Carta da Alma Brasileira

Autor(a): Zeugma


Volume 1

Capítulo 5: Caça às Bestas

Ao vislumbrar tal apresentação mágica, seus olhos brilharam como uma criança inocente.

— Incrível! Isso é normal de onde você vem?!
 
— Sim, há muitos outros magos e feiticeiros na minha terra. Todos conseguem fazer coisas do tipo.
 
— Mas você não devia estar surpresa já que me invocou. Você não é uma conjuradora?
 
— Ér... na verdade não, nem sei como eu te invoquei. Foi tudo graças a esse livro — ou Grimório como ele se chama... pensei que você soubesse algo sobre isso.
 
Ele se aproximou e pegou o livro, foleando algumas páginas e analisando com cuidado. Parecia estar mais perdido do que a própria Ester.

— Não sei de nada sobre esse Grimório, mas seja lá quem for o responsável por isso é um mago dos bons.
 
— Roy, você sabe o que aconteceu com aquela ladina — Evellynn, como havia dito — depois que eu desmaiei?
 
— Na verdade, aconteceu algo estranho. Não sei explicar direito, mas é como se houvesse duas delas ao mesmo tempo dentro deste hospital. Enquanto eu e ela lutávamos ouvi seu grito, porém, fui golpeado num momento de descuido. 
—  A luta prosseguiu sem que eu pudesse sair de lá, mas em um momento ela simplesmente resolveu fugir para dentro de uma parede sem motivos aparentes. Quando fui na direção do grito, vi você caída no chão à beira da morte sem mais ninguém por perto. Foi isso que aconteceu.
 
— Isso é estranho..., mas, independentemente do motivo dela, pelo menos estamos ambos vivos.

— Por enquanto sim...
 
— Você pode me contar mais histórias do seu mundo? 

— Claro.

Assim, passaram-se horas de conversa. Ester sorria como nunca, era como se Roy estivesse contando histórias de livros de fantasia. Um mundo que Ester sempre sonhou, seria ele realmente possível? Ela forçava-se a acreditar que sim. Papo vai, papo vem, até que Ester resolve perguntar algo que tem deixado seus nervos agitados. 

"Antigo Arque-Mago? Antigo..." Ingadou-se

— Roy, você disse que era o antigo Arque-Mago de Ysgirr certo? Me fale mais sobre você!

A atmosfera mudou subitamente. O clima agradável de repente virou de ponta cabeça. Roy, mesmo tentando suprimir fez os arredores tremerem com uma fúria melancólica. Até mesmo os Deuses sentiriam calafrios na espinha!

— Prefiro não falar sobre.

— T-tudo bem então...
 
"Melhor eu não tocar mais no assunto, ele ficou putasso!"
 
De uma forma estranha Roy começou a encarar Ester, olhando-a de cima para baixo. Assustador... parecia estar analisando-a, tentando lembrar de algo talvez?
 
— Ester
 
— Sim?
 
— Por acaso voc-
 
Boom!
 
Algo interrompeu sua fala. A mão de Ester que contém a tatuagem ficou trêmula de repente e começou a arder enquanto emanava um leve brilho azulado. Antes que percebessem seu Grimório estava pairando no ar, aberto e a folear páginas sozinho.

Letras começaram a brilhar em dourado de dentro do Grimório, aleatórias a princípio, porém de pouco a pouco começaram a soltar-se do livro e a flutuar pelo quarto, formando palavras.

[Tempo para o início dos jogos - 00:01 Minuto(s) restante(s)

Tempo para o início dos jogos - 00:00 Minuto(s) restante(s)

Prazo para o início dos jogos concluído, iniciando...]

Houve uma pausa.

[Prezados jogadores, sejam muito bem-vindos ao Carta da Alma! 

Seu objetivo é simples, sobreviver 

O último jogador vivo terá qualquer desejo realizado! 

Haverá eventos aleatórios periodicamente para estimular seus resultados, então surpreendam-me!]
 

[O primeiro evento é... " Caça as Bestas! "]

[Informações complementares serão concedidas após o teleporte dos jogadores]

[Agora concederemos suas classes iniciais. Sua classe será baseada na personalidade analisada no período de testes do jogador] 

[Concedendo classes em 3,2,1...]
 

— O que?!
 

O brilho que antes era sereno agora toma conta da sala como se fosse uma lâmpada forte. Junto do brilho que aumentou a dor da ardência também. Ela não pôde conter seus grunhidos de dor.
 

— O que tá acontecendo comigo?!
 

[Classes concedidas]
 

Após um pavor temporário ela percebe que a dor e a luz incessante teve seu fim.

Inconscientemente seus olhos são levados para a antiga fonte de dor e do mistério — sua mão que direita.
Algo estava diferente... Antes sua tatuagem era somente a junção de diversos símbolos de cartas de baralho, agora o mesmo símbolo ganhou algo que se assemelha a duas asas de anjo ao seu redor.
   

[Classe atual Anjo 

Informações:
Benção: Aumenta os atributos de sua invocação. Quanto maior a afinidade, maiores os atributos]
   

[Teleportando jogadores para o mapa selecionado em 3,2,1...]
 

[Iniciando Teleporte...]
  

Antes de conseguir soltar qualquer suspiro de surpresa uma forte luz toma conta da sala em que estava fazendo seus olhos fecharem involuntariamente. Ester estava atordoada com o ocorrido, porém, mesmo de olhos fechados ela sentiu algo anormal em todo seu corpo.
 
Era um misto de sentimentos contraditórios. Sentia uma brisa extremamente agradável banhando sua pele por inteiro, levantando seus cabelos e adentrando seus pulmões. Era o ar mais limpo que ela já inspirou em sua vida, como se estivesse no próprio paraíso.  
 
Em contrapartida, sentiu um calafrio por toda sua espinha, arrepiando até onde ela não sabia que era possível. Parecia um gato assustado com alguma coisa.  
 
Enfim, junto ao cantarolar dos pássaros, Ester abre seus olhos. "Algodão doce?" Esse foi seu primeiro e instintivo pensamento, porém, observando com cuidado percebeu que não eram algodões doces que a rodeavam, e sim nuvens.
 
 

Sob seus pés estavam um tipo de concreto branco que já passou por inúmeras tempestades e bicadas de pombos. Agora ela percebeu onde estava: acima do Cristo Redentor! 

  

Guahhhhhh!!! O que tá rolando?! Como eu parei aqui!!! — Gritava apavorada 

  

— Acalme-se. Aparentemente fomos teleportados por magia. — Era Roy, que estava incrivelmente calmo.
   

— Acalme-se o cacete! Me tira daqui!! 

 

— Por acaso você tem medo de altura? 

  

— Não importa! Vamos descer de uma vez! 

  

"Incrível, ela já enfrentou seres abomináveis sem hesitar, mas essa altura é o suficiente para colocá-la nesse estado" — Pensou Roy 

  

Enquanto os gritos de Ester ecoavam pelos céus, em certo momento ambos perceberam que as letras douradas continuavam a fugir do Grimório e a formar palavras nos céus. 

  

[Jogadores teleportados com êxito] 

[Mapa selecionado: Rio de Janeiro, Brasil 

Informações complementares serão concedidas a seguir:

Evento iniciado: Caça às Bestas 

Objetivo: Mobs hostis foram espalhados pelo mapa selecionado em áreas específicas. Entre no segundo plano e derrote-os antes do tempo limite 

Falha: Liberação dos Mobs para o plano terrestre 

Extra: O Jogador que eliminar o maior número de Mobs receberá uma recompensa secreta 

Tempo restante: 6 dias, 23 horas e 59 minutos] 

  

[Fim das informações 

Boa sorte jogadores, que o show comece! — GM] 

  

Sua respiração ficou descontrolada em um instante. Mesmo rodeada por oxigênio, sentiu falta de ar — irônico! As informações extensas e o seu pavor de altura foram muito para sua mente despreparada, fazendo-a hiperventilar. 

  

"Eu enlouqueci de vez! Só pode ser isso... isso não é real, não é real, não é..." 

  

Ester!  

  

Foi um simples chamado de seu nome, porém aquela voz e aquele olhar foram tão profundos que pareciam ter penetrado todo seu interior num instante. Seus olhos encontraram-se e o silêncio predominou. Era como se o tempo tivesse desacelerado por alguns instantes. 

  

— Obrigada, estou melhor agora. 

  

— Vamos dar um jeito de descer. — Respondeu Roy 

  

Ambos começaram a averiguar os arredores com cuidado, afinal uma queda dessa altura seria meio problemática! Ao lado da cabeça do cristo redentor finalmente encontraram algo que os pudesse ajudar — uma espécie de alçapão.
 
 

Como era pesado! Ester o puxou com força o suficiente para suas veias saltarem dos braços. Abrindo o bendito revelou-se uma passagem recheada de escadas dentro do monumento.  
Parecia não haver fim, a visão chegava a ficar turva no que se assemelhava o fim da escadaria. A escuridão não ajudava, aparentemente o lugar não tinha mais iluminação a muito tempo.
 

Quando colocou seu pé sobre o primeiro apoio, Roy percebeu com clareza as mãos de Ester que tremiam sem parar ao encostar na escada.  

  

— Não olhe para baixo, foque apenas em respirar.
 

O-Ok — Respondeu com uma voz trêmula

Os dois começaram a descer até o solo, no caminho observando diversas construções de madeira apoiadas na estrutura. Pareciam ter sido utilizadas para a construção e reparos do Cristo Redentor. A descida foi longa e cansativa, seus braços e pernas já não aguentavam mais, até que enfim chegaram ao fim. 

  

Sem se conter um suspiro fugiu da boca de Ester. 

  

Ufa! Parecia que não ia terminar nunca 

 

— Essa estrutura que vocês sem magia criaram é impressionante.  — Disse Roy 

  

— Compensamos a falta de poderes desse tipo com inteligência. — Respondeu Ester, sorrindo 

  

— Depois quero que você me ensine mais sobre vocês, por favor. — Continuou Roy 

  

— Claro! 

  

O ambiente que estavam agora era um pouco mais iluminado por lâmpadas fracas nas paredes, revelando algo que parecia uma sala de ferramentas, muito provavelmente para reparar a estrutura. Vozes abafadas de uma multidão eram escutadas pela única porta presente no recinto. 

  

Ester toma a frente e tenta abrir a porta, contudo ela está trancada.  

  

— Droga! Depois de tanto esforço pra descer. 

  

— Eu resolvo. — Afirmou Roy 

  

Roy põe a mão sobre a porta delicadamente enquanto Ester o observa curiosa. 

  

Booooom!!! 

  

Uma grande explosão levanta uma poeira negra e faz voar a porta pelo ar. 

  

— Pronto. — Diz Roy dando um joinha 

  

— Cê tá de sacanagem pô?! Não precisa sair explodindo tudo! 

  

Em meio a muitos gritos e o barulho dos destroços caindo um som de destaca — passos fortes indo em sua direção.  

  

— Quem está ai?! Saia com as mãos pra cima! — eram gritos de homens que se aproximavam rapidamente  

  

— Droga, devem ser os seguranças. Precisamos nos esconder! 

  

Ester procurou desesperada em todos os cantos daquela minúscula sala algum lugar que pudesse servir de esconderijo, porém obviamente não havia um lugar assim. De repente ela sente um puxão forte em sua cintura, era Roy. Ele puxou Ester, que o abraçou instintivamente. Os dois estavam colados um no outro, com Roy segurando suas costas e cabeça. 

  

"Que cheiro bom..." — Ester pensou. 

  

Seu nariz e bochechas ficaram vermelhos como nunca, seus batimentos aceleraram e ressoavam mais alto do que os passos que se aproximavam. Ela sem perceber acabou fechando seus olhos e apertando Roy com suas mãos.  

  

"Droga! O que estou pensando na situação que estamos?! Sua idiota!!" 

  

— Ei! Qual é a tua?! — Gritou emburrada  

  

— Faça silêncio. — Respondeu Roy 

  

Antes do que previam diversos homens entraram na pequena salinha, todos armados com Beretta. Gritavam alto e miravam em todos os cantos procurando qualquer coisa que se movia, mas, incrivelmente pareciam não estar enxergando os dois bem no meio da sala. 

  

— Senhor, parece que não tem ninguém. — disse um dos guardas 

  

— Vamos voltar e relatar aos nossos superiores. Eles vão conduzir uma investigação melhor.  

  

Assim, todos eles se retiraram do lugar. Agora que a poeira baixou e a confusão diminuiu, Ester percebeu algo estranho na sala — havia uma névoa estranha cobrindo todo o lugar.  

  

— Como eles não nos viram? 

  

— Magia. 

  

— Que daora!! 

  

— Você já pode me soltar agora. 

  

Ah, desculpa! 

  

Os dois se soltaram, e olha do em volta Ester percebeu que a névoa desapareceu. O caminho agora está aberto. Os dois saem da sala e são imediatamente bombardeados pelos raios solares, cerrando seus olhos. Ao abri-los, uma vista maravilhosa banhou seus olhos, tal como um quadro pintado pelo melhor artista.
 

O mar refletia o dourado do sol como um espelho, misturando-se no azul do céu e do próprio mar, fazendo um misto de cores que parecia uma aquarela. Os morros verdes da vegetação mexiam com o vento como se estivessem vivos.
 
 
As favelas tomavam conta de quase toda área visível com a sua beleza única e exclusiva, vista apenas no Brasil. Era como se Deus tivesse pintado um quadro e assinado no canto com o nome de sua obra — Rio de Janeiro. 



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