Merda, desisto. — Então seu olho brilhou ainda mais.

Perdendo o controle aos poucos, uma dor excruciante percorreu o corpo de Leo, que era forçado a relembrar o passado.

Hahahaha!”

As chamas se acumularam violentamente naquela sala, destruindo tudo ao redor. Como ondas do mar se encontrando, o fogo se concentrou num único ponto.

Então as chamas tremeram, giraram e se contorceram, formando, por fim, a imagem de um pequeno garoto, feito apenas de fogo.

O pequenino sorriu de forma assustadora, enquanto, com um movimento de suas mãos, fez todo o fogo se acalmar.

De forma instintiva, o monstro que rugia e atacava, tentou fugir o mais rápido que podia, pois conseguia sentir quanto seu oponente era poderoso, mas…

— “Queime!” — disseram juntos.

Era inútil tentar fugir naquele ponto.

Tudo foi tomado por chamas.

Após sair da sua sala protegida, Nicole avançou com medo, mas, para sua sorte, todos os corredores já estavam limpos, afinal os monstros tinham sido exterminados quando o grupo passou pela primeira vez. Então, seguindo com passos receosos, ele demorou um pouco para finalmente chegar ao seu destino, mas chegou…

Ou deveria ter chegado?

A sala que deveria estar lá, não existia mais.

As salas ao redor, também não existiam mais.

No ar, os restos de cinzas se acumulavam, tornando difícil de respirar.

Então Nicole engoliu o seco, enquanto seu corpo tremia de medo. O ar nem adentrava mais os seus pulmões.

Tudo que restava era um enorme buraco, cujas bordas chamuscadas, eram a prova de que um ataque muito poderoso tinha destruído tudo aquilo.

Que tipo de monstro assustador tinha o poder para fazer aquilo? Apenas pensar em enfrentar algo assim, fazia Nicole perder todas as esperanças, aquele era um nível de poder muito acima de qualquer coisa que já tinha visto.

Talvez um gênio a nível mundial tivesse alguma chance contra aquilo, mas os alunos, ou até mesmo os professores, só poderiam se curvar diante deste nível de destruição. Então suas pernas cederam, caindo de joelhos amedrontada.

Por fim, descendo por aquele buraco, 5 andares para baixo, um rugido abafado foi emitido. Não era um grito poderoso, mas sim um suspiro de desespero, cheio de agonia, vindo de uma besta que desesperadamente lutava pela sua vida.

No entanto, Nicole não teve coragem de olhar para o fundo daquilo tudo, se tivesse feito isso, poderia ver que uma luta ainda acontecia no subsolo do prédio.

Aceitando em sua mente que não tinha como Leo ter sobrevivido, ela tomou a decisão mais egoísta de fugir e torcer para encontrar um lugar seguro, por mais que se importasse com ele, era apenas alguém que tinha acabado de conhecer.

Contudo no meio do caminho de volta ao bunker, acabou se encontrando com a última pessoa que queria ver: Gustavo.

 

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Nota:

Atrasei bastante por vários motivos, principalmente porque decidi interromper a luta no meio e adiantar esse cap, mas as postagens vão voltar ao normal... espero. E no próximo capítulo já voltamos para o Leo. 

Quem quiser vai poder me apoiar doando no pix, sempre que acumular 20 reais em doação, vou postar um capítulo extra.

Para mais informações, só entrar no meu server do discord: Aqui



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