Volume 1

Capítulo 18: O Véu Guardião

Laki percebeu que Haru estava sumido havia alguns minutos. Ela o vira entrar na maior casa da vila e, pouco depois, notara o movimento de um goblin entrando atrás dele. Isso a deixou ansiosa. Em instantes, não suportou mais a preocupação. Prendeu o arco nas costas e desceu com cuidado a colina, escorregando pelo barranco até pular o muro de entrada de Melnyk.

A povoação já estava livre da maioria dos goblins. Quase todos juncavam o chão como cadáveres que Laki se cansava de evitar. Ao avistar Grimm ao longe, cortando o que parecia ser o último inimigo, gritou:

— Haru está preso naquela casa! — apontou na direção da mansão. — Precisamos ajudá-lo!

— Aquele imprudente… — resmungou o guerreiro, retirando o machado do peito de um goblin morto.

Quando notou um inimigo escapar da casa em direção ao sino do portão sul, Laki se lançou sobre ele antes que alcançasse a rota. O monstro guinchou de medo por algum motivo que ela não entendeu. Sem pensar duas vezes, a Dragoa Vermelha puxou uma faca do cinto e cortou-lhe a jugular em um movimento rápido.

Sem tempo para recuperar o fôlego, correu até a frente do casarão. Da soleira, bradou:

— Haru!

— Estou aqui, já vou! — respondeu ele, aliviando a ansiedade dela. A voz vinha da escada estreita à direita da varanda, próxima ao acesso para os quartos superiores.

Poucos instantes depois, Haru surgiu, e Laki soltou uma respiração leve. Ela notou um corpo monstruoso escada abaixo, engolido pela escuridão, mas não se deteve. Seus olhos permaneceram nele, até recuar alguns passos para a varanda. Foi então que Grimm gritou:

— Cuidado!

Laki virou o rosto a tempo de ver uma enorme pedra se aproximando. Haru se atirou sobre ela, derrubando-a no chão de terra batida e protegendo-a do impacto. Seus braços ficaram bem posicionados nas costas dela, amortecendo a queda.

O Dragão Branco gemeu com a dor dos braços, mas eram apenas contusões menores. Ao erguer o olhar, avistou o goblin-campeão caminhando em sua direção. Apoiado nas mãos sobre o corpo ainda atônito de Laki, perguntou:

— Você está bem?

— O quê? — a arqueira arregalou os olhos ao notar a criatura avançando. — Tente segurá-lo com Grimm! Vou buscar uma posição de apoio no alto!

Haru acenou com a cabeça, levantou-se e procurou o parceiro. Nesse momento de distração, o monstro esmagou uma pedra na mão esquerda e lançou os fragmentos contra eles. Grimm ergueu uma muralha de terra, protegendo-os.

Quando o ataque cessou, Haru puxou a espada da bainha e partiu para o combate, enquanto Laki escalava até o telhado de uma das casas.

O espadachim avançou e cortou o inimigo em um arco ascendente de 45º, atingindo-o acima da cintura. O ferimento foi superficial. O goblin retaliou com um golpe de tacape. Haru recuou em um salto, escapando por pouco, e retomou a guarda. Aproveitou a aterrissagem para se projetar novamente à frente, deslizando por entre as pernas do gigante antes que a clava girasse outra vez. Quando o monstro se virou, recebeu um chute giratório no rosto que o fez cambalear.

O espadachim tentou seguir o ataque, mas o corpo fora de forma o obrigou a recuar. Mantendo a guarda firme, respirou fundo.

“Mantenha a confiança, mesmo diante da adversidade.”

A voz de seu pai ecoou em sua mente, fazendo-o sorrir. Guardou a espada e puxou o punhal conquistado na missão, optando por uma arma mais rápida.

O goblin desferiu um soco descendente, mas atingiu apenas o chão. Haru desviou no último instante e cravou a lâmina abaixo da última costela esquerda da criatura. Arrastou o punhal, ampliando o corte, antes de recuar para evitar o cotovelo maciço que vinha em sua direção.

Grimm acompanhava a luta, estudando o momento certo para intervir. Viu que Haru já conseguira dois bons golpes, mas também percebeu o cansaço do parceiro. Então, quando o campeão ergueu o tacape, o rear se lançou e acertou uma joelhada próxima à mandíbula do inimigo. Ao cair, desferiu um soco envolto em terra endurecida, ampliando o impacto no mesmo ponto do corte de Haru.

— Já cansou? — provocou Grimm, vendo o monstro recuar com a mão no ferimento. — Ainda temos trabalho a fazer, Haru.

O espadachim passou como uma rajada ao lado do parceiro, punhal em punho invertido. A criatura mal tivera tempo de se recompor quando recebeu a lâmina cravada na junção do joelho. Uivou, tombando de dor. Grimm o atacou de frente, socando-lhe o rosto e, em seguida, erguendo uma coluna de pedra que o atingiu no peito.

Haru trocou a arma para a mão esquerda e, recordando a sensação de quando queimara um goblin no porão, concentrou mana na palma. Uma labareda se formou. Avançou pelo flanco direito e incendiou o corpo do inimigo. O urro de dor abriu a brecha para Grimm agarrar-lhe a cabeça e desferir joelhadas ascendentes seguidas. No estilo jishin, completou com outro bloco maciço de pedra, lançando a aberração para trás.

— Está se divertindo, imbecil? — ironizou Haru, apagando a chama com um giro da mão.

 

— Olha quem fala. — O guerreiro retirou o machado de duas lâminas das costas, ajeitando-o com cuidado nas mãos. — Vai girar essa faca contra ele?

A besta ajoelhava-se novamente, a poucos passos de distância de seus dois adversários. Sentia a pele queimar de um lado e o sangue escorrer do outro. Estavam a poucos metros do centro da vila. Os olhos bestiais permaneciam arregalados, incrédulos por estar sendo pressionado. Em sua mente, recordava um momento distante, quando dois aventureiros o haviam torturado. Num golpe de sorte, conseguira forças para matá-los, arrancando a cabeça de ambos com o tronco de uma árvore — a mesma arma que agora empunhava.

Laki se mantinha posicionada sobre o telhado de uma casa. Observava a luta com atenção, o arco preparado na horizontal. Haru e Grimm demonstravam a combinação perfeita entre precisão e força bruta, o suficiente para lhe dar uma breve sensação de tranquilidade. Ainda assim, um arrepio percorreu-lhe a espinha quando o vento trouxe nuvens carregadas.

Haru também sentiu o corpo arrepiar ao receber o toque gelado de uma gota de chuva no braço.

“Temos que acabar com isso logo... estou com um pressentimento ruim.” pensou, mesmo com os cotovelos doloridos e as pernas pesadas pelo cansaço. Ainda assim, avançou.

Grimm não protestou; apenas manteve a guarda, pronto para dar suporte. Haru já tinha o próximo movimento planejado: desviar e cravar o punhal no peito inimigo. Seria simples. Mas o destino escrevera aquele capítulo de outra maneira.

O Goblin-Campeão percebeu a aproximação e deixou a energia subir pela garganta. Quando viu Haru erguer o punhal, pisou no solo com brutalidade, fazendo o espadachim perder o equilíbrio. Ao tentar recuperar a postura, Haru escorregou em um pedaço de lama — milésimos de segundo que bastaram para enxergar o tacape vindo em sua direção.

O espadachim ergueu o braço direito junto à cabeça e saltou instintivamente, recebendo o impacto da arma. O golpe o lançou a alguns metros, fazendo-o rolar no chão e bater com a cabeça contra o muro de pedra de uma casa.

— Haru! — gritou Grimm, vendo a poeira e a lama se erguerem no impacto. Quando a cortina se dissipou, o recrutado já tentava se mover com dificuldade.

Flechas brotaram no braço direito do monstro, mas ele as arrancou como quem afasta moscas. Urrou, enfurecido, e avançou contra o Dragão Negro. A fúria obrigou Grimm a erguer um muro de proteção, que foi rapidamente despedaçado pelo ombro da criatura.

O rear respirou fundo e lançou uma labareda contra o corpo do monstro, mas teve de se atirar para o lado a fim de evitar ser atropelado. O Campeão previu o movimento e acertou-lhe um soco lateral, atingindo-lhe o peito e o estômago. O impacto fez Grimm recuar tossindo saliva.

O inimigo trocou a arma de mão e a ergueu verticalmente. Grimm contra-atacou, cravando o machado no mesmo corte aberto antes por Haru, mas não com força suficiente. O goblin avançou e tentou chutá-lo, sendo contido apenas por um bloco de lama conjurado às pressas.

A chuva engrossava, atrapalhando a visão de Laki. Algumas flechas erraram, outras acertaram de raspão, mas nada capaz de deter o Campeão. Grimm recuava, defendendo-se como podia com montes de lama moldados pela mana.

Haru abriu os olhos com esforço. Virou a cabeça à esquerda e, mesmo sentindo dores lancinantes, conseguiu enxergar Grimm em apuros. Apoiado no muro, levantou-se no auge do cansaço.

“Você destrói o que toca.”

A voz do capitão Kyle ecoou em sua mente, misturada à dor. Haru sacudiu a cabeça, e tudo ao redor lhe pareceu em câmera lenta sob a chuva. Um golpe derradeiro se armava: o tacape descia pela esquerda, pronto para esmagar a cabeça de Grimm.

“Não posso falhar.”

Nesse instante, uma corrente elétrica percorreu o corpo de Haru, da mente até as pernas. Em um passo, atravessou a distância em milésimos de segundo, chegando diante da arma de madeira. Para Grimm, parecia que um relâmpago havia despedaçado o tacape em centenas de lascas.

A luz brilhou como uma resposta dos Doze à vitória dos dragões. Laki suspirou fundo ao vê-lo desferir o golpe decisivo.

“O vento haverá de guiar sua mão aonde você não conseguir ver.”

A voz de Alice ressoou em sua mente, liberando a mana que permeava seu corpo. O ar moldou a trajetória da flecha.

“Quando você está obstinada, é incapaz de errar.”

O ensinamento da rainha guiou o disparo. Os olhos de Laki, translúcidos pela mana, já não distinguiam formas, mas ela sabia exatamente onde a seta atingiria. Para quem via de fora, parecia que o monstro simplesmente congelara.

Um trovão iluminou o céu no instante em que a flecha perfurou o olho do goblin, cuja cabeça se ergueu em um último e agônico urro.

O rugido final de Grimm se somou ao golpe de seu machado. A lâmina desceu em diagonal, cortando o pescoço da criatura e lançando seu corpo morto ao chão.

— Que Mors lhe reserve um lugar de sofrimento em seu julgamento. — murmurou o guerreiro.

Grimm suspirou de alívio. Haviam vencido. Mas o que fora aquele relâmpago? Seguiu o clarão com os olhos até ouvir tosses ao longe. A surpresa tomou-o ao ver Haru contorcendo-se no chão, sentindo cada fibra do corpo queimar. Sua visão embaçada captou apenas duas silhuetas diante dele e a chuva incessante. Segundos depois, o cansaço o dominou, e ele desmaiou.

 

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora