Volume 6

Capítulo 326: Rynford e o Reino de Bashar

"Se você não se importa que eu pergunte, o que Rynford estava tentando fazer?"

— Ufufu, já que estou de bom humor, vou te explicar!

Murellia começou a falar, claramente de bom humor. Verifiquei Fran, mas a situação dela não mudou muito. Provavelmente teria tempo para conversar com ela por alguns minutos.

— O início desta história pode ser marcado como o momento em que Rynford chegou a esse local. Ao que tudo indica, aquele velhote de merda sabia que havia um fragmento do Deus Maligno selado neste país.

"O quê? Isso é verdade?"

— Nn. É o mesmo fragmento que usei na minha tribo. Rynford pretendia usar esse pedaço para se comunicar com o Deus Maligno.

Embora, é claro, ele não tenha encontrado. Os deuses provavelmente o selaram ainda mais do que antes, depois que Murellia conseguiu o que queria com o item. Mas isso não significava que Rynford desistiria. Uma nação conhecida como Reino de Bashar, que ocupava a área adjacente ao Império dos Homens-Fera, estava sendo esmagada.

— Rynford foi incapaz de encontrar o fragmento do Deus Maligno, porém, ele encontrou outra coisa.

"Outra coisa?"

— Sim. Ele encontrou um novo calabouço que havia aparecido no lado do Reino de Bashar, nas Montanhas Divisórias.

Rynford e seus subordinados foram capazes de conquistar essa dungeon recém-formada.

— Ao chegarem nas câmaras do mestre, eles ameaçaram o Mestre do Calabouço e o forçaram a obedecê-los. O objetivo de fazer isso era usar o poder mágico acumulado pelo calabouço.

Mesmo que esse calabouço fosse um recém-nascido, ainda era uma dungeon e, portanto, tinha uma quantidade razoável de poder mágico acumulado dentro dela. Usando essa energia para seus próprios fins, ele usou o poder dentro do calabouço para iniciar um ritual, um certo ritual de invocação.

Havia uma certa técnica de invocação conhecida como Invocação de Herói que invocava heróis do passado e os vinculava às ordens do invocador por um determinado período de tempo. Até coisas como espíritos malignos e seres perversos poderiam ser invocados por meio dessa técnica, pois, aparentemente, até os seguidores do Deus Maligno eram contados como seguidores de um ser divino.

— Durante esse ritual, aquela a ser invocada fui eu. No entanto, meu corpo estava incompleto.

Parecia que durante essa invocação, apenas um fragmento da consciência de Murellia foi trazido, pois Rynford não acreditava que tinha a capacidade de controlar uma Murellia completa.

Através das informações extrapoladas da Murellia invocada, Rynford conseguiu localizar o selo que prendia o fragmento do Deus Maligno. Mesmo assim, ele foi incapaz de quebrá-lo. Embora eu não tivesse certeza de como ele pensou que poderia desfazer um selo divino.

— Porém, Rynford era terrivelmente teimoso.

Então, Rynford teve uma ideia. Ao sacrificar uma quantidade enorme de almas em nome do Deus Maligno, ele seria capaz de dar a divindade poder suficiente para enfraquecer um pouco o selo. Ao fazer isso, o Deus Maligno poderia reunir forças suficientes para falar com Rynford usando Murellia como meio, pois ela era tecnicamente uma sacerdotisa do Deus.

"... então essa é a razão para a guerra."

— Sim. A guerra é de longe a maneira mais rápida de reunir uma quantidade significativa de almas.

De forma conveniente, o Reino dos Homens-Fera, onde o fragmento do Deus Maligno estava escondido, e seu vizinho, o Reino de Bashar, estavam no meio de um confronto. Além disso, quando Rynford examinou a política do Reino, descobriu que, embora o Rei Bashar fosse um moderado de mente aberta, nos bastidores, ele era um membro do grupo exclusionista1 de homens-fera. Ele contatou os chefes políticos do Reino e estabeleceu cooperação com eles.

— Ao contrário do que você pode pensar, muito pessoas estão mais dispostas a trabalhar com Seres Malignos do que com homens-fera. Porém, se você pensar na história entre os dois países, isso é algo óbvio.

Não importava o que sentissem em seus corações, o grupo de Rynford e o Reino de Bashar se uniram e deram as mãos.

— Um ataque de pinça usando as forças unidas de todo o Reino de Bashar e as forças do calabouço descoberto por Rynford. Esse era o plano.

Se o que Murellia estava dizendo era verdade, essa guerra estava sendo preparada há anos. Ao que parecia, a razão pela qual o Reino de Bashar decidiu pegar carona no plano de Rynford foi porque eles não eram uma ameaça real ao País dos Homens-Fera

A única razão pela qual o Rei decidiu adotar uma política moderada em vez de agressiva, apesar de fazer parte do grupo exclusionista, era porque seu poder militar era muito menor, onde até uma escaramuça2 poderia levar a queda do reino. Em seu interior, o povo do Reino de Bashar se sentiu reprimido e as sementes do movimento anti-homens-fera estavam florescendo há muito tempo.

— Bem, eu com certeza odeio as outras tribos de homens-fera, mas essa supremacia humana foi longe demais. Tornou-se uma situação um pouco embaraçosa para mim.

Assim sendo, a possibilidade de enfim arrasar a Nação dos Homens-Fera encantou os nobres do Reino de Bashar. Depois de muitos anos, seu desejo se tornaria realidade.

— Foi também nessa época que Rynford me invocou por completo, usando a energia restante na dungeon e nas almas dos escravos fornecidos pelo Reino de Bashar.

Embora fosse verdade que Rynford normalmente não seria capaz de controlar o vasto poder de Murellia, uma invocação completa que foi alimentada com o sacrifício de centenas de almas permitiu ao velho feiticeiro a capacidade de controlá-la até certo ponto. Mesmo que o poder de Murellia não fosse tão perfeito quanto antes, era o suficiente, e ela ainda era poderosíssima.

Já que o poder do calabouço também foi usado para invocar Murellia, a porcentagem de controle que não era oferecida a ela pela alma sacrificada foi alcançada ao vinculá-la como submestra do calabouço. Por mais forte que Murellia fosse, ela não conseguiria escapar do contrato da dungeon que foi selado pela Deusa do Caos.

Nesse caso, Senhorita Deusa do Caos, por favor, desça e castigue essa garota de novo...

Assim desejei, mas duvidava que isso pudesse ser feito. Em primeiro lugar, o castigo dos deuses foi imposto, e os Gatos-Negros que foram corrompidos pelo poder do Deus Maligno foram destruídos, incluindo Murellia. E agora, ela estava vinculada a um contrato de submestra do calabouço pela Deusa do Caos. Não era como se todos os seres malignos estivessem sujeitos a serem destruídos pelos deuses, se fosse esse o caso, Rumina não teria sido capaz de gerar Seres Malignos como Goblins e outros de seus subordinados. Parecia improvável que os deuses descessem e matassem Murellia mais uma vez.

— E como sou uma submestra do calabouço, sou incapaz de me opor a Rynford OU ao verdadeiro mestre do calabouço.

Ó? Pelo visto, ela tinha que obedecer não apenas a Rynford, mas também ao mestre do calabouço? Embora eu duvidasse que ele tivesse mais controle do que o feiticeiro maligno. No entanto, isso também permitiu que Murellia usasse o poder da dungeon para criar seu paraíso para os Gatos-Negros.

— É incrivelmente frustrante, mas com o poder do calabouço, posso criar o sonho que ansiava.

E, assim, Murellia cooperou de forma relutante, com uma enorme quantidade de ódio por Rynford. E esse era todo o plano do velhote maligno. Em suma: começar uma guerra, coletar almas, sacrificá-las ao Deus Maligno. Com isso, ele seria capaz de entrar em contato e receber as bênçãos do Deus Maligno, um tanto fortalecido, através de Murellia.

No entanto, o poder do calabouço foi basicamente gasto usando a energia para invocar Murellia. O estágio seguinte foi estender o alcance da dungeon para incluir parte do País dos Homens-Fera e recuperar a força que foi gasta na invocação.

Parecia que invocar monstros e controlá-los fora do calabouço consumia pontos. Porém, se você não precisasse especificar, poderia configurar para que um círculo mágico invocasse um monstro aleatório em intervalos regulares.

Conseguir isso era tão simples quanto matar centenas de escravos do Reino de Bashar enquanto eles estavam dentro da dungeon e absorver seu poder. O mestre do calabouço era um jovem bandido que não estava disposto a se opor a Rynford ou ao Reino de Bashar, e seguiu essa estratégia à risca.

O feiticeiro continuou a pesquisar uma maneira de enfraquecer o selo do fragmento do Deus Maligno, deixando Murellia gerenciar o progresso da guerra enquanto viajava para cumprir seu objetivo.

E o resto, nós já sabemos. Enquanto Rynford conduzia sua pesquisa em Barbola, Fran e eu acabamos por destruí-lo3. Era possível que ele nem quisesse manter os Seres Malignos que ele criou em Barbola por tanto tempo quanto ele desejara, e eventualmente queria transferi-los para o País dos Homens-Fera como forças para a guerra? Se ele tivesse feito isso, as coisas ficariam insanas, essa guerra teria sido muito pior.

— Kufufufu, pensei que poderia ter sido possível por causa de quão fraca era aquela lesma, mas ele realmente conseguiu ser morto! Hahahaha!

Embora eu estivesse feliz por termos derrotado Rynford, isso me dava sentimentos complicados por agradar essa mulher...

Mesmo antes da morte do feiticeiro, o mestre do calabouço raramente dava ordens a Murellia, e agora que Rynford estava morto, e seu poder sobre ela se fora, parecia que ela podia se mover com liberdade!

 — A limitação daquela pilha de esterco foi retirada. Seu poder sobre aquela dungeon amaldiçoada se foi. E em breve, até o domínio da Deusa do Caos será eliminado!


Notas

[1] Exclusionismo é o princípio, política ou prática de excluir certos grupos a partir de direitos ou privilégios.

[2] Escaramuça é um rápido encontro entre os elementos avançados de dois exércitos.

[3] Rynford foi morto no capítulo 131.



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