Edward The Guide Brasileira

Autor(a): Gusty


Volume 2

Capítulo 17: A força de duas almas

A conversa inesperada, repleta de novidades eletrizantes, durou apenas breves segundos. Esse curto intervalo, por mais gracioso que fosse, ainda fora insuficiente para a completa recuperação do Parasita.

Agora mais atento aos detalhes, Edward percebia todo o estrago que Scarlet havia causado ao adversário: nenhum manto mais cobria aquela monstruosidade. Seu corpo exibia um grande corte próximo ao peito — sobre o rosto costurado — e outro, profundo, no braço esquerdo, indo da junta do ombro de madeira até a dobradiça do antebraço. O corpo remendado de pano, pele e madeira agora estampava incontáveis marcas — algo que reacendia a esperança de uma possível vitória para a dupla.

Das feridas brutais escapava um líquido negro e espesso. Ainda assim, nenhum pingo manchava o chão sob os pés da figura ferida — o sobrenatural, de certo modo, ainda prevalecia.

Além da constatação da eficácia das habilidades de Scarlet, que havia assumido o controle do corpo antes desacordado de Edward, novos detalhes reforçavam o tom perturbador do adversário. O pescoço da criatura, agora descoberto, era formado por três mãos dispostas de maneira precisa, como se a sufocassem. Mesmo apodrecidos, os dedos das mãos permaneciam rígidos — como se ainda aplicassem uma força desconfortável. Outras partes de corpos — orelhas, braços, pernas e olhos — distribuíam-se de forma aleatória pelos membros do Parasita.

Pequenos detalhes adicionais revelavam melhor o formato bizarro deste quase manequim: todas as suas juntas eram compostas de madeira, a mesma que formava pés e mãos — uma possível contramedida contra desmembramentos.

O Parasita enfim apoiou sua mão direita ao chão, ergueu o joelho direito — antes completamente apoiado no solo — e logo se levantou aplicando força em seu pé esquerdo. Todas as lentas ações acompanharam altos grunhidos.

Em um lampejo, os olhos da besta brilhavam como dois farois azulados. O crescente desgaste de seu orgulho doía muito mais que os próprios hematomas, a sua tão desejada noite de caça fora banhada por um angustiante azar. Talvez se tivesse sido saciado apenas pela alma de Alex poderia se encontrar em uma melhor situação. Foi sua decisão correr atrás de uma relíquia, uma presa completamente diferente do habitual. Logo, mesmo que terminasse coberto de sangue estava fora de cogitação fugir, Edward precisava morrer.

A respiração pesada acompanhou a fala imponente da mistura de diferentes vozes oriundas do Parasita:

— VADIA POR QUE VOCÊ SE METEU? EU NÃO ME IMPORTO COM ESPÍRITOS SOLTOS COMO VOCÊ! — gritou, com todas as vozes sincronizadas, dando vida a sua frustração pela interferência de uma astuta ameaça.

Revoltada pelo tratamento recebido, Scarlet decidiu testar controlar apenas os lábios de Edward. Sentia receio de apagar outra vez o amigo, mesmo assim precisava revidar.

— Tá com medo é? Eu quero que saiba… meu nome é Scarlet… E neste momento, sou o próprio inferno vindo atrás de você! — disse Scarlet se apropriando dos lábios e das cordas vocais de Edward.

Ciente da bela resposta formulada, a amiga mais calma retornou com as conversas dentro dos pensamentos de Ed. 

— Ei Ed, tá aqui ainda? — perguntou um pouco receosa.

— Caralho… Como você fez isso? — Confuso o garoto recebia uma comprovação das possibilidades providas da inesperada possessão.

— Ufa você tá aqui… Sinceramente, talvez o mais seguro seja controlar minha força em partes específicas de seu corpo… mas isso te deixaria mais vulnerável…

— Eu não quero perder a consciência outra vez… parecia que iria morrer, e também…. eu quero ver esse espírito sofrer! — respondeu, ainda em seus pensamentos, ferozmente a amiga.

— Então me escuta: precisamos agir em sincronia! Vou enfraquecer minha presença por todo seu corpo para evitar qualquer deslize meu. Com isso você ainda irá manter quase toda essa energia que está sentindo. Mas não irei tentar te controlar por inteiro, apenas em alguns momentos… ENTÃO VÊ SE ME ESCUTA! Precisamos agir juntos para nada de ruim acontecer… — A voz apreensiva ecoava por toda a mente de Ed explicando os detalhes de forma rigorosa.

— Estou ficando empolgado! — sussurrou o garoto.

O escape das palavras, junto do sorriso de canto de Edward, revelava o pouco caso dos difíceis detalhes explicados por sua amiga. A pequena fagulha em seus olhos velozmente tornou-se um fogaréu. A sua frente, ou melhor dentro de si, surgia a melhor opção para destruir por completo a existência do desgraçado. 

— Ed vamos focar no braço machucado dele, se conseguirmos— Retornando a conversa para dentro do íntimo de seu amigo, Scarlet tentava formular melhor os próximos passos.

— Não precisa dizer, esse é exatamente o meu plano! — interrompeu o espírito amigável, respondendo agora em voz alta.

Os grunhidos tornaram-se urros viscerais — chegara o momento de recomeçar o confronto.

As dez garras voltaram a sair das mãos emendadas do inimigo. Em postura ereta, o Parasita crescia mais do que em qualquer outro momento, iniciando um caminhar pesado e lento. Era nítido que o braço esquerdo possuía pouca mobilidade; por isso, erguia apenas o direito, retilíneo ao lado do corpo, enquanto arrastava o outro pela grama.

Aquela caminhada inesperada destoava das corridas ferozes que Edward presenciara antes e, no fim, flertava com o surgimento de novos receios dentro do garoto.

— Ele pode disparar em uma corrida repentina… — Edward retomava com sua conversa reflexiva com Scarlet ao mesmo passo que rangia com força os próprios dentes.

— Ele quer que ajamos primeiro, apenas espere… Nossa oportunidade vai surgir. — alertou a cautelosa alma dentro do corpo e mente de Edward

Os 20 passos de diferença entre as duas figuras agora já se aproximavam de 13. Um suor frio percorria lentamente o rosto do rapaz, a apreensão incontrolavelmente crescia. Já possuía todas as armas e ainda assim sentia-se acorrentado.

— Scarlet… não podemos dar chance ao azar. Quando ele se aproximar um pouco mais irei correr e passar por baixo de suas pernas… — Ed formulava seu plano em seus pensamentos, fugindo da cautela pedida por Scarlet.

Cada passo grosseiro convidava o despertar da ferocidade do jovem. Estalos de madeira acompanhavam cada pegada, simulando o ponteiro de um relógio — alguma atitude precisava ser tomada.

Há 9 passos de proximidade tornou-se impossível conter os ânimos. Edward escolhia sua estratégia: segurou firme a faca, sentiu a vitalidade queimar seu corpo e iniciou uma corrida em direção ao calmo Parasita.

— IDIOTA! — a voz de Scarlet reverberou por toda a consciência do teimoso amigo.

Em resposta, o monstro levou o braço direito à frente da barriga, prevenindo um possível ataque frontal do adversário. Essa simples mudança de postura, para azar de Edward, abria ainda mais possibilidades de ataque por parte da fera: tentaria outro golpe pela direita? Estaria ciente do plano do rapaz e enfiaria as garras no meio da ação? Ou talvez disparasse em linha reta, mirando a cabeça de Edward?

A menos de um metro da criatura, a indecisão percorria todo o corpo do humano — antes tomado pela empolgação. Em um piscar de olhos tentou, por instinto, frear a corrida.

O nervosismo fora captado pelo caçador o que resultou em uma feroz decisão. A caminhada pesada alternava-se para um trote selvagem, tornando sua postura mais curvada. O brilho dos olhos do Parasita riscavam o ar, um vulto mortal ia em direção do detestável inseto. Ainda mantinha as garras da mão direita, banhadas pela luz da lua, frente ao corpo — flexionada o suficiente para oferecer mais liberdade em seu novo ataque.

Repentinamente, Edward se viu a poucos centímetros do inimigo, sedento por seu sangue. A ameaça iminente travou por completo seu corpo; ele podia ver, com clareza, que em instantes aquelas lâminas encontrariam sua barriga e o cortariam ao meio. O ânimo trago pelo doce gosto da vingança, no fim, fizera o filho de Alex escolher a pior de todas as opções.

Ciente da imobilidade de sua presa, o Parasita enfim decidiu seu golpe: esticou o braço e mirou na cabeça de Edward, na intenção de cortá-la em duas metades.

O afiado metal, em velocidade, se encontrava milimetricamente próximo das duas pupilas trêmulas do garoto. Outra vez, chegava até a morte o perfeito momento de ceifar sua vítima.

Imobilizado, e cada vez mais distante de si mesmo — conformado com o erro que havia cometido — subitamente Edward sentia uma pressão em seu pé esquerdo.

Scarlet concentrava toda a sua energia na perna e no pé esquerdo do rapaz. Graças às suas habilidades, um movimento completamente anormal tornou-se possível. Em um instante, o garoto — parcialmente controlado pela amiga — deu um forte impulso para a esquerda, como se tivesse corrido antes de pular. A força aplicada foi tamanha que acabou torcendo o pé de Edward.

Novamente, a irritante intrusa frustrou os planos do monstro. Graças ao impulso, as garras apenas riscaram a bochecha direita do menino. A decisão de Scarlet também se beneficiara da falta de mobilidade do braço esquerdo do Parasita. Ela sabia que, se desviasse para a esquerda, seria quase impossível sofrer qualquer tipo de ataque.

— VÊ SE ME ESCUTA, IMBECIL! — reclamou em energia dentro dos pensamentos do teimoso amigo.

A partir do desvio, Scarlet distribuiu sua força de forma mais homogênea, a fim de auxiliar em uma aterrissagem suave para o corpo de Edward. No mesmo instante, o Parasita ainda mantinha sua investida — a reação rápida do alvo fugia do esperado, deixando-o momentaneamente em inércia.

Já com os dois pés sobre a grama, Scarlet alertava outra vez o confuso rapaz:

— Ed, você não vai sentir por agora, mas tive que torcer seu pé para evitar algo pior. Esqueça isso, temos a brecha perfeita… OLHE PARA TRÁS!

Ainda desnorteado, o rapaz apenas seguiu as ordens ditas.

O tremor de seus olhos sumia ao observar o confuso adversário e seu braço esquerdo ainda caído sobre a grama. Determinado, entendia todas as instruções daquela que compartilhava seu corpo. Sem trocar nenhuma palavra, as almas pareciam entrar em sintonia. 

Edward corria, esmagando com força a grama, e se posicionou freneticamente ao lado do braço tombado. Sem pensar duas vezes, ambas as almas concentraram-se na execução de um único ato: com as mãos entrelaçadas, Edward e Scarlet seguraram firmemente a faca — também envolta pelo véu espiritual da garota — e a enfiaram no corte já exposto do membro. Com ainda mais energia, ambos continuaram pressionando a arma, rasgando o antes intangível tecido remendado. Entre berros de dor, oriundos da monstruosidade, os amigos conseguiram desmembrar o antebraço alvejado.

Ainda em sintonia, tudo parecia fácil e claro de ser feito. Edward, munido das habilidades sobrenaturais da amiga, retomou a corrida, recolheu a mão decepada e seguiu em frente, ultrapassando a figura agora agonizante. Sua atitude era compreensível: afinal, uma mão com cinco garras mostrava-se muito mais tentadora que uma simples faca de cozinha.

Uma vitória grande acabara de ocorrer, de pouco em pouco o monstruoso Golias parecia estar perto de ceder por completo. A dor intensa, nunca antes presenciada, tremia por completo o corpo do Parasita — gostaria de cair ao chão, todavia seu orgulho evitava que tombasse outra vez.

Ainda conectados, mantiveram o ritmo acelerado até alcançarem uma distância segura — cerca de 3 metros de distância da ferida besta.

Passada a euforia e a sincronia entre os dois amigos, Edward direcionou sua atenção para a nova arma obtida. Incrivelmente, havia conseguido empunhar uma parte de um ser espiritual — uma sensação mista percorreu até o fundo de seu ser. Sentia-se satisfeito com o feito absurdo que havia realizado. Contudo, encarar as mesmas lâminas que, de alguma forma, haviam ferido seu pai trouxe-lhe um profundo desgosto — o mais puro sentimento de repulsa.

— Eu sei o que está pensando Ed… Foque no que conseguimos fazer, depois pensamos nas consequências. — uma voz mais aveludada, Scarlet evitava explodir em euforia, ressoava dentro do imaginário do rapaz.

— Scarlet… você acha que já é tarde para meu pai? Você me disse outro dia que Parasitas se alimentam de almas a partir das garras… — sussurrou o garoto em tom sereno.

— Ed… tudo pode acontecer… não desista dele, ok? — disse a garota, mais cautelosa, dentro dos pensamentos do amigo.

— Se há uma possibilidade de a alma do meu pai morrer… então quero que esse desgraçado sofra o máximo possível… Scarlet, essa luta já acabou. — murmurou Edward calmamente, sem que qualquer incerteza pairasse em seu coração. — Você virou essa luta a nosso favor. Me desculpe por ter agido tanto pela emoção… mas agora, no fim, quero que acredite em mim.

O tom tranquilo da fala do amigo deixava Scarlet confusamente segura e levemente assustada, algo havia mudado. Agarrada na ideia de que o estranho rapaz aprendera com a última atitude irracional, a menina questionou dentro da consciência de Ed:

— O que você quer que eu faça?

— Este antebraço que arrancamos… é leve como uma bola de tênis… Eu quero deixar ele completamente imóvel… — Ainda sereno, retornava com as conversas dentro de seu íntimo. — O quão rápida você é Scarlet?

— Depende do quanto eu reduza minha presença… ah… — interrompeu a fala ao perceber o plano violento do garoto; engoliu em seco e continuou: — com certeza, rápida o bastante para receber seu lançamento.

Ao ouvir a resposta, um sorriso de canto surgiu no rosto de Edward. Confiante, ergueu-se, fitou o Parasita, que ainda se recuperava, e falou em alto tom:

 — Você sabe que já perdeu, certo? — disse, em voz serena, lançando ao ar o antebraço decepado. — Nós nem precisamos disso; com nossos próprios punhos vamos acabar com você!

Graças à força dobrada pela possessão de Scarlet, o antebraço voou sobre o espírito e pousou a alguns passos dele.

 — Qual vai ser? Vai recuperar as outras garras por medo, ou vai aproveitar e tentar outro ataque? — debochou Edward, enquanto o espírito de sua amiga lentamente saía de seu corpo em direção ao subsolo.

“Estou contando com você, Scarlet… esta será nossa vitória absoluta”, pensou Edward, cuja mente agora estava mais silenciosa. Ao mesmo tempo, sentiu uma leve tontura e todas as dores dos danos que havia sofrido — efeito da saída da alma de sua amiga.

 

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