Volume 1

Capítulo 6: Razão Para Respeitar

Parte 1
 

Desde que cheguei a este mundo, não saí de casa. Estou consciente desse fato e com medo também. Se sair do pátio e ver a paisagem do lado de fora, minhas lembranças vão despertar. As memórias daquele dia. A dor no lado do meu estômago. O frio penetrante da chuva. Arrependimento, desespero, a dor de ser atropelado pelo caminhão. Todas essas memórias voltarão para mim, como se tivessem acabado de acontecer ontem.

Minhas pernas tremem. Posso olhar para fora da janela ou caminhar até o pátio, porém não posso dar outro passo, pois sei que essa paisagem pacífica dos campos pode se transformar em um inferno. Os locais aparentemente pacíficos são incapazes de me aceitar.

Em minha vida passada, tive inúmeros delírios quando não conseguia dormir. E se o Japão de repente entrasse em guerra? E se uma bishoujo aparecesse de repente e se tornasse minha vizinha? Caso algo do tipo acontecesse, com certeza seria capaz de trabalhar duro.

Continuei me iludindo para escapar da realidade e sonhei com isso inúmeras vezes. No sonho, não era um super-homem e ainda possuía o mesmo nível de uma pessoa mediana. E como uma pessoa comum, seria capaz de fazer o que meus limites me permitiam fazer: viver confiando em mim mesmo. No entanto, acordarei desse sonho. Se der um passo para fora desta casa, posso acordar. E, quando isso acontecer, voltarei a esse momento de desespero.

Naquele instante, quando me afoguei em arrependimentos.

“Não, não é só um sonho. Como pode haver um tão realista assim? Me diga que é um VRMMORPG, ainda posso até aceitá-lo.”

A realidade.

Continuo me convencendo.

Essa realidade não é um sonho. Mesmo que entenda que é um fato, não posso dar um passo para fora, independente de quanto esforço coloque no meu coração. Jurei viver com plenitude, mas meu corpo é incapaz de acompanhar.

Eu quero chorar.

 
Parte 2
 

Quando Roxy falou que o teste de graduação deveria ser realizado fora da vila, soltei um fraco gemido em oposição.

— Fora da vila? Não pode ser feito em casa?

— Não. Os cavalos já foram preparados.

— Por quê...?

Estou perdido.

Meu coração sabe disso; preciso dar um passo fora dos portões de casa. Como posso ser um hikikomori aqui? Mas meu corpo está se recusando, ainda lembrando daquele evento passado — quando fui espancado por delinquentes, cruelmente ridicularizado e, por fim, meu coração foi-se a migalhas. Aquele fatídico dia em que não tive escolha senão me trancar dentro de casa.

— Algo errado?

— Não. É que… pode haver alguma criatura mágica lá fora.

— Por aqui é quase impossível encontrar criaturas mágicas se você não se aproximar das florestas. Além do que, mesmo que nos deparemos com alguma, posso lidar com isso sozinha já que elas são fracas. Mesmo você pode — disse, usando uma expressão de surpresa quando continuo encontrando todos os tipos de desculpas. — Ah, acho que já tinha ouvido falar de algo assim antes. Rudy, você nunca saiu de casa antes?

— Hmmm… Sim.

— Tem medo dele? O cavalo.

— Não tenho medo de cavalos ou coisas do tipo.

Na verdade, até gosto. Sabe, também joguei <<De*by, Corridas de Cavalos>>.

— Haha. Estou aliviada. Você tem áreas que correspondem à sua idade.

Ela teve a ideia errada, mas não posso dizer que tenho medo de sair, porque é algo muito mais embaraçoso do que ter medo de cavalos. Ainda possuo uma pitada de orgulho, então não quero ser menosprezado por essa jovem.

— Pois bem, não há o que fazer. Aqui.

Vendo que não estou disposto a me mover, Roxy de repente me carrega em seus ombros.

— O qu…?

— Se você apenas se sentar, não terá mais medo.

Não luto. Meu coração está oscilando junto, e estou pensando em deixar isso com ela.

Fui jogado na parte de trás do cavalo, e, em seguida, ela também sobe e pega as rédeas, fazendo o cavalo avançar.

Logo saí de casa, simples assim.



Parte 3
 

Essa é a minha primeira vez fora do pátio depois de vir a este mundo.

Roxy está avançando lentamente pela vila. De tempos em tempos, os aldeões nos lançam olhares. Ainda tenho medo de ser observado, ainda mais aqueles olhares zombeteiros e desenfreados, que fazem meu corpo ficar tenso. Porém não é possível que cortejassem problemas conosco com palavras de zoação.

Eles não iriam.

Neste mundo, apenas as pessoas daquela pequena casa me conhecem.

“Por que está olhando para mim? Pare e volte ao trabalho…”

… Não.

Não sou eu. Estão olhando para minha professora, e alguns deles até cumprimentam-na.

Ah, isso mesmo: sua posição nesta vila já havia sido estabelecida. Mesmo que a discriminação contra as raças demoníacas seja bastante severa neste país e nesta área rural, dentro de um curto período de dois anos, ela se tornou uma figura que todos estão dispostos a cumprimentar.

Quando penso nesse ponto, ela é uma figura digna de respeito e sabe aonde ir. Caso eu receba qualquer comentário indesejado, ela vai me defender. Haah, não posso acreditar que essa jovem garota, que espiou os eventos no quarto principal, seja alguém tão confiável.

Assim, a tensão do meu corpo desaparece.

— O humor de Kalajav está muito bom. Creio que seja porque você está montado nele.

O cavalo. Claro, não consigo ler o humor de um cavalo.

— É mesmo — respondi com indiferença quando me inclinei para trás, e a parte de trás da minha cabeça bateu no peito plano de Roxy.

“Quão confortável…”

Do que tenho medo? Esta é uma vila pacífica, quem me intimidaria?

— Ainda está com medo?

Sendo questionado, balanço minha cabeça. Não tenho mais medo dos olhares de outras pessoas.

— Já estou bem.

— Viu? Foi como falei.

Meu coração enfim tem espaço para respirar. Os arredores entram na minha vista, preenchendo-a com campos e casas estendendo-se no horizonte. Posso ver um número considerável de pessoas dentro desse imenso raio. Se estivesse mais lotado, poderia virar uma cidade pequena, e se houvessem moinhos de vento, poderia confundir com a Suíça.

Ah, mas vejo moinhos de água.

Depois de relaxar, fico consciente do silêncio por um tempo. Nunca experimentei esse tipo de silêncio quando estava com ela antes. Sendo honesto, nunca tentei ficar tão perto dela. Não é insuportável, porém embaraçoso.

— Professora, o que cultivam nesse campo?

— O principal é o trigo de Asura, um ingrediente do pão. Há também pequenas quantidades de verduras e flores de Bardius; elas podem ser refinadas em especiarias na capital. O resto são ingredientes para a mesa de jantar.

— Ah, isso é pimentão verde. Você não suporta comê-lo.

— N-não é que não suporto, apenas não estou acostumada.

Continuo com pergunta após pergunta.

Hoje, Roxy disse que este é o último teste, ou seja, o trabalho dela como tutora de casa está prestes a terminar. Ela é uma pessoa impaciente, então como hoje é o último dia, é possível que saia desta casa amanhã. Já que talvez não nos encontremos de novo, penso conversar um pouco mais, entretanto não consigo encontrar nada de interessante para falar sem ser algo sobre aqui.

Baseado nas descrições de Roxy, o nome daqui é Buina, e faz parte da região de Fedoa do Norte do reino de Asura. Existem cerca de trinta famílias na vila, principalmente agricultores.

Meu pai é o cavaleiro responsável por esta vila. Seu dever é observar a situação dos agricultores, agir como mediador dos conflitos e defender o lugar de criaturas mágicas. Em outras palavras, um reconhecido guarda-costas do reino. Quando termina suas rondas de manhã, fica em casa à tarde. No geral é uma vila pacífica, então não há muito que fazer.

Quando terminamos esses tópicos, os campos ao redor de nós foram diminuindo de pouco em pouco. Não tinha mais nada a perguntar e o silêncio continuou por algum tempo.

Mais uma hora se passou, e os campos ao nosso redor sumiram. Chegamos a uma área de pastagem intocada.




Parte 4
 

Este é o tipo de pastagem que se estende em direção ao horizonte. Não, se você olhar com mais cuidado, consegue ver alguns indícios de uma área montanhosa. Pelo menos esse cenário não pode ser visto no Japão. Me dá a sensação de que tem um lugar assim em um livro didático, como os campos da Mongólia.

— Acho que aqui está bom. — Roxy direciona o cavalo para uma árvore solitária, amarra as rédeas e me desce do cavalo. Estamos, pela primeira vez do dia, cara a cara.

— Vou usar a magia de água de nível santo, Cumulonimbus. Essa técnica é uma magia que cria raios com uma violenta chuva.

— Sim.

— Por favor, copie o que vou fazer.

Usar uma magia de água de nível santo; o conteúdo do teste final.

Ela está prestes a usar seu maior feitiço. Se eu for capaz de aprender, não terá mais nada para me ensinar.

— Como estou apenas demonstrando, vou manter o feitiço por um minuto antes de dispersá-lo, e então… você passa se puder fazer a chuva durar por uma hora.

— É porque é uma técnica secreta que viemos fazer em um local deserto?

— Não, estava preocupada que as pessoas nas proximidades se machucassem ou que as colheitas fossem danificadas.

Oh, é chuva em um nível de desastre natural? Incrível.

— Estou começando.

Roxy levanta as mãos para o céu.

— Ó grandioso espírito da água, filho do imperador relâmpago que ascendeu aos céus! Cumpra meus desejos, banha-nos com suas ferozes bênçãos e mostre a essa minúscula existência sua força! Deixe seu martelo divino bater na bigorna e demonstrar sua autoridade, devorando a terra com água! Ah, a chuva! Destrua e lave tudo! “CUMULONIMBUS”!

Ela canta cada palavra como uma ária, e dura mais de um minuto. Os arredores ficam escuros logo quando o canto termina. E alguns segundos depois… uma forte chuva cai do céu.

Ventos violentos surgem ao nosso redor quando um raio aparece no meio das nuvens escuras. Entre os sons da água caindo em forma de cachoeira, raios de luz púrpuros corriam através das nuvens, causando estrondos altos. A eletricidade nas nuvens se tornou mais forte devagar. Os relâmpagos continuam a crescer, como se fizesse a luz ficar mais forte… Um raio atinge o solo.

Crash!!

E atinge a árvore.

Meus tímpanos estão zumbindo e meus olhos estão em espirais.

Quase desmaiei.

— Ah!

Esse é o som que Roxy pronunciou ao cometer o erro. As nuvens se dispersam em um instante, e o raio e a chuva param.

Uwawa

O rosto dela fica verde enquanto corre em direção à árvore. Olho na mesma direção para ver que o cavalo que nós trouxemos caiu fumaçando.

Ela leva a mão para o cavalo e começa a cantar.

— Ó misericordiosa matriarca dos deuses, eu vós imploro, cure as feridas deste e deixe-o recuperar a vitalidade de seu corpo. “EXHEALING”! — recita o cântico de uma magia de cura intermediária em pânico e, depois de um tempo, o cavalo desperta.

Magia de cura de nível intermediário não pode trazer os mortos de volta à vida, então ele não morrera. O cavalo mostra uma expressão assustada e a testa de Roxy começa a suar frio.

— Ha… Isso foi perigoso.

Este cavalo é o único cavalo que nossa família tem. Paul toma muito cuidado com ele todos os dias e, às vezes, o levava para o lado de fora com um sorriso.  Mesmo não sendo de uma raça famosa, ambos são companheiros de longa data, e seu amor pelo cavalo está logo abaixo de seu por Zenith, talvez.

Claro que Roxy, que viveu conosco por dois anos, sabe disso. Também sei que Roxy testemunhou Paul estando em transe enquanto cavalgava o cavalo e ficou surpresa.

— Por favor, mantenha o ocorrido em segredo? — diz com uma voz meio chorosa.

Ela é um pouco desajeitada, mas trabalha duro, até mesmo fica acordada até tarde da noite para preparar minhas lições. Sei que não quer ser desprezada por causa de sua tenra idade e sempre tenta se apresentar com dignidade.

Realmente gosto dessa aparência. Se não houvesse uma diferença tão grande na idade, gostaria de me casar com ela.

— Não se preocupe, não vou contar ao pai.

— Uuuu… Por favor, faça isso.

Se nos conhecêssemos com a mesma idade.

— Uuu…

Mesmo estando quase chorando, ela rapidamente balança a cabeça, bate na bochecha e olha para mim com uma expressão solene.

— Então, por favor, vá em frente e tente. Vou cuidar de Kalajav.

O cavalo ainda mostra uma expressão de medo e está pronto para fugir a qualquer momento, mas ela se agarra a ele com força e o segura. Ainda que eu sinta que ela é incapaz de contê-lo, o cavalo se acalma aos poucos. Ela mantém sua posição e começa a cantar alguma coisa.

E então, os dois são cobertos por paredes de terra. Logo a fortaleza feita de pedras é completada — magia de terra avançada, Fortaleza de Terra. Assim, deve ficar tudo bem, mesmo que caiam raios.

“Certo, hora de começar. Deixe-me refazer o canto…”

— Ó grandioso espírito da água, filho do imperador relâmpago que ascendeu aos céus! Cumpra meus desejos, banha-nos com suas ferozes bênçãos e mostre a essa minúscula existência sua força! Deixe seu martelo divino bater na bigorna e demonstrar sua autoridade, devorando a terra com água! Ah, a chuva! Destrua e lave tudo! “CUMULONIMBUS”!

Ao recitar o cântico proferido antes por Roxy, nuvens começam a se reunir e compreendo o possível funcionamento do feitiço: criam-se nuvens em algum lugar no meio da estratosfera, junto com movimentos complexos de correntes de ar para formar nuvens tempestuosas. Se a mana não for aplicada na formação, as nuvens pararão de se formar e dissiparão.

Independente da mana necessária, é muito cansativo levantar as mãos por uma hora… Não, espere. Um mago requer um espírito de criatividade e investigação. É necessário manter a postura para reunir a Genki por uma hora? Isso mesmo, é um teste. Não se trata de manter a mesma posição, mas de usar magia combinada depois de criar as nuvens para sustentá-las.

— Pensando bem… Vi um programa assim antes na televisão; os processos de como as nuvens se formam.

Ainda há algumas das nuvens que Roxy fez antes.

É sobre como a evaporação da água se eleva. Para criar um determinado fluxo de ar ascendente, você precisa deixar a parte inferior aquecer ou algo do gênero e garantir que a seção superior possa ser rapidamente resfriada. Ao tentar fazê-lo, metade da minha mana é absorvida, mas deve ser capaz de se manter por mais de uma hora.

Enquanto olhava para a tempestade, entrei com satisfação na fortaleza feita por Roxy. Ela estava sentada num canto escuro com suas mãos segurando as rédeas do cavalo.

Quando me vê, acena com a cabeça, dizendo: — Esta fortaleza desaparecerá depois de uma hora, então você pode parar a magia antes.

— Ok.

— Não se preocupe, Kalajav está bem.

— Ok.

— Pare de dizer “ok”, precisa controlar as nuvens por uma hora.

Hã?

— Preciso controlar?

— Hm? Falei algo estranho?

— Mas há necessidade de controlá-las?

— Claro. Magia de água de nível santo ainda é magia, e se você não a sustentar com mana, o vento dispersará as nuvens.

— Já me encarreguei de que isso não aconteça, professora…

— Como assim? O quê…?!

Roxy, que parece ter notado alguma coisa, corre para fora da fortaleza que se desfaz na sua saída.

“Ei, ei, não vai continuar controlando a fortaleza? O cavalo será enterrado vivo.”

Ara ara.

Assumo o controle do forte e caminho para fora, para ver ela olhando fixamente para os céus.

— Entendo, um tornado espiral trará as nuvens para cima...!

Dá para ver o céu cheio das nuvens sempre crescentes que criei. Assisti a um show aleatório no passado que usava a ciência para explicar o processo por trás de enormes tornados. Mesmo que eu não consiga me lembrar do seu conteúdo, apenas tentei confiar no meu instinto e, no final, pareço ter feito muito bem.

— Rudy, você passou!

— Eh? Mas não era uma hora?

— Não há necessidade de esperar se você foi capaz de fazer tudo isso. Mas você pode pará-lo?

— Ah, sim, embora precise de um pouco de tempo.

Diminuo a temperatura na parte inferior da tempestade, aumentando a do topo. Então crio um fluxo de ar em direção ao chão antes de enfim usar magia de vento para forçar a dispersão das nuvens. Quando termino, Roxy e eu estamos encharcados.

— Parabéns, você é agora um mago de nível Santo d’Água. — A bishoujo na minha frente com água pingando de sua franja anuncia com um sorriso poucas vezes visto.

O eu que nunca conseguiu nada na vida realizou algo pela primeira vez.

Uma sensação estranha parece se espalhar pelo meu abdômen.

Uma sensação familiar de satisfação.

Por fim sinto isso neste momento; este é o meu primeiro passo depois de vir a este mundo.

 
Parte 5
 

No dia seguinte, Roxy, que não mudou nos últimos dois anos, arrumou sua bagagem e estava na frente dos portões. Meus pais não mudaram muito desde que ela veio, apenas eu cresci mais.

— Tudo bem se você quiser continuar ficando em nossa casa. Há muitas coisas que eu não cozinhei para você…

— Isso mesmo. Ainda que seu trabalho como tutora tenha terminado, você fez muitas coisas por nós nesse último ano. As pessoas da vila irão recebê-la por mais tempo.

Meus pais estão tentando mantê-la conosco. Em algum lugar ao longo do caminho, eles se tornaram próximos. Bem, ela está sempre livre da tarde até a noite. Se fizesse algo todos os dias, poderia conseguir muitos contatos sem problemas, diferente de um protagonista que tem que fazer muitas coisas, senão suas estatísticas não mudam.

— Não, obrigada. Essa situação permitiu-me perceber a minha fraqueza. Vou percorrer o mundo e aperfeiçoar minhas habilidades como maga.

Ela parece ter recebido um choque depois que alcancei seu nível. No passado, disse como odiava estudantes que superavam o professor.

— Entendo. Aqui, o que posso dizer? Minhas desculpas, parece que nosso filho fez você perder a confiança.

“Paul, o que diabos você está dizendo?”

— Não, graças a ele pude perceber meu excesso de confiança. Sou muito grata.

— Não há problema em se orgulhar de si mesma se você pode usar magia de água de nível Santo.

— Estou ciente, contudo não é apenas o nível da magia, e sim sua criatividade. Através disso pode-se chegar a um estágio ainda mais forte.

— Rudy, mesmo que tenha tentado o meu melhor, não posso te ensinar no meu nível atual. — Ela sorri amargamente enquanto acariciava minha cabeça.

— Isso não é verdade. A professora me ajudou em muitas coisas.

— Estou satisfeita se você o diz… Ah, certo.

Roxy procura em seu manto com a mão e tira algo amarrado com uma fita.

— Parabéns pela formatura. Não tive muito tempo para preparar, mas espero que goste.

— Isto é…?

— Um amuleto de proteção Migurd. Se você se deparar com um demônio hostil, pode apresentá-lo com o meu nome. Talvez o ajude a chegar a um entendimento… Talvez.

— Vou tratá-lo com cuidado.

— É apenas uma possibilidade, não acredite muito. — Sorri no final e sai.

Não sei quando minhas lágrimas começaram a fluir. Ela me deu muito: conhecimento, experiência, técnica… Se não tivesse a encontrado, ainda poderia estar estudando em vão com um livro na mão. E o mais importante, me trouxe para fora. Para o mundo exterior.

Ela me trouxe para fora.

Apenas.

Este evento carrega um significado importante.

Só veio para esta vila por 2 anos. Já que não sabia se comunicar bem com os outros, como uma pessoa de uma raça demoníaca, havia a chance de não ser bem tratada pelos aldeões. Mas não foi Paul ou Zenith, se não Roxy que me trouxe para o mundo. A importância desse gesto…

Só fui levado para fora da vila. Todavia, o pensamento de dar um passo para fora do portão era uma sombra dentro do meu coração, e ela o curou apenas passando pela vila, libertando-o da escuridão.

Ela não tinha a intenção de me fazer uma pessoa melhor. Porém, é inegável que foi por sua causa que a sombra em meu coração dissipou.

Dei outro passo para fora dos portões ontem quando nos encharcamos.

Só existe o chão normal.

Não estou tremendo. Posso enfim andar lá fora.

Ela fez algo que ninguém mais fez. Nem mesmo meus pais ou irmãos fizeram isso na minha vida passada.

Ela fez.

Assumiu a responsabilidade de me dar coragem sem qualquer repreensão.

Não fez isso conscientemente. Entendo isso. Fez isso por si mesma, e eu sei disso. Mas ainda respeito essa pequena menina. Juro em meu coração respeitá-la até que sua figura desapareça.

Minhas mãos estão segurando a varinha e o amuleto que me deu, bem como os vários conhecimentos que me foram ensinados.

De repente me lembro.

A calcinha que peguei de Roxy e não tinha sido lavada ainda estava no meu quarto.

Eu sinto muito.



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