Volume 1
Capitulo 5: Moradia do Dragão
Seth passou a noite inteira perdido em pensamentos até finalmente adormecer. Não sonhou com nada e acordou antes mesmo do despertador, levantou-se devagar e foi se arrumar para a escola. No banheiro, ao lavar o rosto, encarou o próprio reflexo no espelho. Seu olhar continuava vazio, distante. A única coisa que lhe veio à mente foi:
"Eu não posso deixar ninguém me ver assim."
Seth passou alguns minutos diante do espelho, tentando recuperar o sorriso de sempre. Forçou a expressão, apagou, tentou de novo, até que, depois de muito esforço, conseguiu se convencer. Então terminou de se arrumar e saiu do quarto.
O corredor estava silencioso demais. Cada passo que dava fazia um leve ranger, o som ecoando pelo corredor. Por um instante, teve a sensação de que aquele silêncio pesava. Ignorando isso, parou diante da porta da irmã, bateu de leve.
— Laly, tá acordada?
Não obteve resposta. Tentou outra vez, um pouco mais forte, mas só ouviu o som ecoando no corredor em resposta. Suspirou, desistindo, e continuou andando até a sala com aquela sensação de incômodo o acompanhando até o fim.
Porém, essa sensação se quebrou ao chegar na sala, pois lá estava Laly, deitada no sofá, já vestida, mexendo no celular como se estivesse ali há muito tempo.
— Já tá aqui? — perguntou, surpreso.
— É… nem consegui dormir, pra falar a real.
— Por causa das coisas de ontem?
— Mais ou menos. — Laly sorriu, cansada mas animada. — É que eu tô empolgada. Fiquei a noite toda pensando no que vou conseguir fazer com os meus poderes.
— Entendi… Enfim, vamo sair mais cedo hoje?
— Bora!
Quando saíram, a rua estava quase deserta, coberta por nuvens cinzentas, e o vento frio cortava o silêncio da manhã. Eles caminhavam lado a lado, os passos ecoando, até que Seth desviou o olhar para a irmã. Ela sorria, mas também, estava com olheiras fundas, o cansaço evidente em seus olhos. Esse contraste o incomodou, mas para quebrar esse silêncio, falou:
— Laly… Por que cê tava tão nervosa ontem se não acreditava? Mas, mesmo assim, aceitou tão rápido o que o Green falou?
Ela demorou um instante antes de responder.
— Olha… eu não queria acreditar em nada do que você contou. Mas… não tinha como negar os sonhos.
Seth franziu a testa.
— Os sonhos?
— É. — Ela assentiu, desviando o olhar. — Eu também tava tendo. Sempre com uma mulher de cabelo vermelho.
— O quê? Por que não me falou antes!?
— Porque eu não queria acreditar, ué… E sonhar com a mesma pessoa que você… deixou isso mais difícil.
— Entendi… Mas outra pergunta: você não tem medo de que nossa raça encontre a gente?
Laly parou. Seth percebeu e também parou ficando quieto, observando-a. Depois ela respirou fundo e respondeu:
— Tenho medo, sim. Mas não exatamente deles nos acharem.
— Então tem medo do que?
Ela caminhou até ficar à frente dele, apoiou sua mão no quadril e falou com firmeza:
— Tenho medo de que machuquem você ou o Green. Vocês são a única família que eu tenho e eu não vou deixar ninguém tirar isso de mim. Por isso preciso ficar mais forte pra proteger vocês.
Sem dizer mais nada, ela seguiu o caminho para a escola, já ele ficou parado por alguns segundos, observando-a se afastar.
"Ela parece bem mais decidida do que quer depois de ontem… Então por que eu…?" Ele fechou os olhos e balançou a cabeça. "Não! Não posso pensar nisso agora."
Ignorando os próprios pensamentos, ele voltou a acompanhar Laly até a escola. O dia correu sem incidentes, aulas, conversas triviais, nada fora do comum. Para qualquer um, parecia apenas mais uma manhã comum, mas para ele, a normalidade soava quase falsa, sufocante em comparação ao caos do dia anterior.
Ao chegar no intervalo, Laly ficou com seus colegas, enquanto Seth procurava por Mirror em cada canto da escola. Não a encontrou, mas percebeu uma das amigas dela sentada sozinha, desenhando no caderno. Reconheceu-a de ontem, quando ajudou a arrumar o salão, e decidiu se aproximar.
— Oi… — chamou ele.
A garota levantou os olhos do desenho e sorriu.
— Ah, oi! Você é o Seth, né? Também tava ajudando a Mirror.
— Isso. — Ele assentiu. — Preciso falar com ela, é importante. Você sabe onde ela tá?
— Então… ela faltou hoje. Nem respondeu mensagem, o que é estranho. Quando não vinha, pelo menos avisava antes.
— Estranho mesmo…
— Pois é. E justo no dia em que eu precisava devolver o colar dela.
Seth franziu a testa.
— Colar?
— É. Ele tava muito danificado, mas ela não queria entregar de jeito nenhum, falou que era algo muito importante. Mas eu insisti, porque meu pai é dono de uma joalheria. Ele consertou pra mim e agora só queria devolver logo. Mas não sei se vou ter tempo de ir na casa dela depois da escola.
— Ah… Bom, se quiser, eu posso levar pra ela. Não tenho nada pra fazer depois da aula.
— Sério?
— Claro. Só preciso do endereço dela.
A garota hesitou.
— Vocês são amigos, né?
— É… sim! — respondeu Seth rápidamente.
Ela riu de leve.
— Tá bom. É difícil ela passar o endereço, mas já que é só pra devolver o colar… não deve ter problema. Só não fala que fui eu, por favor. Aquela garota brava é um dragão!
Ele riu sem graça, pensando em como ela estava mais certa do que imaginava. A amiga puxou um bloquinho do bolso, anotou o endereço e entregou junto com o colar, que ele pegou sem nem prestar atenção de primeiro momento.
— Aqui ó.
— Valeu! Vou passar lá assim que acabar a aula.
— Eu que agradeço. Ah, meu nome é Camila, caso precise.
— Obrigado, Camila.
Eles se despediram, e o resto do dia seguiu sem novidades. A única coisa que Seth não conseguia, era afastar o incômodo constante dentro de si.
Um pouco antes do sinal tocar, o professor já havia encerrado a aula, deixando os alunos livres na sala. Seth foi até sua irmã, que estava guardando suas coisas.
— Ei!
— Hm? O que foi? Conseguiu falar com a Mirror?
— Não… ela faltou hoje.
— Ah. Então fala com ela outro dia.
— Então… é sobre isso que eu vim falar.
— Como assim?
— Então… meio que falei com uma amiga da Mirror… que tava com o colar da Mirror… aí ela me deu o endereço da Mirror… e eu me ofereci pra devolver o colar. — Seth respirou fundo, tentando rir. — Resumindo: vou ter que ir na casa dela.
Laly travou no mesmo instante, depois se levantou e puxou o irmão pelo braço, falando baixo:
— Você tá maluco!? Vai na casa da garota que tentou te matar!?
— Eu já te falei, Laly! Ela não é ruim, só me atacou porque…
— Porquê o quê? — cortou Laly. — Por uma suposição? Sem prova nenhuma? E ainda nem explicou direito depois!?
— Ei, calma… confia em mim. Eu sei o que tô fazendo.
— Se algo acontecer com você, eu juro que…
— Eu vou ficar bem, relaxa!
Laly bufou, derrotada:
— Tá bom…
Então o sinal tocou, e o lado de fora se encheu de vozes. O sol da tarde dourava a rua, brilhante, chegando a ser reconfortante.
Seth e Laly ficaram parados quietos por alguns segundos, até que Laly olhou para o irmão e disse:
— Hoje o dia parece que até tem mais cor, né?
— Parece?
— Sim! Não tá vendo? Tá deixando até o ambiente mais vivo.
— Ah…
— Mas enfim, Seth… você tem certeza do que tá fazendo?
— Tenho! Já falei.
— Tudo bem então… vou confiar em você.
— Certo.
— Tchau, até mais tarde. — Laly se despediu, seguindo seu caminho e deixando o irmão para trás.
Seth ficou parado por alguns instantes, observando o brilho dourado que tomava a rua.
"Ela disse que o ambiente tá mais vivo… Mas por que parece o oposto? Por que aquela sensação tá mais forte?"
Então, Seth pegou o papel de seu bolso, vendo o endereço:
Rua das Acácias, nº 117 — Bairro Aurora
— É um pouco longe, mas não vai demorar tanto… — Seth guardou o papel e pegou o colar, vendo como ele era, sendo um dos mais bonitos que ele já havia visto.
Uma corrente fina e dourada, delicada, que refletia a luz do sol. No centro, pendia um coração de tom vermelho carmesim, feito de um material que parecia cristal ou pedra lapidada, intenso demais para ser apenas vidro.
Seth guardou o colar com cuidado no bolso e respirou fundo antes de sair da escola.
Alguns minutos depois, já estava em seu bairro. As ruas eram tranquilas, com casas simples cercadas por árvores que balançavam com o vento, o ambiente era leve, transmitindo uma forte sensação de calma. Mas, conforme se aproximava da rua de Mirror, essa sensação começou a se desfazer. O ar estava mais denso, e a cada passo o ambiente ficava mais pesado
Ao chegar em frente à casa de Mirror, Seth tocou a campainha ao lado do portão. Esperou alguns minutos, mas nada. Tocou de novo, mas não obteve resposta. Tentou mais uma vez, mas continuava sem resposta.
Encostou no portão, e para sua surpresa, ele se abriu sem resistência, estava destrancado. Um arrepio percorreu sua espinha.
"Ela é cuidadosa demais pra esquecer o portão aberto… Será que eu entro…?"
Seth tentou se convencer a não entrar, mas a inquietação falava mais alto. Empurrou o portão devagar e entrou no quintal.
O lugar parecia normal à primeira vista, mas cada passo até a porta deixava o ar mais sufocante, como se algo o observasse. Seu coração acelerou, e a sensação de que estava invadindo mais do que um espaço físico só aumentava.
Seth se aproximou da porta e bateu. Silêncio. Repetiu, mas nada. Foi então que percebeu: a porta estava apenas encostada. Com um leve empurrão, ela rangeu e abriu.
O coração dele acelerou, a preocupação falava mais alto. Então respirou fundo e entrou.
A sala e a cozinha estavam mergulhadas na escuridão, as cortinas fechadas, abafando até a luz do fim da tarde. O silêncio era tão desconfortável que parecia gritar nos ouvidos.
Ele fechou a porta atrás de si e chamou, a voz quase engolida pelo vazio:
— Mirror? Tá aqui…?
Nenhuma resposta.
Ele caminhou até a mesa em frente ao sofá. Ao lado, notou o corredor estreito, com uma porta no meio. Sentiu vontade de investigar, mas se conteve. Apenas deixou o colar sobre a mesa.
Assim que deixou o colar sobre a mesa, um ruído seco ecoou pelo corredor.
Seth prendeu a respiração. Parecia algo caindo no chão, depois outro baque, como se alguém tivesse tropeçado. Seu primeiro pensamento foi que Mirror pudesse estar passando mal.
Deu alguns passos hesitantes até o corredor, notando que o som vinha do quarto do meio. Quando estendeu a mão para a maçaneta, a porta se escancarou de repente.
Mirror saltou para fora como uma sombra, os dedos unidos em forma de lâmina, mirando direto nele. Ele se jogou para o lado, desviando por pouco, mas ainda assim sentiu o corte arder em seu rosto. O golpe passou reto, e as unhas dela rasgaram a parede em sua frente, deixando um buraco.
Virando lentamente a cabeça, os olhos de Mirror encontraram os dele. E, com um tom baixo e carregado por desconfiança e raiva, ela murmurou:
— O que você tá fazendo na minha casa… Aeternis?
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